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A floresta, as mídias e nós

Martin Muno
Martin Muno
30 de agosto de 2019

Embora seja válido se indignar com a política ambiental de Bolsonaro, é preciso também ter consciência de que todos contribuímos, com nosso estilo de vida, para o desmatamento florestal, opina Martin Muno.

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Árvore queimada na Amazônia, vista de baixo para cima
Árvore queimada na Amazônia: "Desmatamentos e incêndios florestais também ocorrem na Europa"Foto: Reuters/R. Moraes

É claro que os incêndios na Floresta Amazônica são um desastre. E o aumento de seu número pode ser atribuído, pelo menos em grande parte, às políticas ambientalmente hostis do presidente brasileiro Jair Bolsonaro, de extrema direita. Desde que assumiu o cargo, ele cumpre todos os desejos do lobby do agronegócio, incluindo o uso mais amplo da floresta tropical.

O fato de haver 77% mais incêndios do que no ano anterior deve-se, em grande parte, ao desmatamento já ocorrido. Pois o que está principalmente queimando não é a floresta úmida, mas madeira seca em superfícies já desmatadas.

E é claro que nem toda a Região Amazônica queima, mesmo que alguns gráficos diligentemente espalhados nas mídias e redes sociais sugiram o contrário. E, ao mesmo tempo, existem incêndios florestais devastadores em outros lugares: no Ártico, na Sibéria, em muitos países africanos. Mas esses incêndios quase não chegam ao noticiário e, portanto, tampouco à nossa consciência. Sobretudo nas mídias sociais, que vivem do exagero, apenas o fogo de Bolsonaro permanece na memória.

Mas apontar o dedo só para Bolsonaro é barato demais, pois ao mesmo tempo dois outros dedos apontam para nós. Um deles, para nossos pratos e estômagos, pois a razão do desmatamento em massa é a crescente fome mundial de carne – e quanto mais barata, melhor.

Carne bovina e soja para engorda de gado são as principais exportações agrícolas do Brasil. Os agricultores servem unicamente a nossa ganância. E cada novo hectare de terra agrícola significa um hectare de floresta tropical a menos – a conta é simples assim. Com nosso consumo maciço de carne, serramos com a faca o próprio galho em que estamos sentados.

O outro dedo que aponta para nós – pelo menos se vivemos na Europa –, aponta para nossas florestas. Será que já esquecemos que as florestas queimaram aqui no início seco deste verão? E que quilômetros quadrados estão prestes a morrer de secura? Este é o segundo verão consecutivo de seca que castiga a vegetação agreste do continente.

E não são apenas as florestas de exploração intensiva a sofrer com o aumento da temperatura e a falta de chuvas, como as monoculturas de pinheiros. Cada vez mais, a "nova mortalidade florestal" também afeta florestas mistas. E desmatar em vez de florestar é algo que também ocorre na Europa.

As árvores nos mostram claramente o que todos sentimos: as mudanças climáticas já estão mudando nosso ambiente, não importa onde vivamos. E, a julgar pelas previsões, estamos só no começo. A destruição das florestas é uma dupla perda, pois elas são o maior armazenador de dióxido de carbono em nosso planeta.

Não foi à toa que os cientistas do Instituto Federal de Tecnologia de Zurique (ETH) chegaram em julho a conclusão de que o florestamento em larga escala poderia efetivamente combater as mudanças climáticas. E não é à toa que os pesquisadores alertam que a morte das grandes florestas libera milhões de toneladas de CO2.

Identificar Bolsonaro como principal culpado, enquanto negador do clima, é compreensível, mas é também simplista. Todos nós contribuímos através do nosso estilo de vida, e nos cabe questionar isso criticamente. Isso adianta mais do que muita postagem indignada no Facebook.

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Martin Muno
Martin Muno Imigrante digital, interessado em questões de populismo e poder político.