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Mudanças climáticas causam danos à saúde infantil

Irene Baños Ruíz ca
14 de novembro de 2019

Novo estudo alerta que o aquecimento global representa grande ameaça à saúde das crianças e pode influenciar o futuro de toda uma geração. "A situação deverá ficar muito pior se não tomarmos medidas imediatas."

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Criança de aparência doente deitada no colo da mãe
Aumento da temperatura global propricia a propagação da malária Foto: Paula Bronstein/Getty Images

Em Nova Délhi, na Índia, pediatras dizem que os pulmões das crianças não são mais róseos, mas pretos. O aquecimento do planeta já está afetando a saúde infantil no mundo todo e moldará o futuro de uma geração inteira, se não se conseguir limitar o aquecimento global bem abaixo de 2 °C, aponta o relatório da organização Lancet Countdown para 2019, que mostra o impacto das mudanças climáticas na saúde humana.

"Nos últimos 30 anos, vimos um declínio progressivo do número de mortes de jovens, adultos e de crianças", disse à DW o pediatra Anthony Costello, copresidente da Lancet Countdown. "Mas o que nos preocupa é que todos esses ganhos possam ser revertidos se não enfrentarmos urgentemente o problema das mudanças climáticas."

A pesquisa – compilada por 35 instituições globais, incluindo a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Banco Mundial – mostra claramente a relação entre mudanças climáticas, destruição ambiental e saúde.

As temperaturas crescentes impulsionam a fome e a desnutrição, e geram um aumento das doenças infecciosas, em escala e volume, e uma frequência cada vez maior de eventos climáticos extremos, à medida que a poluição atmosférica se tornou tão mortal para o pulmão humano quanto o tabaco.

Acesso difícil a alimentos

Um bebê nascido hoje estará exposto aos impactos das mudanças climáticas desde o início de sua vida. O aumento das temperaturas, a seca e as inundações devastam as colheitas, causando queda da produção global. Isso priva os habitantes de seus meios de subsistência e faz aumentar os preços dos alimentos, o que por sua vez leva à fome e à desnutrição, principalmente em países que dependem muito da agricultura, como Burkina Faso.

"A desnutrição aguda em crianças de cinco anos de idade em Burkina Faso está acima de 10%", relata Maurice Ye, natural do país africano e consultor do Programa Nacional de Controle da Malária em Madagáscar. "Isso aumentará se nada for feito para resolver o problema."

Na Índia, a desnutrição já é a causa de dois terços das mortes de crianças com menos de cinco anos, afirma o relatório do Lancet. Embora a desnutrição esteja frequentemente ligada à fome, ela também pode ser resultado da ingestão de alimentos pouco saudáveis.

Mas com o aumento dos preços de produtos básicos, como cereais, os consumidores são motivados a comprar alimentos processados mais baratos. "Isso alimenta o outro extremo do espectro da desnutrição, que é o sobrepeso e a obesidade", explica Poornima Prabhakaran, vice-diretora do Centro de Saúde Ambiental da Fundação de Saúde Pública da Índia e coautora do relatório.

Terreno mortalmente fértil

Crianças menores de cinco anos também sofrerão mais com o aumento de doenças infecciosas. A elevação da temperatura, a mudança dos padrões pluviais e os altos níveis de umidade facilitam a disseminação de bactérias que causam doenças diarreicas, como a cólera, além de criar condições ideais para a propagação de mosquitos portadores de agentes da malária ou dengue.

Em 2017, estimativas indicam 435 mil mortes por malária em todo o mundo, e a cada dois minutos uma criança em algum lugar do planeta morre da doença, de acordo com a Organização Mundial da Saúde. Isso é particularmente preocupante para países como Burkina Faso, onde a malária causou mais de 28 mil mortes apenas em 2018, estima a OMS.

Mas as mudanças climáticas também permitirão que esses mosquitos transmissores de doenças cheguem a novos países, como os do sul da Europa. Cerca de metade da população mundial corre agora risco de contrair dengue, diz o relatório do Lancet.

Se sobreviverem à desnutrição e doenças infecciosas, relata o estudo, as crianças talvez não sejam poupadas da poluição atmosférica, que pode reduzir sua função pulmonar, piorar a asma e aumentar o risco de ataques cardíacos e derrames. A poluição do ar em ambientes externos por micropartículas (PM2.5 – até 2,5 micrômetros) já contribui para 2,9 milhões de mortes precoces em todo o mundo.

Crianças asiáticas de máscara antipoluição
Para crianças da China e outros países, máscaras já são vitais devido ao smogFoto: Reuters

Calor e frio

A saúde de uma criança nascida hoje também pode ser prejudicada por eventos climáticos extremos, como incêndios e ondas de calor. Desde 2001, as populações de 152 países (de um total de 196) vivenciaram um aumento da exposição a incêndios florestais, resultando em mortes diretas e doenças respiratórias.

Por sua vez, as temperaturas recorde são particularmente preocupantes para os idosos com mais de 65 anos de idade. "Os impactos causados pelas altas temperaturas na saúde incluem exaustão pelo calor, hipertermia e agravamento de doenças cardiovasculares e respiratórias pré-existentes", explica Prabhakaran. O calor também pode causar desidratação em crianças e idosos, apontam os especialistas.

Embora o mundo esteja se aquecendo, o frio também representa um risco para quem tem pouco ou nenhum acesso à energia. "Isso mata mais do que o calor em geral", observa Costello. "Mas muito é devido a fatores sociais." À medida que as desigualdades crescem em todo o mundo, mais gente se encontra em situação de vulnerabilidade, aponta o copresidente da Lancet Countdown.

Prabhakaran diz esperar que os impactos na saúde sejam o ponto de virada para os legisladores relutantes. "O que precisamos fazer é trazer a saúde para o centro do discurso. Os impactos da combustão de combustíveis fósseis na saúde podem ser um forte argumento para o abandono do carvão", afirma a médica.

Anthony Costello, Maurice Ye e Poornima Prabhakaran dizem concordar que o primeiro passo para reduzir o sofrimento de todas as crianças nascidas hoje é a mudança em direção a um mundo descarbonizado.

Isso é tecnicamente possível, dizem os especialistas, mas serão necessárias políticas mais rígidas e vontade política real. A falta de ação não é mais uma opção. "A situação deverá ficar muito, muito pior, a menos que tomemos medidas imediatas", alerta Costello.

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