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Paisagem urbana

Carlos Albuquerque4 de março de 2008

Arquitetura em vez de simbologia. Pouco mais de um ano após a implantação da lei municipal que livrou a cidade de São Paulo de letreiros e outdoors, imprensa alemã faz avaliação positiva da iniciativa.

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Limpeza visual de São Paulo repercute na Europa
Aprendendo com São Paulo: europeus avaliam Lei Cidade LimpaFoto: AP

Em sua última edição, a Baunetz, a mais influente revista de arquitetura e urbanismo da Alemanha, traz o especial São Paulo – Cidade Limpa, retratando as mudanças na cidade após a implantação da Lei Cidade Limpa, de 2006, que restringiu a área de propaganda nos prédios, calçadas e ruas da cidade de São Paulo.

Assim como a Baunetz, a importante revista de economia Wirtschaftswoche, o canal de televisão Arte e até mesmo o cineasta Wim Wenders já se ocuparam do tema. As fotos do artista plástico paulistano Tony de Marco, que documentou a desmontagem das propagandas na cidade, aparecem no novo filme do cineasta alemão.

Todos são da opinião que principalmente a arquitetura lucrou com a limpeza visual da maior cidade brasileira e enfatizam as pesquisas que apontam a satisfação dos habitantes da cidade com a nova lei. Devido à nudez de alguns edifícios, não faltam, todavia, irônicas comparações com a antiga arquitetura socialista.

Buenos Aires e Rio de Janeiro pensam em seguir o exemplo paulistano, afirma a mídia. Se a iniciativa do prefeito Gilberto Kassab fizer escola, a cultura arquitetônica de consumismo, propagada a partir de Las Vegas ou Nova York, está com os dias contados em outras cidades latino-americanas.

Supermodelos que cobriam toda uma fachada

H&M Plakat in der Schweiz
Propaganda esconde a arquiteturaFoto: AP

Entre outras determinações, a lei sancionada em setembro de 2006 estipula área máxima de propaganda de 1,5 metro quadrado para fachadas com até 10 metros quadrados de área. Para fachadas entre 10 e 100 metros quadrados, os anúncios não devem ultrapassar os 4 metros quadrados de área. Outdoors, cartazes, faixas e placas foram proibidos. Nos cinemas e teatros, a área dos pôsteres não deve ultrapassar 10% do total da fachada.

"Como se modifica uma cidade, onde a propaganda desapareceu do espaço público?", pergunta a mídia alemã, pouco mais de um ano após a implantação da iniciativa.

Segundo a Baunetz, a arquitetura, até então corroída por fotos de supermodelos que cobriam toda uma fachada, retomou seu lugar no espaço urbano. Em vez de dizer "dobre à esquerda no outdoor da Gucci", o transeunte de hoje informa o caminho desta forma: "ande até o Museu de Arte de São Paulo e depois dobre à esquerda no edifício da Petrobrás".

Berlim Oriental antes da queda do Muro

30.04.2005 kultur.21 las vegas
Las Vegas fez escolaFoto: dw-tv

A nova visibilidade da arquitetura de alguns prédios paulistanos não deixa de ser comparada, no entanto, com a arquitetura moderna pré-fabricada dos países socialistas. A TV franco-alemã Arte afirma que, para alguns visitantes, São Paulo lembra agora Berlim Oriental antes da queda do Muro e o jornal austríaco Die Presse afirma que, para outros, a cidade se compara a Moscou nos anos de 1950.

Em sua maioria, as críticas alemãs são positivas. Rio de Janeiro e Buenos Aires pretendem se espelhar em São Paulo, afirma a imprensa, enfatizando que pesquisas de opinião apontam uma satisfação de cerca de 60% da população paulistana com a limpeza visual urbana.

A emissora Deutschlandradio mencionou também a insatisfação de alguns teóricos da cultura que consideram os letreiros luminosos de Nova York símbolo de cidade internacional. Tais teóricos seriam da opinião que a propaganda torna a cidade mais colorida e mais alegre.

Aprendendo com São Paulo

Copan Haus - São Paulo
Arquitetura tem nova chance em SPFoto: Michel Moch

A emissora alemã reporta, provavelmente, à idéia surgida nos Estados Unidos, que ecoou em toda a América Latina. Desde os anos de 1940, a idéia de uma arquitetura visual de letreiros e outdoors foi sugerida como opção à falta de ornamento propagada pela arquitetura moderna. Com o pós-modernismo, esta idéia tomou corpo, nos anos de 1960, em livros como Complexidade e Contradição e Aprendendo com Las Vegas, do arquiteto norte-americano Robert Venturi.

Um dos grandes erros de muitos críticos da arquitetura moderna foi confundir ornamento com decoração e, no caso de Venturi, reduzir o ornamento à simbologia comunicativa. Em Aprendendo com Las Vegas, Venturi defendia uma paisagem urbana dominada por anúncios e letreiros como forma de suprir a falta de referência urbana que a arquitetura moderna não proporcionaria.

Esta posição, que se espalhou tanto quanto a cultura de consumo norte-americana, considerou a arquitetura como algo secundário. Surgiram então os galpões decorados. A atitude paulistana pode ser lida, assim, como uma revisão desta política urbana de consumo, surgindo aí uma nova chance para a arquitetura.