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PolíticaNova Zelândia

As chances da "superpremiê" da Nova Zelândia de se reeleger

Samantha Early
16 de outubro de 2020

Aos 40 anos, a trabalhista Jacinda Ardern ostenta diversas vitórias políticas. No entanto um segundo mandato não está garantido, e sua exemplar gestão da pandemia de covid-19 pode se revelar uma desvantagem.

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Premiê neozelandesa, Jacinda Ardern, e rapaz se saúdam com os cotovelos
Jacinda Ardern tem grande apelo popularFoto: Imago Images/AAP/B. McKay

A jovem família está sentada do lado de fora da confeitaria Rollickin, ao sol de outubro, sua conversa pontuada por colheradas de sorvete batizado com o nome de políticos, enquanto gente fazendo compras passa para lá e para cá. No centro de Christchurch, Nova Zelândia, os únicos sinais visíveis da pandemia são os posters em cada loja com códigos QR para o aplicativo nacional de restreamento de contatos.

"Eu escolhi o Jacinda Fever", explica Courtney White, referindo-se ao sorvete que leva o nome da primeira-ministra e líder do Partido Trabalhista neozelandês, Jacinda Ardern. "Eu simplesmente a adoro. Ela ficou cada vez melhor, na minha opinião, o jeito como geriu tudo."

Ardern atraiu atenção internacional em 2017 ao rapidamente reativar as chances de sua legenda de centro-esquerda, cuja liderança assumiu poucas semanas antes das eleições. E fez manchete novamente ao tornar-se a segunda dirigente do mundo a dar à luz estando no cargo, e levou seu bebê às Nações Unidas.

Acima de tudo, seu primeiro mandato foi marcado pela habilidade de gerir crises: sua resposta ao atentado a tiros na mesquita de Christchurch, em 15 de março de 2019, recebeu elogios no país e no exterior. A imagem da política de 40 anos, de véu islâmico, abraçando uma neozelandesa muçulmana, foi exposta no edifício mais alto do mundo.

E aí veio a covid-19. O governo de Ardern conquistou amplo apoio por suas medidas para eliminar o vírus, que incluíram fechamento de fronteiras e confinamento rigoroso. O país de 5 milhões de habitantes registrou menos de 2 mil casos, com apenas 25 mortes.

A professora de ciência política da Universidade de Canterbury Bronwyn Hayward faz um resumo: "Depois de três anos, a expressão 'jacindamania' foi exposta como aquilo que sempre fora: uma tirada profundamente sexista e, de certo modo, uma distração do impacto de uma líder incrivelmente popular." Ardern conseguiu manter coesa uma coalizão diversificada e se conectar com gente de toda a gama política: "Não é uma mania, é respeito", conclui.

Chances incertas para os trabalhistas

O pleito de 17 de outubro fora originalmente planejado para setembro, mas Ardern o adiou enquanto um surto de covid-19 em Auckland era posto sob controle. Para evitar contágios, a população está sendo aconselhada a evitar filas nos locais de votação, e estima-se que 60% entregou seu voto antes da data da eleição. Ao depositar o seu na abertura antecipada das urnas, em 3 outubro, Jacinda Ardern afirmou aos repórteres que não dava nada por garantido.

Isso, apesar de certas pesquisas de intenção de voto indicarem que os trabalhistas poderiam governar sozinhos; e de o opositor Partido Nacional, de centro-direita, estar enfrentando uma série de crises internas, entrando em campanha com sua terceira líder em 2020, a deputada veterana Judith Collins, uma figura política controversa.

O sistema de representação proporcional da Nova Zelândia, que tem o alemão como modelo, tende a governos de coalizão. Nas eleições de 2017, o líder do centrista Nova Zelândia Primeiro (NZ First), Winston Peters, optou por um acordo com os trabalhistas e os verdes, apesar de o Partido Nacional ter conquistado o maior número de assentos.

Segundo Grant Duncan, professor de teoria política da Universidade Massey, a presente eleição está se transformando numa prova de arrancada entre os dois maiores partidos e seus respectivos apoiadores – o Trabalhista com o Verde, e o Nacional com o liberal e pró-livre mercado ACT –, e é possível que Ardern deixe a chefia de governo.

"As coisas estão ficando apertadas. O Partido Trabalhista tem estado bem à frente nas pesquisas, chegando até 55%, 60%, mas está caindo paulatinamente. A distância entre ele e o Nacional/ACT está diminuindo, e não sabemos se o Partido Verde conseguirá voltar ao Parlamento", pois é "improvável, mas está perigosamente próximo" ele ficar aquém do mínimo de 5% dos votos.

É também improvável que outras siglas aptas a manter o equilíbrio de poder, como o NZ First, consigam assentos no Parlamento. Por sua vez, o ACT, cujo líder, David Seymour, tem sido seu único parlamentar desde 2014, apresenta o melhor desempenho dos últimos anos. Incluídos nas atuais eleições estão um referendo para a proposta de lei de Seymour sobre a eutanásia, a End of Life Choice Bill, e outro para a legalização da maconha.

Sucesso na pandemia ameaça reeleição

A mensagem de campanha do Partido Trabalhista, dos cartazes eleitorais aos discursos dos candidatos em eventos de base, se concentra em "Nós temos Jacinda" e "Nos deem mais tempo".

Para muitos, o governo falhou em cumprir promessas centrais da campanha de Ardern, três anos atrás: moradia financiável e combate à mudança climática e à pobreza. Em diversos casos, o acordo com Peters provou ser um "freio de mão"; como, por exemplo, quando a premiê desistiu de introduzir um imposto sobre rendas de capital por não conseguir a aprovação do NZ First.

Segundo a gerente Viviana Zanetti, embora a reação governamental à pandemia tenha lhe valido grande apoio, parte do eleitorado de baixa renda "esperava mais resultados", e estaria reconsiderando se vota uma segunda vez nos trabalhistas.

Tradicionalmente, os neozelandeses tendem a reeleger seus governos para um segundo mandato. O Partido Nacional liderava as pesquisas em dezembro, mas "a covid-19 mudou tudo", explica Grant Duncan. A sigla de centro-direita tem relutado em atacar a gestão da crise do coronavírus pelo atual governo, amplamente considerada um sucesso, apresentando-se, em vez disso, como melhores gestores das sequelas econômicas.

"O sucesso do governo em exercício no controle efetivo da doença agora é uma espécie de problema para ele, pois as mentes da população estão se voltando para outra coisa: os horrendos custos da pandemia", observa o professor de política.