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Opinião: Justiça ainda deve prova de isenção política

Jan D. Walter
4 de março de 2016

Condução coercitiva de Lula sugere que, para a Justiça brasileira, é doa a quem doer. Mas ela ainda precisa provar que não tem preferências partidárias, afirma o jornalista Jan D. Walter, da redação alemã da DW.

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Jan D. Walter é jornalista especializado em América Latina da redação alemã da DWFoto: André Loessel

Certamente não caíram do céu os agentes da Polícia Federal que, cedo da manhã desta sexta-feira (04/03), levaram o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para depor. Há semanas que se fala do suposto envolvimento dele no esquema investigado na Operação Lava Jato. Mesmo assim, a condução coercitiva do ex-presidente tem um grande impacto, pois sinaliza que também ele – apesar de toda a sua popularidade – não está acima da lei.

No Brasil, porém, isso não é exatamente algo óbvio para todos. Afinal, a lista dos que são culpados, nas nunca foram acusados; dos que foram acusados, mas nunca foram condenados; e dos que foram condenados, mas nunca foram punidos, é longa.

Os dois casos mais famosos estão por aí, livres, leves, soltos e no poder: o ex-presidente Fernando Collor de Mello representa desde 2007 o estado de Alagoas no Senado. E o ex-governador e ex-prefeito Paulo Maluf – acusado de corrupção, formação de quadrilha, lavagem de dinheiro e desvio de recursos públicos, com vários mandados de prisão no exterior e origem do verbo "malufar" – é deputado em Brasília.

Por que essas pessoas são reeleitas é algo que se deve perguntar a quem vota nelas. Por que elas podem concorrer, porém, é uma questão que deve ser feita à Justiça brasileira.

Desde 2010 existe um instrumento legal: a Ficha Limpa, assinada por Lula, que torna inelegíveis por oito anos as pessoas que já foram condenadas ou tiveram um mandato cassado – ao menos na prática, pois a aplicação da lei exige promotores e juízes independentes e eficientes.

Só que desses há poucos, afirmam muitos brasileiros – sobretudo os partidários de Lula, da presidente Dilma Rousseff e do PT. Eles fazem acusações graves à Justiça brasileira: por que nomes do alto escalão do PT foram condenados à cadeia no escândalo do mensalão e, ao mesmo tempo, o escândalo de corrupção – bem menor, mas na essência muito semelhante – do mensalão mineiro, que envolve o PSDB, não foi investigado com o mesmo fervor?

Já os adversários do PT rebatem perguntando por que Lula não foi questionado na Justiça sobre como é possível que ele, na condição de presidente da República, não soubesse que deputados eram comprados para votar com o governo.

Quem sempre fez essa pergunta deve agora estar sentindo uma certa satisfação. Mas isso não quer dizer que essas pessoas acreditem na imparcialidade da Justiça.

Mais de 30 anos depois da redemocratização, está mais do que na hora de a Justiça começar a melhorar sua credibilidade. Os investigadores da Lava Jato colaboram para isso, sem dúvida – nem tanto, porém, porque têm a coragem de levar para depor uma das pessoas mais conhecidas e populares do Brasil. Muito mais importante é que, ao longo da Lava Jato, haja investigações amplas, não importa de que partido.

Decisivo para a reputação da Justiça brasileira é que ela se mantenha firme e também no futuro investigue suspeitas sem considerar implicações partidárias ou empresariais.

Jan D. Walter é especialista em América Latina e jornalista da redação alemã da DW.