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Juiz não decide pensando em política, diz Moro

Mariana Santos, de Chicago, EUA9 de abril de 2016

Em palestra para brasileiros nos EUA, ele afirma que não havia mais condição de "varrer a corrupção para debaixo do tapete", cobra que empresários não aceitem pagar propina e garante não gostar da popularidade.

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Juiz federal Sérgio Moro: "não acerto todas, mas procuro decidir conforme a lei"Foto: Imago

Durante uma palestra para estudantes brasileiros na noite desta sexta-feira (08/04), em Chicago, nos EUA, o juiz federal Sérgio Moro reconheceu que a operação Lava Jato vem gerando “instabilidade política” no Brasil, mas ressaltou que justiça é diferente de política, e um juiz tem que tomar tomar decisões com base em fatos, “sem pensar no impacto político”.

Além disso, segundo ele, o Brasil não tinha mais condição de “varrer esses problemas para baixo do tapete”.

“A única alternativa era enfrentar esses problemas agora, senão teríamos que encontrá-los novamente daqui a alguns anos e numa escala maior”, disse Moro, recebido sob fortes aplausos por 300 estudantes brasileiros que vivem em diversas partes dos Estados Unidos.

Ao comentar sobre a operação Mãos Limpas da Itália, que nos anos 1990 denunciou um grande esquema de corrupção no país, Moro lamentou que por lá o trabalho da polícia e da justiça não tenha proporcionado “ganhos institucionais duradouros”, pois, logo depois, parlamentares italianos aprovaram leis que dificultam o combate à corrupção.

“No Brasil, a grande questão é, diante do que a Lava Jato revelou, diante dos crimes que estão sendo processados, vamos ter ganhos institucionais duradouros, ou não?”, questionou. “Isso depende dos políticos, dos eleitores. É necessário que não haja uma reação política [contrária], ou se houver, que nossa democracia seja forte o suficiente para evitar que esses casos levados à Justiça também não sejam desconstruídos em decorrência da reação do sistema político”.

“Não acerto todas”

Moro admitiu, ainda, que “não acerta todas”, mas mesmo nos erros sempre age com a “pretensão de estar decidindo conforme a lei”.

No mês passado, a decisão tomada por ele de retirar o sigilo de uma conversa telefônica interceptada entre a presidente Dilma Rousseff e Luiz Inácio Lula da Silva, às vésperas da posse do ex-presidente na Casa Civil, colocou mais lenha na fogueira do impeachment e aumentou a tensão no país. Diante dos questionamentos jurídicos sobre a decisão, o juiz federal enviou um pedido de desculpas ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Refinaria Abreu Lima
Refinaria Abreu Lima: risco de prejuízo de US$ 3 milhões, segundo depoimentos à Lava JatoFoto: picture-alliance/dpa

Questionado sobre sua posição a respeito do foro privilegiado de políticos, Moro afirmou "ter dúvidas" sobre as justificativas que garantem a condição a representantes públicos, já que numa democracia todos os indivíduos são iguais. Ele sublinhou, porém, que ter o processo encaminhado ao STF não é sinônimo de impunidade – porém, dada a quantidade de casos que vão parar no Supremo, o julgamento acaba sendo mais lento, segundo ele.

“Basta não pagar propina”

Além da mobilização da sociedade, para que os casos de corrupção agora revelados não voltem a acontecer, Moro ainda cobrou lisura da parte de empresários, já que, para o juiz, a iniciativa privada também tem sua parcela de responsabilidade nos casos de corrupção. “Tem que cobrar do governo o fim dessas práticas corruptas. Tenho dito a eles: ‘basta não pagar a propina'”.

Moro ainda arrancou risos do público ao comentar que as obras da Refinaria Abreu e Lima, inicialmente orçada em 2,5 bilhões de dólares, tiveram o custo reavaliado para 18,5 bilhões de reais 11 anos depois, em 2015. “É uma refinaria muito cara, né?!”, ironizou, sob risos dos estudantes. "O pior é que não é engraçado."

O juiz lembrou ainda que, segundo funcionários da Petrobras ouvidos pela Lava Jato, a refinaria corre o risco de gerar um prejuízo de 3 milhões de dólares, mesmo que funcione bem durante toda sua vida útil.

De juiz a ídolo

No encontro, promovido pela Associação de Estudantes Brasileiros nos EUA, Moro foi questionado se sua condição de ídolo pode afetar a imparcialidade nos casos da Lava Jato. Ao afirmar ser apenas “um juiz de primeira instância” e destacar os trabalhos do Ministério Público e da polícia, Moro reclamou que existe "um foco excessivo" sobre ele. "Não acho isso positivo”, disse. “É preciso tomar cuidado quando se vira esse foco de atenção".

Por fim, o juiz que se transformou em um dos símbolos da Lava Jato afirmou que, ao fim ainda não definido dos trabalhos, pretende tirar longas férias.