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Fux diz que juízes devem saber o momento de "erguer a voz"

3 de agosto de 2021

Presidente do STF manda recados a Bolsonaro em discurso de abertura do semestre do Judiciário. Logo em seguida, presidente volta a questionar urna eletrônica.

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Luiz Fux
Fux: Harmonia e independência entre os poderes "não implicam impunidade"Foto: Getty Images/AFP/E. Sa

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, afirmou nesta segunda-feira (02/08) que a harmonia e a independência entre os poderes da República "não implicam impunidade de atos que exorbitem o necessário respeito às instituições".

Ele também disse que a população não aceitaria qualquer solução para crises que o país enfrenta que desrespeite a Constituição. "No contexto atual, após 30 anos de consolidação democrática, o povo brasileiro jamais aceitaria que qualquer crise, por mais severa, fosse solucionada mediante mecanismos fora dos limites da Constituição",  afirmou.

O discurso marcou a abertura do segundo semestre do Judiciário e foi um recado ao presidente Jair Bolsonaro, que tem feito seguidos ataques a ministros da Corte e do Tribunal Superior Eleitoral.

O presidente também tem realizado ameaças constantes às eleições de 2022 se o país não adotar até lá o voto impresso, por vezes personificadas na figura do atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral, o ministro Luís Roberto Barroso.

Fux não mencionou o nome de Bolsonaro em nenhum momento do discurso, mas afirmou que "os juízes precisam vislumbrar o momento adequado para erguer a voz diante de eventuais ameaças".

O presidente do STF também afirmou que o regime democrático precisa ser "reiteradamente cultivado e reforçado", com respeito às instituições e aos que se dedicam à causa pública. "Ausentes essas deferências constitucionais, as democracias tendem a ruir", disse.

Bolsonaro enfrenta Barroso

Após o discurso de Fux, Bolsonaro voltou a defender o voto impresso e a enfrentar Barroso, que segundo ele teria influenciado os deputados que são membros da comissão especial da Câmara, onde tramita a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para alterar o sistema de votação no país.

"Queremos uma farsa no ano que vem ou uma eleição marcada por suspeição? (...) Chefe de Poder tem limite. Não é 'o que eu quero, pode confiar'. É o povo que tem de confiar. Temos obrigação de lutar por democracia", disse o presidente, em cerimônia no Palácio do Planalto.

O voto impresso é uma das principais bandeiras atuais de Bolsonaro, que afirmou diversas vezes, sem apresentar provas, que o sistema eleitoral brasileiro é vulnerável e que houve fraude em eleições anteriores.

Neste domingo, em videochamadas transmitidas em atos realizados por seus apoiadores, o presidente voltou a ameaçar o pleito de 2022 se não for adotado o voto impresso – ao qual ele se refere como auditável, apesar de a urna eletrônica já ser auditável.

A PEC sobre o voto impresso pode ser votada nesta quinta pela comissão especial da Câmara que analisa o tema. O presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), aliado de Bolsonaro, afirmou na última sexta que essa discussão é "perda de tempo" e que levantar dúvidas sobre a lisura das eleições "é ruim para o país".

Críticos apontam que Bolsonaro – assim como fez o ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump – semeia dúvidas sobre o processo eleitoral para abrir caminho para não aceitar o resultado das eleições de 2022 caso seja derrotado.

Mais tarde, na sessão de abertura do semestre no TSE, Barroso disse que ameaçar a realização de eleições era uma conduta antidemocrática e que todos precisavam se manter atentos pois "há coisas erradas acontecendo no país". 

"A ameaça à realização de eleições é uma conduta antidemocrática. Suprimir direitos fundamentais, incluindo os de natureza ambiental, é uma conduta antidemocrática. Conspurcar o debate público com desinformação, mentiras, ódio e teorias conspiratórias é conduta antidemocrática. (...) Há coisas erradas acontecendo no país. E todos nós precisamos estar atentos. Precisamos das instituições e precisamos da sociedade civil, ambas bem alertas. Nós já superamos os ciclos do atraso institucional, mas há retardatários que gostariam de voltar ao passado. Parte dessas estratégias inclui o ataque às instituições", afirmou Barroso.

Carta em defesa da urna eletrônica

O discurso de Fux com críticas indiretas a Bolsonaro ocorreu no mesmo dia em que nove ministros do Supremo e nove ex-ministros que presidiram o TSE divulgaram uma nota na qual defendem o atual sistema de votação eletrônica e rebatem as acusações de fraude feitas por Bolsonaro.

O único ministro da atual composição do Supremo que não assinou o manifesto divulgado nesta segunda é Kassio Nunes Marques, indicado à Corte por Bolsonaro. Os demais nove ministros da Corte são signatários.

A carta afirma que, desde 1996, quando o sistema de votação eletrônica foi implantado, "jamais se documentou qualquer episódio de fraude nas eleições" e que, nesses 25 anos, "a urna eletrônica passou por sucessivos processos de modernização e aprimoramento, contando com diversas camadas de segurança".

Os juristas também argumentam que o sistema eletrônico conseguiu "eliminar um passado de fraudes eleitorais que marcaram a história do Brasil, no Império e na República", e que adotar o voto impresso, como deseja Bolsonaro, abrirá espaço para o retorno desse cenário de fraudes.

bl (ots)