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Esporte

Pirotecnia pode estar com dias contados nos estádios alemães

19 de março de 2019

Se de um lado a federação tende a um endurecimento cada vez maior, para as torcidas organizadas cada sinalizador aceso equivale a uma mensagem à cartolagem. Nessa disputa, acaba perdendo o torcedor comum.

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A torcida do Union Berlin com sinalizadores no estádio: um ato de protesto
A torcida do Union Berlin com sinalizadores no estádio: um ato de protestoFoto: picture-alliance/dpa/F. Gambarini

Há muitos anos se discute na Alemanha se a utilização de sinalizadores nos estádios por parte de torcedores deveria ser permitida oficialmente e sob quais condições se daria o seu uso. A ideia era chegar a um acordo a respeito entre a Federação Alemã de Futebol (DFB) e as torcidas organizadas.  

A maioria dos fã-clubes, abrangendo as três divisões do futebol alemão, estava disposta a fazer muitas concessões para que finalmente se pudesse chegar a uma resolução que permitisse a utilização ordenada e controlada de artefatos pirotécnicos. Rojões, por exemplo, seriam definitivamente banidos, e sinalizadores não poderiam ser atirados em direção ao campo, nem jogados a esmo pelas arquibancadas.  

Entretanto, o diálogo entre as partes foi abruptamente dado por encerrado unilateralmente pela federação, e desde então não se conversa mais sobre o assunto para tentar chegar à uma solução que satisfaça todas as partes envolvidas. 

"Ultras" do Fortuna Düsseldorf provocam os cartolas com sinalizadores, no estádio do Borussia Mönchengladbach
"Ultras" do Fortuna Düsseldorf provocam os cartolas com sinalizadores, no estádio do Borussia MönchengladbachFoto: picture-alliance/dpa/M. Becker

A decepção foi grande após o fracasso das conversações, e o que se nota desde então é que praticamente não acontece uma partida de futebol onde, em maior ou menor grau, acabam surgindo espetáculos pirotécnicos. 

Do ponto de vista legal, acender sinalizadores nos estádios é proibido e considerado uma infração. Há defensores, especialmente no âmbito político, que pleiteiam caracterizar especificamente a pirotecnia nos estádios como crime. Neste caso, a pena não seria apenas uma multa, como é o caso atualmente, mas também de prisão temporária.

Atualmente, para cada sinalizador aceso, o respectivo clube é obrigado a pagar uma multa de mil euros (aproximadamente 4 mil reais). Se o artefato for jogado em direção ao campo, o valor triplica. Os clubes podem cobrar as multas do torcedor, mas para isso acontecer é necessário que tenha havido uma identificação comprobatória do autor da contravenção.

Sinalizadores nas arquibancadas do Bayer Leverkusen, em partida contra o Dortmund
Sinalizadores nas arquibancadas do Bayer Leverkusen, em partida contra o DortmundFoto: picture-alliance/AP Photo/M. Meissner

Os que defendem a criminalização afirmam, não sem razão, que um estudo realizado em 2017 a pedido da Uefa e das redes de fã-clubes comprovou os riscos para a saúde e segurança dos torcedores quando um sinalizador é aceso. A temperatura do artefato chega a 1.000 graus centígrados com alto potencial de ferimento por queimadura.

Durante toda temporada 2017/2018 da Bundesliga, a polícia registrou 879 casos de pirotecnia nos estádios alemães, com 53 feridos resultantes de queimaduras. Em compensação, neste mesmo período, houve 141 pessoas feridas pela repressão policial com uso de gás pimenta.

Se de um lado a Federação Alemã de Futebol tende a um endurecimento cada vez maior quanto à pirotecnia, para as torcidas organizadas e, especialmente para aqueles blocos mais radicalizados, cada sinalizador aceso equivale ao dedo do meio (em alemão "Stinkefinger")  direcionado à cartolagem que comanda os destinos do futebol alemão.

Artefatos luminosos se tornaram um instrumento de protesto, e o torcedor das organizadas não faz segredo disso.

Tudo vermelho: torcedores do Colônia em partida da Liga Europa em 2017
Tudo vermelho: torcedores do Colônia em partida da Liga Europa em 2017Foto: Reuters/T. Schmuelgen

"Sempre daremos um jeito de contrabandear sinalizadores para dentro do estádio. Ninguém vai conseguir nos impedir. É a nossa forma de protestar. Podem fazer os controles que quiserem. Não vai adiantar porque sempre daremos um jeito”, declarou um torcedor berlinense que preferiu ficar no anonimato e minimizou o argumento da periculosidade: “Não é tão perigoso. Onde estão as pessoas em chamas? Não vejo ninguém pegando fogo”.    

Nesta briga entre os cartolas e as organizadas quem sofre é aquele torcedor tipo família: pais com crianças, idosos, casais, enfim aquele torcedor comum que vai ao estádio para, com toda calma e tranquilidade, assistir a um jogo de futebol. Não quer ser perturbado pelos muitas vezes caóticos torcedores radicais, nem antes, nem durante e nem depois do jogo.

Em Bielefeld, no oeste da Alemanha, onde o coração do futebol alemão bate mais forte, o Instituto de Pesquisa de Conflitos e Violência constatou que, após extenso estudo, na maioria dos estádios alemães, aproximadamente 75% dos frequentadores assíduos da Bundesliga querem mesmo ver o jogo tranquilamente, tomando seu chope e curtindo o evento com seus amigos e familiares. Os outros 25% pertencem aos blocos das torcidas organizadas – são os que cantam, apoiam, protestam e acendem sinalizadores. 

Fato é que, pelo menos por enquanto, não há solução à vista para este conflito de interesses. As posições, tanto da federação quanto das torcidas organizadas, são irredutíveis. Resultado: ninguém conversa com ninguém.

É desejável que voltem à mesa de negociações e dialoguem para que, no futuro, os estádios quase sempre cheios na Bundesliga continuem lotados e possam continuar sendo uma marca registrada do futebol alemão.

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Gerd Wenzel começou no jornalismo esportivo em 1991 na TV Cultura de São Paulo, quando pela primeira vez foi exibida a Bundesliga no Brasil. Desde 2002, atua nos canais ESPN como especialista em futebol alemão. Semanalmente, às quintas, produz o Podcast "Bundesliga no Ar". A coluna Halbzeit sai às terças. Siga-o no TwitterFacebook e no site Bundesliga.com.br

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