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HistóriaAlemanha

O partido que nasceu das cinzas do comunismo da RDA

Marcel Fürstenau 29 de setembro de 2015

Para remanescentes do regime alemão oriental, caminho foi mais árduo do que em países do Leste. Mas esquerdistas se firmaram no país reunificado e hoje, através da legenda A Esquerda, fazem parte do espectro político.

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A Esquerda foi criado em 2007
Foto: picture-alliance/dpa/K. Nietfeld

O polonês Aleksander Kwasniewski, o romeno Ion Iliescu e o alemão Hans Modrow têm um ponto em comum: durante a Guerra Fria, todos os três políticos integraram a casta dirigente comunista em seus respectivos países. No entanto, ao contrário de Kwasniewski e Iliescu, o alemão desapareceu do palco político logo após o colapso do Bloco Oriental.

Em 1995, Kwasniewski, então ex-ministro da Juventude, foi eleito presidente da Polônia, conseguindo impor-se até mesmo contra o legendário ativista dos direitos civis Lech Wałęsa. Iliescu, ex-secretário do Comitê Central da Romênia, inicialmente sucedeu o ditador Nicolae Ceausescu, fuzilado no Natal de 1989, e cinco meses depois vencia as eleições presidenciais.

Modrow não pôde sequer sonhar com uma carreira assim. Logo após a queda do chefe de Estado e de partido da República Democrática Alemã (RDA), Erich Honecker, ele ainda ocupou o posto de primeiro-ministro. Contudo, na Alemanha pouco depois reunificada, além de um mandato parlamentar só lhe sobrou um título de "presidente honorário" do novo Partido do Socialismo Democrático (PDS).

Esse foi o nome adotado pela antiga legenda única na RDA, o Partido Socialista Unitário da Alemanha (SED). Após a queda da Alemanha Oriental, seu destino parecia selado: a sigla estava indelevelmente associada à construção do Muro de Berlim e aos muitos mortos na fronteira entre as Alemanhas.

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Hans Modrow (esq.) e então chanceler federal Helmut Kohl, celebram queda do Muro em 1989Foto: picture-alliance/dpa

Gregor Gysi, estrela pós-comunista

Apesar de tamanha hipoteca histórica, os ex-comunistas seguiram desempenhando um papel político na República Federal da Alemanha (RFA) unificada.

Seus principais políticos estavam fora de cogitação para os cargos estatais e governamentais mais altos. Porém, no leste do país, o PDS se estabeleceu rapidamente, e há 25 anos é um elemento de peso nos Legislativos estaduais.

Como parceiro de coalizão do Partido Social-Democrata (SPD), ele chegou a se estabelecer como fator de poder na década de 90. Assim, se desmentiam os prognósticos de que mais cedo ou mais tarde os pós-comunistas sumiriam do panorama político.

No início, a figura central para a sobrevivência e prosperidade da legenda sucessora do SED foi Gregor Gysi. Como primeiro presidente do PDS, o advogado de Berlim Oriental guiou o partido politicamente falido, mas financeiramente bem dotado, através dos turbulentos meses que sucederam a queda do Muro. Desde então, é ele que mexe os pauzinhos, diante e por trás dos bastidores.

Dotado de alta inteligência, retórica refinada e presença de espírito, Gysi é totalmente o contrário do estereótipo de um maçante funcionário da velha escola comunista alemã. Com magnetismo e carisma, no início do século ele preparou o caminho para a entrada do PDS no governo da cidade-estado Berlim. Por um breve período Gysi foi vice do prefeito Klaus Wowereit, o social-democrata que mais tarde ganharia projeção internacional.

Deutschland DDR SED-Sonderparteitag 1989 in Berlin
Gregor Gysi na convenção partidária extradordinário do SED em 1989Foto: ullstein bild - ADN-Bildarchiv

Nasce o A Esquerda

A aliança PDS-SPD na antiga cidade de fronteira foi possivelmente o mais importante impulso modernizador para os ex-comunistas. O que ainda faltava era o salto para a parte ocidental do país.

Um colaborador involuntário nesse sentido foi o então chanceler federal social-democrata, Gerhard Schröder, em pessoa. Com suas reformas radicais do mercado de trabalho e da economia, ele jogou numerosos representantes da ala de esquerda de seu partido nos braços abertos do PDS.

Nesse processo, a figura alemã ocidental de integração foi um companheiro de longa data de Schröder: Oskar Lafontaine. O ex-líder social-democrata e ex-ministro se transformou a figura de proa do Alternativa Eleitoral Trabalho e Justiça Social (WASG), fundado em 2005. Dois anos mais tarde, esse partido e o PDS uniam suas forças para fundar o A Esquerda (em alemão: Die Linke).

Avanço em nível federal

Em largas linhas, a jovem legenda alcançara sua meta de se tornar uma força política em toda a Alemanha – e não apenas nos antigos estados da RDA. Nas metrópoles e áreas de grande concentração demográfica como a região do Vale do Ruhr, os novos esquerdistas já compõem o establishment. Só nas regiões de economia mais próspera e estruturas mais conservadoras, como o sul e o sudoeste, eles ainda encontram dificuldade para se firmar.

O A Esquerda comemorou sua maior vitória em nível estadual no pleito legislativo da Turíngia de 2014. Desde então, o estado livre no leste alemão é governado por Bodo Ramelow, natural da Alemanha Ocidental.

O fato de na bancada parlamentar do partido estarem sentados deputados que trabalharam para o Stasi, a polícia secreta da RDA, confirma, por um lado, a existência de sombras do passado que persistem até hoje. Por outro lado, elas atualmente são pequenas demais para chegar a obscurecer a facção esquerdista como um todo.

Deutschland Gregor Gysi und Oskar Lafontaine Wahlkampf 2009
Gysi (esq.) e Oskar Lafontaine na campanha eleitoral federal de 2009Foto: imago/Seeliger

Líder se retira, A Esquerda prossegue

Nos primeiros anos após a queda da RDA, parte dos políticos do oeste, sobretudo conservadores católicos, praticou uma "campanha das meias vermelhas", de rechaço a todos os remanescentes da política do extinto Estado. No entanto, ao jogar grosseiramente na mesma panela antigos e novos esquerdistas, a campanha acabou fortalecendo os ex-comunistas.

No 25º aniversário da Reunificação alemã, o A Esquerda, erguido sobre as cinzas do comunismo, é parte integrante da paisagem política nacional. A estabilidade do partido é tamanha que ele é capaz de resistir ao afastamento de sua estrela máxima, Gregor Gysi. Em meados de outubro, o político não mais se candidatará à presidência da bancada esquerdista no Parlamento, onde desde 2013 o partido é a principal força oposicionista.

Entretanto o sonho de Gysi, de uma participação do A Esquerda no governo federal, ainda poderá levar bastante tempo para se concretizar. No momento são muito pronunciadas as diferenças programáticas em relação ao SPD e ao Partido Verde, os quais, ao longo dos anos se moveram mais em direção ao centro. Quem ocupa o posto vago no limite do espectro político é o partido que se chama, justamente, A Esquerda.