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Opinião: Assange obtém vitória, mas não a liberdade

5 de fevereiro de 2016

Parecer da ONU dá vigor a fundador do Wikileaks, mas livre ele não estará tão cedo. Posição do Reino Unido e da Suécia enfraquece discurso desses países em favor dos direitos humanos, opina jornalista Matthias von Hein.

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Matthias von Hein é jornalista da redação alemã da DW

Foi um bofetada na orelha: um grupo de direitos humanos da Organização das Nações Unidas deu uma bronca nos sistemas judiciários britânico e sueco. O parecer do – pouco conhecido, é necessário dizer – Grupo de Trabalho sobre Detenção Arbitrária da ONU é claro: a detenção do fundador do Wikileaks, Julian Assange, é ilegal. A liberdade dele deve ser restituída imediatamente. Ele também deve ser indenizado pelos quase dois mil dias de detenção.

É necessário recapitular os fatos: até agora sequer houve uma acusação formal contra Assange. A Justiça britânica se refere a um mandado de detenção europeu. Este deriva do desejo de uma procuradora sueca de entrevistar Assange – na fase de investigação preliminar. A procuradora originariamente responsável pelo processo em Estocolmo descartou as acusações como improcedentes antes de elas serem retomadas pela procuradora da distante Gotemburgo.

Especificamente esta promotora é acusada pelo grupo de trabalho da ONU de procrastinar as investigações, prolongando-as excessivamente. Durante anos, ela tem insistido em ouvir Assange na Suécia, recusando um depoimento dado no Reino Unido. Muito embora, no mesmo período, investigadores suecos tenham recolhido mais de 40 depoimentos no Reino Unido sobre outros casos.

Se Assange não fosse o fundador do Wikileaks, provavelmente nem a Justiça sueca nem a britânica manteriam este cenário absurdo sobre o "depoimento" dele. Parece que, neste caso, trata-se menos de respeito à lei do que de abuso das leis, visando silenciar um jornalista inconveniente.

É possível supor que as autoridades dos Estados Unidos exerçam pressão por debaixo dos panos. Especialmente Assange, mas também outros colaboradores do Wikileaks fizeram inimigos poderosos em Washington. As publicações do Wikileaks revelam desde 2010 um lado sujo da política americana – especialmente envolvendo operações militares no Iraque e no Afeganistão.

O que veio à luz foi muito desconfortável para o establishment político. E este espumou de raiva, os políticos e militares pediram publicamente o assassinato de Assange na televisão dos EUA. Para o vice-presidente dos EUA, Joe Biden, Assange é um ciberterrorista.

Nenhuma administração dos EUA foi tão dura contra denunciantes como a de Barack Obama. Não se importando sequer com o respeito às leis. Como em 2013, quando o avião do presidente boliviano, Evo Morales, foi forçado a pousar em Viena quando voltava para a Bolívia vindo de Moscou. O motivo: havia a suspeita de que o denunciante Edward Snowden estivesse a bordo.

Diante de tais operações, a preocupação de Assange com uma possível extradição para os EUA não deve ser considerada uma mera desculpa. Mesmo que o Reino Unido e a Suécia assegurem que não dispõem de um pedido de extradição feito pelos Estados Unidos. Fato é que o FBI está investigando o Wikileaks. E parece provável que mandados de prisão ou pedidos de extradição já estejam nas gavetas e possam ser rapidamente enviados por fax.

O parecer de Genebra dá vigor a Assange. Liberdade, porém, ele não terá tão cedo. Pois os especialistas em Genebra não podem fazer mais do que elevar a pressão moral. Tanto o Reino Unido quanto a Suécia deixaram claro que não se sentem vinculados à decisão do grupo de trabalho. Isso reflete falta de visão e não é correto. Pois, muito além da persona Assange, eles enfraquecem sua própria posição em disputas de direitos humanos contra estados que não os respeitam. E isso eles estão aceitando sem pesar as consequências.