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Pais e filhos alemães: relação de independência e confiança

Karina Gomes
29 de dezembro de 2018

Nas relações familiares na Alemanha, crianças são criadas para serem livres e terem responsabilidade pelos próprios atos. Desde cedo, alunos vão à escola desacompanhados dos pais.

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Criança de cerca de dois anos entre uma mulher e um homem, que só são vistos da cintura para baixo
Pais alemães buscam criar filhos independentes e com responsabilidades desde cedoFoto: picture-alliance/dpa

A máxima da educação de pais para filhos na Alemanha é a confiança. É difícil não ficar perplexo ao ver crianças pegando o ônibus público sozinhas, correndo soltas pelo parque enquanto os pais conversam com amigos ou indo para a escola a pé desacompanhadas. Essas cenas do cotidiano alemão não são sinônimo de negligência. Apenas transparecem a forma alemã de educar. O objetivo é criar os pequenos para que sejam independentes e assumam logo a responsabilidade pelos próprios atos.

Essa postura dos pais não é sinal de frieza, mas uma demonstração de confiança nos próprios filhos, que devem crescer livres e autoconfiantes. As viagens com os colegas da escola já começam no jardim de infância. Os pais podem decidir junto com os educadores se o filho já está preparado para passar um fim de semana longe da família.

Mesmo no jardim de infância, os pais geralmente não ajudam as crianças a se vestir e calçar os sapatos. Pode demorar o tempo que for, eles irão descrever para o filho como colocar as roupas e esperar até que a criança consiga se arrumar sozinha. A conversa é como se fosse de adulto para adulto. Nada de alterar a voz para soar mais infantil e se comunicar melhor com a criança.

Se os pais aparecem todo dia na escola para trazer ou buscar o filho, a criança pode virar motivo de piada. Os pais acompanham o estudante até a escola apenas no primeiro dia de aula (link: https://p.dw.com/p/33Kd4), mas depois elas fazem o trajeto a pé, de bicicleta ou de transporte público sozinhas ou junto com os colegas. Os pais que insistem em acompanhar o filho podem até ser advertidos pela direção da escola.

Encorajar as crianças a enfrentar e descobrir o mundo sem medo e autoconfiança pode parecer um pouco cruel em algumas situações. Se me deixasse levar pelo ímpeto, teria advertido uma mãe que viu a filha de três anos cair da bicicleta e não ajudá-la a levantar. Apesar do choro, a mãe foi categórica: "Vamos, não foi nada. Levante-se para continuarmos o passeio”. Levou alguns minutos até que choro ficasse mais leve e a criança se colocasse de pé e ainda levantasse a bicicleta sem nenhuma ajuda.

Mimar a criança depois de um simples tombo também não é comum. Vi um menino tombar ao sair de uma piscina de plástico, dar uma batida leve na cabeça e abrir o berreiro. A resposta da mãe foi: "Me mostra. Não foi nada. Isso não é motivo para essa choradeira. Volte a brincar”. E assim a criança fez.

Deixar a casa dos pais antes dos 20 anos é uma tendência natural. Quando vão para a faculdade, os jovens passam a viver em repúblicas com os amigos. O meu olhar estrangeiro me dá a sensação de que o relacionamento com a família após sair de casa é mais formal e sem muito apego. Encontros da família quase todo domingo com muita espontaneidade não parece ser uma prática comum. Os pais te aguardam com a mesa pronta, arrumados e preparamos para te receber como um convidado e talvez não mais como um velho morador da casa.

Essa maneira peculiar de educar segue o ditado alemão: "Kinder müssen Kinder sein dürfen” (crianças devem poder ser crianças). E ser criança é ser livre.

Na coluna Alemanices, publicada às sextas-feiras, Karina Gomes escreve crônicas sobre os hábitos alemães, com os quais ainda tenta se acostumar. A repórter da DW Brasil e DW África tem prêmios jornalísticos na área de sustentabilidade e é mestre em Direitos Humanos.

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