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Com a derrota de 6 a 0 para a Espanha, Löw chega ao fundo do poço. Mas ele continuará técnico da Alemanha até a Eurocopa de 2021, embora todos, exceto ele, saibam que sua época já passou, opina Michael da Silva.
É difícil dizer quem é a figura mais trágica neste momento. Por um lado, você tem Joachim Löw, o outrora reverenciado treinador que certa vez levou a Alemanha ao prêmio máximo do futebol mas perdeu totalmente o controle dos problemas no gramado. Do outro, está a Federação Alemã de Futebol (DFB), que teve chance de demitir Löw em 2018, mas não o fez.
Os dois protagonistas da DFB são Oliver Bierhoff e Fritz Keller, este presidente desde 2019 e que agora enfrenta a maior crise de sua gestão provocada por Löw, seu amigo de longa data. Bierhoff, em seu cargo de diretor da seleção nacional por quase três anos e parte integrante da decadência da equipe, adora falar sobre um novo acordo de patrocínio ou o próximo centro de treinamento da seleção alemã em Frankfurt – "o Vale do Silício dos técnicos de futebol", segundo suas palavras.
Infelizmente para a nação que ele representou com tanta distinção em campo, Bierhoff agora não tem a coragem ou a compreensão de sua própria responsabilidade frente ao futebol alemão para lidar com a grande crise existente bem debaixo de seu nariz.
Löw, Bierhoff e Keller estão dilacerando a seleção alemã e transformando uma outrora orgulhosa equipe em um embaraço nacional, comparado apenas com o novo aeroporto de Berlim.
A derrota covarde por 6 a 0 de terça-feira não foi infligida por uma seleção espanhola de classe. A equipe de Luis Enrique tinha marcado apenas três gols nos últimos cinco jogos. Para Löw e a Alemanha, porém, nunca deveria ter chegado a esse ponto. O auge de Löw como técnico da Alemanha veio em uma noite brilhante no Rio em 2014, mas o brilho vem sendo removido a cada dia que passa.
Com Hansi Flick, o agora bem-sucedido treinador do Bayern de Munique, ao seu lado, a Alemanha de Löw conquistou tudo que veio pela frente. Uma vitória icônica por 7 a 1 sobre o Brasil e aquele gol de Mario Götze vão viver por muito tempo na memória – mas as memórias são tudo que Löw deixou. Elas são tudo o que ele teve por muito tempo.
Havia sinais de que as rodas estavam se soltando já em 2016. Mas se Löw não queria partir no auge, ele deveria ter tido a decência de sair no seu ocaso. A Copa do Mundo de 2018 foi um desastre absoluto para a Alemanha. Estimulado por um enorme contrato concedido a ele pouco antes da Copa pelo então presidente da DFB, Reinhard Grindel, Löw decidiu deixar Leroy Sane de fora de sua seleção para o Mundial. Decisão que na época era questionável, mas logo se revelou louca.
Não foi apenas a natureza insípida da campanha da Alemanha na Copa de 2018, mas as consequências subsequentes que mostraram que Löw havia perdido o controle. Mesut Özil deixou a seleção nacional após alegações de racismo e acabou se tornando bode expiatório para o desastre na Rússia, antes que Thomas Müller, Jerome Boateng e Mats Hummels fossem eliminados da seleção sem motivo aparente. Pelo menos dois dos três passaram a jogar o melhor futebol de suas carreiras nos últimos dois anos.
O que se seguiu nos dois anos desde a Rússia 2018 foi a morte lenta de qualquer orgulho ou esperança que os alemães tenham em sua seleção. Em campo, falta-lhes a imaginação e as qualidades ofensivas de um Müller, e há uma sangria de gols que poderia ser estancada por um Boateng ou um Hummels. Löw não está apenas enchendo os bolsos com 5 milhões de dólares por ano, mas também carece de humildade para reconhecer seus próprios erros – e tem havido muitos – ou da decência para demitir-se de um emprego ao qual não mais se adequa.
Se Löw não tiver a decência necessária, então certamente Keller e Bierhoff intervirão e farão a coisa certa? Sem chance. Löw continuará sendo o técnico da Alemanha até o Campeonato Europeu de 2021, embora todos, exceto ele, saibam que sua época já passou. Seus jogadores sabem, o público alemão sabe, Michael Ballack sabe, os jornalistas sabem, a DFB sabe.
Keller e Bierhoff ainda podem puxar o gatilho, mesmo que Löw não faça isso ele mesmo. Mas não prenda a respiração – Löw não vai a lugar nenhum. A única pergunta que falta responder é: qual o tamanho da vergonha que o outrora grande "Jogi" ainda trará para a reputação futebolística da Alemanha daqui para frente?
Michael da Silva é jornalista de esporte da DW. O texto reflete a opinião pessoal do autor, e não necessariamente da DW.