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Reforma constitucional abre caminho para reeleição de Putin

Mikhail Bushuev ca
11 de março de 2020

Presidente russo propõe abrangente emenda para garantir sua permanência no cargo e Duma dá aval a texto, cuja aprovação é formalidade. Mudanças fortalecem mandatário, que poderá ser presidente até 2036.

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O presidente russo, Vladimir Putin, está de pé atrás da principal bancada da Duma, a câmara baixa do Parlamento russo, enquanto discursa sobre proposta de mudança constitucional, em 10/03/2020.
Putin discursa na Duma durante debates sobre mudança constitucionalFoto: Getty Images/AFP/A. Nikolsky

Na terça-feira (10/03), o presidente russo Vladimir Putin apareceu na Duma justamente quando a câmara baixa do Parlamento russo estava discutindo mudanças na Constituição. Em meados de janeiro, ele surpreendeu com uma iniciativa de reforma constitucional.

Tal reforma prevê diversas inovações que devem ser incluídas na Carta Magna –entre elas, o salário mínimo. Mas, até agora, o projeto de emenda constitucional não deu resposta à questão mais importante da política russa, ou seja: como o país será governado depois de 2024, quando termina oficialmente o mandato de Putin.

Projetos para permanecer no poder

Para o Estado russo, um forte poder presidencial é "absolutamente indispensável", disse Putin na Duma. Diante dos deputados, o presidente esboçou as possibilidades sobre como ele poderia permanecer no poder. O chefe do Kremlin apontou que o Conselho de Estado (órgão consultivo formado pelos chefes das regiões da Rússia) ou o Conselho de Segurança não devem receber muitos poderes, principalmente porque esses órgãos não foram eleitos pelo povo. Putin alertou que esse cenário também abriga o risco de um duplo governo.

O mandatário russo disse que se poderia simplesmente prolongar seu mandato com a emenda constitucional, mas que, nesse caso, o eleitor não teria outra opção a não ser ele. Putin também apontou que seria possível abolir a restrição de uma pessoa só poder ocupar a presidência por dois mandatos. Mas ele também descartou esse cenário.

Putin delineou outro caminho para si. Os dois últimos mandatos de 2012 a 2024 poderiam não ser computados. Para tal, o Tribunal Constitucional teria que abrir uma exceção para ele. E assim Putin poderia ser reeleito presidente da Federação Russa em 2024 – ou possivelmente antes. Ele garantiu aos parlamentares que haveria, definitivamente, candidatos alternativos.

Pressa em correção do projeto de emenda

Embora Putin não tenha angariado grandes aplausos na Duma, as mudanças que ele propôs foram prontamente incorporadas ao projeto de emenda sem muita discussão. No mesmo dia, a câmara baixa do Parlamento em Moscou adotou o texto na segunda e mais importante leitura.

Nesse meio-tempo, os deputados também aprovaram o texto na terceira e última leitura. As mudanças constitucionais agora serão apresentadas ao Conselho da Federação, a câmara alta do Parlamento em Moscou. A aprovação é uma questão formal. Um referendo sobre o pacote legislativo está previsto para o dia 22 de abril, que foi declarado feriado.

Mais poder para o presidente

A reforma constitucional tem um componente político de poder e pode ser vista como um seguro contra possíveis cenários negativos para Putin. O chefe do Kremlin poderá obter, a pedido, um assento vitalício no Conselho da Federação e, assim, garantir sua imunidade. O presidente não poderá cumprir mais de dois mandatos. Mas uma exceção será feita a Putin (e possivelmente também ao ex-presidente Dimitri Medvedev).

Além disso, a reforma constitucional vai deslocar competências de forma que o presidente seja beneficiado. O chefe de Estado vai ganhar mais poder, o primeiro-ministro e os integrantes do governo, menos. Por exemplo, depois que a reforma entrar em vigor, o presidente poderá "liderar o trabalho geral do governo".

A administração governamental, por outro lado, não poderá mais decidir sozinha em que direção o país deve se desenvolver. Apenas "organiza" o "trabalho" de acordo com as iniciativas presidenciais.

O deslocamento de responsabilidades também inclui o fortalecimento de um órgão estatal que até agora quase não foi notado – o Conselho de Estado. Durante muito tempo, especulou-se que Putin o chefiaria depois de 2024, retirando-se assim do cargo presidencial com amplos poderes. Porém, atualmente, o presidente russo parece estar dando preferência a outras opções.

Futuramente, os juízes também deverão ser mais dependentes do presidente, que deverá poder encaminhar o processo de destituição de juízes do Tribunal Constitucional e da Suprema Corte.

A reforma constitucional também visa minimizar a influência estrangeira. Por exemplo, o direito internacional não deverá ter precedência na Rússia e não deverá ser aplicado se o Tribunal Constitucional russo considerar que ele não está em conformidade com a lei nacional. No entanto, a possibilidade de apresentar queixas perante o Tribunal Europeu de Direitos Humanos será mantida, a princípio, aos cidadãos do país.

Além disso, de acordo com o projeto de emenda constitucional, não se poderá desistir de nenhum território russo. Isso é um sinal de dureza no conflito com a Ucrânia pela Crimeia e na disputa pelas Ilhas Curilas com o Japão.

Passagens conservadoras e patrióticas

Muitas mudanças correspondem ao estilo conservador e patriótico de Putin, que está no poder há 20 anos. Na nova Constituição, a Rússia é descrita como a "sucessora legal da União Soviética" e como um Estado "unido por uma história milenar".

Preserva-se a "memória dos antepassados", que deixaram como legados "ideais" e a "crença em Deus". Mas não se explica de que Deus está se falando. Embora a Rússia seja predominantemente ortodoxa cristã, a fé muçulmana é praticada por cerca de 10% da população do país.

Além de Deus, a Constituição quer consagrar outros elementos conservadores. Assim, o casamento só poderá ser compreendido como uma união entre um homem e uma mulher e o Estado deve proteger "os valores tradicionais da família". As crianças deverão se tornar a principal prioridade da política estatal e deverão ser educadas segundo os valores do "patriotismo".

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