Por meses, o candidato social-democrata a chanceler da Alemanha, Martin Schulz, tentou e não conseguiu encontrar um assunto para roubar alguns pontos da popularidade de sua rival, Angela Merkel. Em entrevista publicada neste domingo (23/07) pelo jornal alemão Bild am Sonntag, Schulz tocou, pela primeira vez de forma incisiva, no que talvez seja o calcanhar de Aquiles da atual chefe de governo: sua política em relação aos migrantes de países muçulmanos.
"Em 2015, mais de 1 milhão de refugiados vieram para a Alemanha, a maior parte deles, sem um monitoramento do governo", afirmou Schulz. "A chanceler abriu nossa fronteira com a Áustria por razões humanitárias, mas, infelizmente, o fez sem consultar nossos parceiros na Europa. Se não agirmos agora, essa situação pode se repetir."
Leia a cobertura completa sobre a eleição na Alemanha em 2017
Merkel prometeu aos eleitores alemães que não haverá uma repetição do que aconteceu há dois anos, quando centenas de milhares de pessoas chegaram à Alemanha, muitas fugindo da Síria devastada pela guerra. O fluxo diminuiu no ano passado, mas pode voltar a crescer, à medida que muitos tentam escapar da incerteza política e das dificuldades econômicas de lugares como Nigéria e Eritreia, através de países do norte da África, como a Líbia.
Aumento de chegadas
Mais de 70 mil migrantes realizaram a travessia extremamente perigosa do Mediterrâneo, chegando à Itália no primeiro semestre deste ano e provocando um aumento de chegadas de mais de 25% em relação a 2016. A Itália pediu ajuda a outros Estados da UE para lidar com os recém-chegados, mas até agora teve seu apelo ignorado.
Schulz acusa Merkel de ignorar problema dos refugiados
Schulz, que vai à Itália nesta quinta-feira, diz que a Comissão Europeia deveria pagar outros Estados-membros para que eles aceitem migrantes e acusa Merkel de inação estratégica nas vésperas da eleição parlamentar de setembro na Alemanha. "Aqueles que tentam ganhar tempo, ignorando a questão até as eleições nacionais, estão apenas sendo cínicos", acusou o candidato.
No auge da crise dos refugiados em 2015 e no início de 2016, Merkel e seu partido amargaram baixas históricas nas pesquisas de opinião, com mais de 80% dizendo acreditar que o governo não tinha controle sobre a situação. Desde então, a chanceler se recuperou e lidera as sondagens, com cerca de 15 pontos percentuais à frente dos social-democratas de Schulz.
Embora Schulz tenha tentado ganhar pontos com o assunto, Merkel não tem grandes motivos para temer os ataques da esquerda. A maior ameaça pode vir da direita. Quanto mais o número de imigrantes cresce, maior a pressão para restringir o fluxo de pessoas que chega à Europa vindas do Oriente Médio e do norte da África.
Populistas capitalizam
O vínculo entre a política de refugiados e a popularidade do partido populista de direita Alternativa para a Alemanha (AfD) não pode ser negado. Eles deram um salto considerável nas pesquisas em 2016, conseguindo mais de 20% dos votos em algumas eleições regionais alemãs, à medida que os efeitos das chegadas de refugiados dos anos anteriores se tornavam evidentes.
Mas quando a rota migratória dos Bálcãs foi, em grande parte, fechada, o número de refugiados caiu, e a popularidade da AfD também. O partido atualmente atrai entre 7% e 9% das intenções de voto. A queda é atribuída a brigas internas da legenda, mas também ao sentimento comum entre a população de que a "crise" dos refugiados está se arrefecendo.
A perda de força da AfD coincide com a recuperação da popularidade dos conservadores de Merkel nas pesquisas de opinião. Mas essa tendência pode muito bem ser revertida, caso o crescente número de migrantes que chegam à Itália resulte em um aumento nas novas chegadas à Alemanha antes das eleições.
Um estudo publicado pela Fundação Bertelsmann em novembro passado revelou que o medo da globalização é o principal motor do apoio ao populismo de direita na Europa e que a questão dos refugiados desempenha um papel crucial na formação desse medo.
Tudo isso sugere que um aumento do número de migrantes que chegam à Alemanha nos próximos meses poderia beneficiar a AfD nas pesquisas e, possivelmente, afetar as pretensões de Angela Merkel de obter um quarto mandato como chanceler.
-
2015, o ano dos refugiados
Chegada à União Europeia
Esses jovens sírios superaram uma etapa perigosa da sua viagem: eles conseguiram chegar à Grécia e, assim, à União Europeia. O objetivo final, porém, ainda não foi alcançado: eles querem continuar a jornada para o norte, em direção a outros países-membros do bloco. Em 2015, a maioria dos refugiados seguiu para a Alemanha e para a Suécia.
-
2015, o ano dos refugiados
Perigosa travessia do Mediterrâneo
O caminho que eles deixam para trás é extremamente perigoso. Vários barcos com refugiados, nem sempre aptos à navegação, já viraram durante a travessia do Mar Mediterrâneo. Estas crianças sírias e seu pai tiveram sorte: eles foram resgatados por pescadores gregos na costa da ilha de Lesbos, na Grécia.
-
2015, o ano dos refugiados
A imagem que comoveu o mundo
Aylan Kurdi, de 3 anos, não sobreviveu à fuga. No início de setembro, ele se afogou no Mar Egeu, juntamente com o irmão e a mãe, ao tentar chegar à ilha grega de Kos. A foto do menino sírio, morto na praia de Bodrum, espalhou-se rapidamente pela mídia e chocou pessoas de todo o mundo.
-
2015, o ano dos refugiados
Onde as diferenças são visíveis
A ilha grega de Kos, a menos de 5 quilômetros de distância da Turquia continental, é o destino de muitos refugiados. As praias geralmente cheias de turistas servem de ponto de desembarque, como no caso deste grupo de refugiados paquistaneses que chegou à costa da Grécia com um bote de borracha.
-
2015, o ano dos refugiados
Em meio ao caos
Porém, muitos refugiados não conseguem simplesmente seguir viagem quando chegam a Kos. Eles somente podem seguir para o continente após serem registrados. Durante o verão europeu, a situação se agravou quando as autoridades fizeram com que os refugiados esperassem pelo registro num estádio, sob o sol escaldante e sem água.
-
2015, o ano dos refugiados
Um navio para refugiados
Por causa da condições precárias, tumultos eram frequentes na ilha de Kos. Para acalmar a situação, o governo grego fretou um navio, que permaneceu ancorado e foi transformado em alojamento temporário para até 2.500 pessoas e em centro de registro de migrantes.
-
2015, o ano dos refugiados
"Dilema europeu"
Mais ao norte, na fronteira da Grécia com a Macedônia, policiais não permitiam mais a passagem de pessoas, entre elas crianças aos prantos, separadas de seus pais. Esta foto tirada pelo fotógrafo Georgi Licovski no local, e que mostra o desespero de duas crianças, foi premiada pelo Unicef como a imagem do ano, já que mostra "o dilema e a responsabilidade da Europa".
-
2015, o ano dos refugiados
Sem conexões para refugiados
No final do verão europeu, Budapeste se transformou em símbolo do fracasso das autoridades e da xenofobia. Milhares de refugiados estavam acampados nas proximidades de uma estação de trem da capital húngara, pois o governo do país os proibira de seguir viagem. Muitos decidiram seguir a pé em direção à Alemanha.
-
2015, o ano dos refugiados
Fronteiras abertas
Uma decisão na noite de 5 de setembro abriu caminho para os refugiados: a chanceler federal alemã, Angela Merkel, e o chanceler austríaco, Werner Faymann, decidiram simplesmente liberar a continuação da viagem por parte dos migrantes. Como consequência, vários trens especiais e ônibus seguiram para Viena e Munique.
-
2015, o ano dos refugiados
Boas vindas em Munique
No primeiro final de semana de setembro, cerca de 20 mil refugiados chegaram a Munique. Na estação central de trem da capital da Baviera, inúmeros voluntários se reuniram para receber os refugiados com aplausos e lhes fornecer comida e roupas.
-
2015, o ano dos refugiados
Selfie com a chanceler
Enquanto a chanceler federal Angela Merkel era aplaudida por refugiados e defensores de sua política de asilo, muitos alemães se voltavam contra a política migratória. "Se tivermos de pedir desculpas por mostrar uma face acolhedora em situações de emergência, então este não é mais o meu país", respondeu a chanceler. A frase "Nós vamos conseguir" se tornou o mantra de Merkel.
-
2015, o ano dos refugiados
Histórias na bagagem
No final de setembro, a polícia federal alemã divulgou uma imagem comovente: o presente que uma menina refugiada deu a um policial da cidade alemã de Passau. O desenho mostra o horror que vários migrantes vivenciaram e o quão felizes eles estavam por, finalmente, estarem em um local seguro.
-
2015, o ano dos refugiados
O drama continua
Até o final de outubro, mais de 750 mil refugiados haviam chegado à Alemanha. Mas o fluxo não parava. Sobrecarregados, os países da chamada Rota dos Bálcãs decidiram fechar suas fronteiras. Apenas sírios, afegãos e iraquianos estavam autorizados a passar. Em protesto, migrantes de outros países chegaram a costurar seus lábios.
-
2015, o ano dos refugiados
Sem fim à vista
"Ajude-nos, Alemanha" está escrito em cartazes de manifestantes na fronteira com a Macedônia. Na Europa, o inverno se aproxima, e milhares de pessoas, entre elas crianças, estão presas nas fronteiras. Enquanto isso, até mesmo a Suécia retomou o controle temporário de fronteiras. Em 2016, o fluxo de refugiados deverá continuar.
Autoria: Greta Hamann (fc)