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Política alemã entra na era do toma-lá-dá-cá

Augusto Valente30 de junho de 2006

Nos últimos dias, o Parlamento alemão aprovou diversas leis polêmicas com rapidez espantosa. Tudo graças a uma política de trocas dentro da coalizão. Ou já se poderia falar em maracutaia germânica?

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Merkel feliz pela aprovação da reforma do federalismoFoto: AP

Nesta sexta-feira (30/06), o Bundestag (câmara baixa do parlamento alemão) aprovou a lei de reforma do federalismo. Através dela pretende-se separar com mais clareza as funções da Federação e dos governos estaduais, aumentando a liberdade de ação da coalizão de governo.

Caso a lei também seja aprovada pelo Bundesrat (câmara alta), em 7 de julho próximo, a partir de 2007 os Estados federados terão maior autonomia para regulamentar diversos setores. Por sua vez, a Federação dependerá menos da aprovação de seus Estados-membros.

Meio ambiente, UE e terror

Entre as novas competências da Federação estará o meio ambiente, onde ela se encarregará exclusivamente da proteção à natureza, por exemplo. Ativistas do setor esperam que assim se abra o caminho para a tão desejada unificação da legislação ambiental.

A Federação será o principal interlocutor para assuntos de jurisprudência da União Européia. Os Estados só interferirão em temas estritamente estaduais, como a política de ensino.

O Departamento Federal de Investigações Criminais (BKA) deverá receber ainda a função de ação preventiva na luta contra o terrorismo, porém a lei neste sentido depende da aprovação do Bundesrat.

Educação, penitenciárias e finanças

A questão da educação permaneceu polêmica até o fim. Somente com muito esforço o governo concedeu aos Estados pleno direito de decisão sobre as escolas por ele subsidiadas. As escolas superiores também passarão a ser assunto eminentemente estadual.

No futuro, os Estados federados também serão responsáveis exclusivos pelas instituições penais, apesar das reservas por parte do Partido Social Democrata (SPD) e de peritos em Direito. Eles temem que, por uma questão de economia, os governos estaduais comecem a competir pela penitenciária mais barata ou mais rigorosa, caso a lotação das celas cresça.

Da alçada estadual será igualmente o pagamento do funcionalismo público. Também aqui houve críticas. Representantes dos Estados de menor porte e do Leste temem a concorrência pelos melhores funcionários, onde estarão em desvantagem em relação aos grandes Estados.

Um próximo passo da reforma será desenredar as complexas relações financeiras entre a Federação e Estados. Este bloco temático ficou de lado, por ser considerado ainda mais delicado do que a reforma de competências. De antemão, o ceticismo é grande a este respeito.

Nova dinâmica de decisão

"Troca-se reforma do federalismo por lei do tratamento igualitário". Assim se poderia descrever a barganha entre os dois parceiros da coligação governamental alemã, SPD e democratas cristãos (CDU).

O governo anterior, liderado pelo social-democrata Gerhard Schröder, já encaminhara o estabelecimento de medidas antidiscriminação, sem porém conseguir sua aprovação no Parlamento.

Durante sua campanha eleitoral, a chanceler federal Angela Merkel classificara a lei como "um monstro burocrático destruidor de empregos". Em maio último, contudo, aprovava um projeto de lei quase inalterado.

Tudo à custa de concessões do SPD em outros setores, como no caso da reforma do federalismo. E assim, graças a arranjo e permutas no interior da coalizão, duas propostas importantes puderam ser salvas no último momento. O que não significa que se superou a má vontade na base dos dois partidos, CDU e SPD.

Alemanha a um passo da maracutaia

Um efeito dessa nova forma de resolver os impasses numa coalizão tão desigual é certamente a agilidade: nos últimos dias antes de seu recesso de verão, o Bundestag aprovou um bojudo pacote de leis controversas, parte das quais com pesadas conseqüências para o bolso dos contribuintes. Tudo isso em plena Copa do Mundo, e de preferência nos dias dos jogos da seleção nacional.

Tal feito seria impensável há alguns anos, mesmo em constelações políticas mais harmônicas, muito menos de forma tão declarada. Embora ainda tentando guardar as aparências, pouco a pouco a Alemanha parece estar aprendendo o caminho do jeitinho.

Será que o toma-lá-dá-cá irá definitivamente tomar o lugar dessa tradição germânica dos debates políticos – por vezes intermináveis, porém abrangentes e profundos?