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Quatro pontos sobre fim da urgência do pacote anticorrupção

6 de julho de 2016

Governo Temer retira urgência constitucional das propostas lançadas por Dilma em março de 2015, depois das manifestações de rua pelo país. Saiba o que acontece agora.

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Dilma Rousseff e Michel Temer
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa

O líder do governo na Câmara, deputado André Moura (PSC-SE), anunciou que o presidente interino Michel Temer vai retirar nesta quarta-feira (06/07) a urgência constitucional da tramitação do pacote de medidas de combate à corrupção lançado pela presidente afastada Dilma Rousseff em março de 2015. O anúncio foi feito nesta terça-feira, após reunião de Temer com líderes da base governista.

Propostas com urgência constitucional ganham prioridade de votação, podendo trancar a pauta da Câmara enquanto não forem discutidas. O governo quer que os parlamentares priorizem a aprovação de matérias da área econômica, entre elas as que tratam da renegociação das dívidas dos estados, a limitação dos gastos públicos, a retirada da obrigatoriedade da Petrobras de explorar o pré-sal e regras mais rígidas para a direção de fundos de pensão de empresas públicas.

O pacote de Dilma tramitará numa comissão especial, criada para analisar as dez medidas anticorrupção apresentadas pelo Ministério Público (MP) em março de 2016 e acompanhadas de mais de 2 milhões de assinaturas. "Ficou decidido que é mais apropriado que os projetos [de Dilma e do MP] tramitem junto, para fazer um debate mais amplo, com audiências públicas", disse Moura.

O pedido de Temer para que sejam votadas medidas que, na avaliação do governo, ajudarão a retomar o crescimento do país foi feito no mesmo dia em que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu a parlamentares rapidez na instalação da comissão especial que analisará as medidas anticorrupção do MP.

A retirada da urgência dos projetos de combate à corrupção foi criticada pela oposição. Segundo a líder da minoria, Jandira Feghali (PCdoB-RJ), com a medida, o governo interino demonstra que não está interessado em agilizar a aprovação de medidas contras desvios. "Eles [o governo] estão querendo tirar a urgência constitucional e mandar os projetos para uma comissão ainda não instalada e que sequer os líderes estão indicando os membros", criticou.

Protesto no Brasil
Pacote anticorrupção de Dilma foi lançado após protestosFoto: Reuters/U. Marcelino

Quais as propostas do pacote de Dilma?

Lançado em março de 2015 por Dilma, como resposta às manifestações de rua, o pacote anticorrupção é composto por três propostas: criminalização de caixa dois nas contas de partidos políticos ou de campanhas eleitorais; bloqueio de bens e valores obtidos com recursos de origem ilícita de pessoas condenadas em primeira instância, sem a necessidade da conclusão do julgamento; tipificação do crime de enriquecimento ilícito de funcionários públicos, inclusive políticos.

Quando elas foram apresentadas?

O pacote de Dilma foi lançado em março de 2015 como resposta às manifestações de rua.

O pacote de dez medidas do MP foi encaminhado ao Congresso Nacional em 29 de março de 2016, acompanhado de 2.028.263 assinaturas de apoio.

Os dois projetos estão parados. O do MP enfrenta resistência de parlamentares, que temem sofrer o impacto das mudanças. Muitos líderes de partidos ainda não indicaram integrantes para compor a comissão especial que vai analisar as medidas.

Cerca de 150 deputados são investigados no Supremo Tribunal Federal, em inquéritos ou ações penais. Em conversas informais, muitos deles têm pedido para adiar a instalação da comissão até que sejam capazes de avaliar se as medidas anticorrupção poderão ou não atingi-los.

Por que foi retirada a urgência?

Moura disse que a iniciativa se justifica pela necessidade de se discutir com mais atenção as propostas, o que poderá ocorrer na comissão especial para onde os textos serão enviados.

Segundo o governo, a retirada da urgência possibilita que o governo vote projetos que considera importantes, como o que trata da renegociação das dívidas dos estados. "Se não retirarmos essas urgências amanhã não poderemos avançar em matérias consideradas importantes para o governo, como a questão da lei de governança dos fundos [de pensão] e no requerimento de urgência [para votação do projeto] de renegociação das dívidas dos estados", disse Moura.

Os projetos prioritários para o Palácio do Planalto são: limitação dos gastos públicos; retirada da obrigatoriedade da Petrobras de explorar o pré-sal; regras mais rígidas para a direção de fundos de pensão de empresas públicas; e renegociação da dívida dos estados.

O que acontece agora?

A intenção do governo é levar o pacote de Dilma para a comissão especial que vai analisar as dez medidas de combate à corrupção de iniciativa popular encaminhada ao Congresso pelo Ministério Público Federal.

Apesar de ter chegado à Câmara em março, o projeto de lei de iniciativa popular, com mais de 2 milhões de assinaturas de apoio, ainda aguarda a instalação da comissão especial de deputados para iniciar os debates e votações.

O colegiado terá 30 membros e até 40 sessões para elaborar um relatório sobre as propostas.

As dez medidas do MP foram discutidas nesta terça-feira, em reunião entre o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e deputados federais de 15 partidos.

Ao final, o presidente da Frente Parlamentar Mista de Combate à Corrupção, Antonio Carlos Mendes Thame (PV-SP), afirmou que os partidos que ainda não indicaram membros se comprometeram a definir os nomes para a comissão e instalá-la na próxima semana.

As 10 propostas do Ministério Público

1. Prevenção à corrupção, transparência e proteção à fonte de informação

Destinação de recursos mínimos de publicidade com ações de conscientização e educação. Treinamento de funcionários públicos em posturas e procedimentos contra a corrupção. Garantia de sigilo das testemunhas para estimular denúncias de casos de corrupção. Criação de mecanismos que garantam a rapidez dos processos, sempre que seu trâmite demorar mais do que a duração razoável.

Procurador-geral da República, Rodrigo Janot
Procurador-geral da República, Rodrigo JanotFoto: Antônio Cruz/Agência Brasil

2. Criminalização do enriquecimento ilícito de agentes públicos

Posse de recursos sem origem comprovada e incompatível com a renda do servidor se tornaria crime, com pena de prisão de 3 a 8 anos.

3) Aumento das penas e crime hediondo para corrupção de altos valores

Punição conforme o valor desviado. Quanto maior o valor envolvido, maior a pena, que pode variar de 12 até 25 anos de prisão, quando o montante for superior a R$ 8 milhões. Aumento do prazo de prescrição (quando se perde o direito de punir), que passaria de 4 para 8 anos

4. Aumento da eficiência e da justiça dos recursos no processo penal

São propostas 11 alterações pontuais no Código de Processo Penal (CPP) e uma emenda constitucional, a fim de dar celeridade à tramitação de recursos em casos do chamado “crime do colarinho branco”, sem prejuízo do direito de defesa do réu. Atualmente, brechas na lei permitem que a sentença final desse tipo de crime demore mais de 15 anos para ser proferida, diante de recursos e estratégias que protelam as decisões.

As alterações incluem a possibilidade de execução imediata da condenação quando o tribunal reconhece abuso do direito de recorrer; a revogação dos embargos infringentes e de nulidade; a extinção da figura do revisor; a vedação dos embargos de declaração de embargos de declaração; a simultaneidade do julgamento dos recursos especiais e extraordinários; novas regras para habeas corpus; e a possibilidade de execução provisória da pena após julgamento de mérito do caso por tribunal de apelação, conforme acontece em inúmeros países.

5. Maior rapidez nas ações de improbidade administrativa

São propostas três alterações na que trata das sanções aplicáveis a agentes públicos que cometem atos de improbidade administrativa, para agilizar a tramitação desse tipo de ações. Entre elas, estão a adoção de uma defesa inicial única (hoje ela é duplicada); a criação de varas, câmaras e turmas especializadas para julgar ações de improbidade administrativa e ações decorrentes da lei anticorrupção.

6. Reforma no sistema de prescrição penal

Fim da "prescrição retroativa": pela qual o juiz aplica a sentença ao final, mas o prazo é projetado para o passado a partir do recebimento da denúncia. Um crime prescreve quando o julgamento final de um caso demora tanto tempo que a punição perde seu efeito. Nos crimes de colarinho branco, muitas vezes essa demora é utilizada como manobra de defesa para evitar a punição dos acusados.

7. Ajustes nas nulidades penais

Medida propõe uma série de alterações no capítulo do Código de Processo Penal que trata de nulidades, para que a anulação e a exclusão da prova somente ocorram quando houver uma efetiva e real violação de direitos do réu. Busca-se evitar que o princípio da nulidade seja utilizado pela defesa para retardar ou comprometer o andamento do processo.

8. Responsabilização dos partidos políticos e criminalização do "caixa dois"

Responsabilização, de forma objetiva, dos partidos políticos em relação a práticas corruptas, à criminalização da contabilidade paralela (caixa 2) e à criminalização eleitoral da lavagem de dinheiro produto de crimes, de fontes de recursos vedadas pela legislação eleitoral ou que não tenham sido contabilizados na forma exigida pela legislação.

9. Prisão preventiva para evitar a dissipação do dinheiro desviado

Possibilidade de prisão preventiva (antes da condenação, por tempo indeterminado), caso se comprove que o suspeito tem recursos fora do país.

10. Recuperação do lucro derivado do crime

Criação do confisco alargado: obriga o criminoso a devolver todo o dinheiro que possui em sua conta, exceto recursos que comprovar terem origem lícita. Ação civil de extinção de domínio, que possibilita recuperar bens obtidos de forma ilícita, mesmo que não haja a responsabilização do autor do fato ilícito, em caso de morte ou prescrição, por exemplo.

MD/ebc/ots