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Reconhecer "intersexo" é apenas primeiro passo

17 de agosto de 2018

Além de "masculino" ou "feminino", documentos alemães incluem agora o gênero "diverso". Um avanço, mas ainda há muito a fazer pela proteção e reconhecimento dos intersexuais, opina jornalista Pacinthe Mattar.

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Símbolo para terceiro sexo
Foto: Colourbox

Agora é oficial: na quarta-feira (15/08), o governo alemão aprovou um projeto de lei que permitirá que se opte por um terceiro gênero em documentos oficiais e de identidade.

Isso significa que quem não se identifica como masculino ou feminina – ou com anatomia sexual e reprodutiva ambígua – pode optar por se identificar como "inter/diverso" ou "diverso". A decisão do gabinete federal em Berlim ainda requer aprovação do Parlamento alemão.

Intersexualidade não é uma orientação sexual, refere-se especificamente às características biológicas de um ser humano. Intersexuais podem ser gays ou heterossexuais, e podem se identificar como masculinos, femininas ou não.

Muitas culturas e religiões reconhecem a intersexualidade: várias comunidades das nações indígenas no Canadá, por exemplo, já aceitam há muito tempo os com "dois espíritos", termo genérico referente a quem não se encaixa nas noções ocidentais de gênero e identidade sexual, que incorporando características masculinas e femininas.

Para inter- e trans-sexuais e gente que não se identifica com a representação masculina ou feminina, é de importância crucial a opção de poder se autoidentificar nos documentos pessoais de forma que reflita a própria realidade. No entanto, isso não resolve todos os problemas dos que já enfrentaram discriminação devido a seu status não binário, nem masculino nem feminino.

Tanto crianças quanto adultos intersexuais enfrentam discriminação, estigmatização e são muitas vezes submetidos a cirurgias alteradoras da anatomia, a fim de se adaptarem à binariedade masculina ou feminina. Por vezes esses procedimentos são coercivos ou, no caso de bebês e crianças, realizados sem o consentimento dos afetados.

A opção "terceiro gênero" alinha a Alemanha a outros países que tomaram passos para reconhecer intersexuais ou um terceiro sexo, como Áustria, Austrália, Nova Zelândia, Índia, Canadá, Portugal e algumas partes dos Estados Unidos.

A ONU estima que entre 0,05% e 1,7% da população mundial nasça com traços intersexuais – a percentagem máxima equivale aproximadamente ao total de ruivos em todo o mundo.

O passo tomado pela Alemanha tem sido considerado histórico por muitos ativistas, especialistas e legisladores, que também levantam outras questões sobre os direitos e liberdades dos intersexuais em todo o mundo.

As pessoas intersexo e que não se identificam como homem ou mulher têm o direito de se identificar como quiserem e de ter a sua identidade confirmada e reconhecida pelos governos, agências médicas e instituições públicas. Mas esse reconhecimento e direito à autoidentificação não são suficientes.

Ser capaz de se identificar como "diverso" num documento oficial, por exemplo, não torna mais fácil ou menos arriscado o uso de banheiros públicos para intersexuais e não conformes de gênero sem uma aparência clara masculina ou feminina: eles geralmente se deparam com olhares e atenção indesejados e até mesmo violência.

Intersexuais que não se encaixam nas aparências tradicionais masculina ou feminina são frequentemente submetidos a revistas pessoais desconfortáveis quando passam pela área de segurança em aeroportos e outros postos de controle – e a documentação oficial não vai necessariamente aliviar esse desconforto.

Os intersexuais também questionam se a identificação clara como "diverso" ou "intersexo" nos documentos de viagem oficiais pode colocá-los em risco ao entrar em países ou territórios que não reconhecem a designação.

Mesmo quem saúda a mudança, diz tratar-se apenas de um primeiro passo, e que há muito mais trabalho a ser feito para proteger os direitos daqueles de gênero não conforme. Outros temem que a decisão não seja de libertação, e sim de mais categorização e rotulação médica.

Para muitos, contudo, a medida representa um passo à frente num caminho desafiador para a liberação e aceitação. É uma compreensão de que a identidade sexual também não é um sim ou não, e que muitas vezes pode recair num espectro com muitas camadas e complexidades. Nas palavras de Sara Kelly Keenan, a primeira americana a ter incluído "intersexo" em sua certidão de nascimento, em 2016: "Há poder em saber quem se é."

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