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Jurista questiona excomunhão coletiva de mafiosos pelo Papa

Klaus Krämer (cn)24 de junho de 2014

Para ter valor legal, excomunhão precisa ser individual e baseada em ações concretas, afirma professor de Direito religioso. Gesto do Papa transmite sobretudo sinal político.

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Foto: Vincenzo Pinto/AFP/Getty Images

Apesar de ter durado apenas um dia, a recente visita do papa Francisco a uma das regiões mais pobres da Itália teve um toque incomum. Durante uma missa na Calábria, no último sábado (21/06), o pontífice fez um forte apelo em favor da luta contra a 'Ndrangheta, a máfia local, pedindo que esse mal seja combatido e eliminado.

"Precisamos dizer não a ele", afirmou Francisco na cidade de Cassano allo Ionio, diante de 200 mil fiéis – quatro vezes mais do que os 50 mil esperados. "Os que, em suas vidas, seguem o caminho do mal, como os mafiosos, não estão em comunhão com Deus. Eles estão excomungados."

Foi a primeira vez que um Papa declarou excomungados todos os integrantes da máfia, ou seja, excluídos da comunidade católica. Mas a declaração, recebida com elogios pela maioria dos cristãos, não é contemplada pelo Direito Canônico, afirma Thomas Schüller, professor de Direito Religioso da Universidade de Münster.

"Trata-se de uma excomunhão que precisa ser vista do ponto de vista político, pois uma excomunhão precisa ser sempre direcionada a uma única pessoa, indicando a ação comprovadamente executada e suas consequências legais", considera Schüller. O especialista reforça que, por esse motivo, uma excomunhão coletiva não tem efeito.

Importância política

Em 1994, bispos sicilianos já haviam escrito num documento pastoral que "a máfia pertence, sem exceção, ao reino do pecado". Todos que a integram voluntariamente precisam saber "que vivem em contradição incurável com o Evangelho de Jesus Cristo e, portanto, fora da comunidade católica", afirma o texto. Na época, os bispos não falaram diretamente em excomunhão.

Papst Franziskus Messe in Sibari 21.06.2014
Missa reuniu 200 mil fiéis em Cassano allo IonioFoto: Vincenzo Pinto/AFP/Getty Images

Schüller salienta o caráter de advertência legítimo desse documento, mas reitera que bispos, nem mesmo o Papa, não podem simplesmente colocar sob suspeita de excomunhão um grupo de pessoas que ainda precisariam ser identificadas nominalmente.

Assim, a mensagem transmite um sinal político: "Vocês não fazem mais parte da Igreja Católica, pois têm um objetivo desumano, ou seja, acabar com a vida."

Schüller também observa que, com a excomunhão dos mafiosos, Francisco permanece fiel ao seu estilo, "agindo contra todos os pecados estruturais". Já nos seus primeiros escritos, ele censurou o capitalismo desenfreado. "Ele diz que isso inclui cartéis e sistemas políticos e econômicos, além da máfia", diz o especialista.

Schüller avalia com ceticismo os efeitos práticos da declarada excomunhão dos mafiosos. "O importante nessa mensagem é o ostracismo social nela embutido", comenta. Pode-se esperar que, após essas palavras, ao menos alguns mafiosos reconsiderem seus atos. "Mas sou um tanto cético quanto a isso."