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Obama e Alemanha, um caso de amor com alguns percalços

Charlotte Potts
16 de novembro de 2016

Presidente dos EUA faz visita de despedida a Berlim, onde o povo alemão e a chanceler federal quase sempre o receberam de braços abertos. Desconfiança inicial, euforia e desilusão marcaram relação entre Obama e Merkel.

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Barack Obama e Angela Merkel em Berlim em 2013
Obama e Merkel em Berlim em 2013Foto: picture-alliance/dpa/EPA/M. Sohn

Houve um tempo em que Barack Obama foi tratado como uma estrela na Alemanha. Foi no verão de 2008 que o democrata visitou Berlim pela primeira vez. Mais de 200 mil pessoas se reuniram para assistir ao então candidato discursar em frente à Coluna da Vitória, no centro da capital. A chanceler federal alemã, Angela Merkel, não permitiu que o aspirante à presidência fizesse seu comício em frente ao Portão de Brandemburgo – um lugar popular, mas que raramente é cedido para discursos de líderes estrangeiros.

Esse foi talvez o primeiro contato entre a chanceler e o futuro presidente, dando início a um relacionamento que demorou para se tornar caloroso. Assim que Obama assumiu o cargo, os alemães apoiaram esmagadoramente o novo presidente.

Seu antecessor, George W. Bush, iniciou duas guerras – no Afeganistão e no Iraque. Quando o mandato dele se aproximava do fim, apenas 14% dos alemães tinham confiança na sua capacidade de lidar com questões internacionais. Obama trouxe nova esperança para o fim dos conflitos e para a melhoria das relações entre a Alemanha e os EUA.

No primeiro ano de seu mandato, 94% dos alemães confiavam nele. "Obama tornou os EUA novamente um parceiro internacional que age em concordância com outros. As relações transatlânticas melhoraram muito", disse à DW Jürgen Trittin, membro do comitê de Relações Exteriores do Partido Verde alemão e parlamentar pela sigla.

Mas enquanto a maioria dos alemães adorava o 44° presidente quando ele assumiu o cargo, a chanceler federal alemã e o líder dos EUA ainda precisavam aprender a adorar um ao outro. No início da presidência de Obama, Merkel teria expressado dúvidas sobre o jovem presidente.

Uma amizade de oito anos

Pessoas próximas dos dois líderes contam que o par foi formando um laço baseado nas semelhanças de personalidade e em interesses políticos mútuos. A amizade internacional de Obama e Merkel foi se fortalecendo ao longo dos anos, culminando nos elogios do líder americano à colega alemã por sua política migratória. "Ela está no lado certo da história", disse Obama sobre a decisão da chanceler de abrir as fronteiras para 800 mil refugiados em 2015.

Obama discursou em Berlim durante a campanha de 2008
Obama discursou em Berlim durante a campanha de 2008Foto: picture-alliance/dpa/R. Jensen

"A chanceler Merkel tem sido consistente, ela tem sido firme, ela é confiável. Ela tem um ótimo senso de humor, que não exibe o tempo todo em coletivas de imprensa. É por isso que ela tem sido uma líder tão duradoura – porque é cuidadosa com o que diz", declarou Obama em abril de 2016 durante uma visita a Hanover

Durante os seus oito anos juntos como líderes de seus respectivos países, Obama e Merkel tornaram-se a pedra angular da aliança transatlântica. Apesar dos muitos desafios, incluindo o escândalo envolvendo a Agência de Segurança Nacional (NSA) dos EUA.

Uma pedra no caminho

Em 2013, reportagens revelaram que o serviço de inteligência americano estava coletando quantidades enormes de dados de cidadãos alemães – e grampeando o telefone de Merkel. A chanceler não gostou nem um pouco: "Espionagem entre amigos não é aceitável", disse ela.

A situação só foi resolvida quando o chefe de gabinete de Obama foi a Berlim para acalmar os ânimos – um raro gesto de mediação após Merkel ter expulsado o chefe da base da CIA em Berlim por causa da suspeita de que a agência americana estava recrutando funcionários dos serviços de inteligência alemães.

O caso de amor entre o público alemão e Obama também não se manteve estável. Ainda que algumas pesquisas indicassem que 92% dos alemães teriam votado nele em sua segunda disputa presidencial, em 2012, a confiança no presidente americano foi ladeira abaixo com o escândalo da NSA. As revelações de Edward Snowden alimentaram o medo do alcance excessivo da vigilância americana.

Sob Obama, os militares lutaram com menos soldados em terra, mas passaram a usar mais drones aéreos – algo que não foi visto com bons olhos por muitos na Alemanha. Também foi controverso o seu fracasso em fechar a prisão da Baía de Guantánamo, em Cuba, apesar das promessas de campanha de que isso seria feito. E milhares saíram às ruas para protestar contra um dos projetos fundamentais de Obama, o Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP, na sigla em inglês).

Futuro incerto

Grande parte das críticas, no entanto, passou para o segundo plano diante da vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais de novembro. A maioria dos políticos alemães não conseguiu esconder seu espanto diante do resultado da eleição: eles esperavam ver Hillary Clinton como uma parceira confiável na Casa Branca.

Protesto contra espionagem da NSA
Escândalo da NSA abalou relação entre EUA e AlemanhaFoto: picture alliance/dpa/P. Steffen

Desde a eleição de Trump, Merkel foi declarada a "última defensora do Ocidente liberal" pelo jornal The New York Times e "líder do mundo livre" pelo The Guardian. Quando Obama visitar Berlim nestas quinta e sexta-feira (16 e 17/11), a maior parte das discussões entre o "velho" e a "nova" líder do mundo livre deve se desdobrar sobre como defender os princípios do Ocidente.

Essa vai ser a sexta vez que Obama visita a Alemanha em seus dois mandatos como presidente – o país mais visitado junto com a França. Mas não há outro país com exceção dos EUA onde o Air Force One, o avião do presidente, tenha pousado mais frequentemente do que a Alemanha. A base militar americana em Ramstein funciona como um hub para o avião presidencial sempre que ele voa para o Oriente Médio, a África e a Ásia.

Turnê de despedida

O dia estava abafado quando Obama visitou Berlim em 2013 e finalmente teve a oportunidade de falar em frente ao Portão de Brandemburgo. Lá ele tirou o paletó e disse para a multidão fazer o mesmo se estivesse com calor. Os espectadores o aplaudiram. Eles gostaram da descontração natural de Obama – uma característica não muito comum entre os políticos alemães.

Os alemães também gostaram que quando o presidente americano retirou a maior parte das tropas do país do Afeganistão e do Iraque. Eles gostaram do fato de ele ter sido capaz de expandir o acesso à saúde para os americanos. E eles gostaram do compromisso dele no combate às mudanças climáticas.

"Muitos alemães conseguiam se conectar à agenda progressista do presidente Obama", disse à DW Niels Annen, assessor de política externa do Partido Social Democrata (SPD), antes da visita do líder dos EUA. "E eles ainda estão fascinados com a personalidade dele. Nós vamos sentir falta dele. Já estamos sentido."

Ainda que a euforia de oito anos atrás tenha se dissipado de alguma forma em 2016, quando Obama se despedir de Berlim, muitos na Alemanha vão continuar vendo-o como melhor que o antecessor, Bush, e preferível ao sucessor, Trump. Pelo menos por enquanto. Os alemães vão se lembrar de Obama como um farol, ainda que este não tenha atendido a todas as expectativas.