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Histórias paulistanas são mostradas nos cinemas alemães

Marco Sanchez16 de março de 2013

Filme de Roberto Moreira entrelaça a vida de vários personagens e mostra suas desventuras na cidade grande. Tendo São Paulo como pano de fundo, produção traça retrato delicado das desilusões e desencontros na metrópole.

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Foto: BILDKRAFT Filmverleih

Com uma produção média de cem filmes por ano, o cinema brasileiro dificilmente chega ao circuito comercial alemão. Por isso a estreia de Quanto dura o amor? – que na Alemanha recebeu o título de Paulista – Geschichten aus São Paulo (Histórias de São Paulo, na tradução do alemão) – é um fato a ser celebrado.

Para o bem ou para o mal, o filme do diretor Roberto Moreira difere das produções brasileiras que costumam ser lançadas no país, geralmente histórias sociais ou de violência urbana que foram destaque em grandes festivais internacionais.

O filme foca em dramas da classe média, mas seu principal tema é a desilusão, tanto no amor como na vida profissional e também com a cidade. "Foi uma vontade de renovação temática. Acho que o cinema brasileiro aborda pouco a classe média, e eu queria fazer um filme que falasse do meu mundo, não do mundo da periferia", disse o diretor em entrevista à DW Brasil.

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Maria (Lourenço) e Suzana (Spinelli) dividem um apartamento na Avenida PaulistaFoto: BILDKRAFT Filmverleih

Diversos protagonistas

O filme é centrado em personagens que moram no mesmo prédio e nas relações amorosas, sentimentais e profissionais deles. "Eu gosto muito de filmes como os de Robert Altman, que contam várias histórias. Meu primeiro filme, Contra Todos, tem quatro protagonistas, nesse são sete. Mas é difícil alinhar as histórias, sobretudo manter os conflitos emocionais. Cada história tem uma duração própria, e é preciso que todas entrem em sincronia. O processo de montagem foi longo, e eu tive que abrir mão de várias dessas pequenas histórias", explicou o diretor.

Maria (Silvia Lourenço) é uma aspirante a atriz que vai para a cidade grande atrás de uma carreira. Seu deslumbramento com a intensidade da metrópole a leva a mergulhar na noite sedutora da cidade sem calcular os riscos, e ela se envolve com a musa da noite, a cantora Justine (Danni Carlos).

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Dramas da classe média dominam o filmeFoto: BILDKRAFT Filmverleih

A jovem do interior mora com Suzana (Maria Clara Spinelli), uma discreta advogada que vive uma paixão promissora, mas guarda um segredo. Seu vizinho, o romântico Jay (Fábio Herford), é um escritor esquecido e solitário que se apaixonada pela prostituta Michelle (Leilah Moreno).

O diretor, que já havia trabalhado com Lourenço em seu filme de estreia, teve que enfrentar um longo processo de testes, já que o elenco é fundamental para contar a história desses personagens. "Encontrar a Suzana foi um trabalho muito especial, e a Maria Clara, um verdadeiro achado. Ela criou e deu vida ao seu personagem de modo admirável", elogiou Moreira.    

Sexualidade como veículo

Além do amor, a sexualidade tem um papel importante no filme e é usada, em maior ou em menor grau, como meio para as descobertas e mudanças dos personagens. "A sexualidade é um dado fundamental da vida de qualquer ser humano. Acredito que é uma fronteira, onde novos papéis estão sendo criados e vividos. Acho mesmo fascinante e libertador", disse Moreira.

O filme também aborda a sexualidade de forma plural, abrindo tanto possibilidades para os personagens como surpresas para o público. "Apesar de todo o empenho que tivemos em tratar da questão das escolhas sexuais de uma forma delicada e fiel ao contexto contemporâneo, a verdade é que boa parte do público vai em busca do casal heterossexual protagonista e isso o filme não entrega. É uma pena, porque procuramos tratar a busca do amor como um problema universal. Todos os personagens erram ao escolher seu parceiro, não importa se é uma transexual, uma lésbica ou um heterossexual. Todos vivem o mesmo desengano", explicou o diretor.

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"Paulista" mostra histórias de desilusão na metrópoleFoto: BILDKRAFT Filmverleih

Vários universos

As vidas desses personagens se entrelaçam não só nas ruas e nos bares, mas principalmente no prédio onde vivem. Nada mais paulistano do que esses microcosmos urbanos, amontoados um ao lado do outro. Um personagem invisível, mas presente em toda a história. "Eu queria um desses imensos prédios modernistas que são 'máquinas de morar'. Nesse sentido, o condomínio é uma utopia urbana que não deu certo. A verdade é que esses sonhos do século 20 criaram cidades muito duras com o indíviduo", disse Moreira.

Outra característica do filme é sutilmente desdobrar os vários universos que compõem São Paulo, partindo do coração da cidade – e do filme –, a Avenida Paulista. O filme ainda passeia pelos fóruns e escritórios do centro da cidade e apresenta o charme quase mágico do Bairro da Liberdade, as dificuldades do mundo do teatro e as armadilhas e ilusões da Rua Augusta, onde jovens de classe média se divertem e prostitutas lutam para ganhar a vida.

Moreira acredita ter feito um filme paulistano, mas com dramas que poderiam ser vividos por pessoas de todo o mundo. "Gosto mais do título internacional do que do brasileiro, que coloca ênfase no amor. Aqueles personagens são bem paulistas, e o ambiente que eles vivem também é, mas São Paulo é uma metrópole internacional, que tem muito em comum com cidades como Berlim", completou.

Outro "personagem" que pontua o filme é a música High and Dry, dos ingleses do Radiohead. "Eu, a produtora Geórgia Costa Araújo, o Lívio Tragtenberg (responsável pela trilha) e a Danni Carlos somos fãs da banda. Foi fácil chegar a um consenso. O que não queríamos era uma trilha brasileira manjada. Sinceramente acho tudo meio chato", disse o diretor. 

Para Moreira está ficando cada vez mais fácil fazer cinema no Brasil, mas Paulista é "um filme de nicho, uma produção média e destinada a um público diferenciado, urbano e jovem." Ele já trabalha em dois novos projetos: o suspense sobrenatural Terapia do Medo e a série cômica de televisão Condomínio Jaqueline, um desdobramento de Paulista, que se passa no mesmo prédio, mas com outros personagens.

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Filme passeia por diversos universos da cidadeFoto: BILDKRAFT Filmverleih