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Filarmônica de Viena revela seu passado nazista

13 de março de 2013

Comissão de historiadores resgata arquivos da prestigiada orquestra e, 75 anos após anexação da Áustria pela Alemanha, detalha destino de músicos judeus e real influência do regime nacional-socialista.

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Foto: Ullstein

Fãs esperam anos apenas para conseguir assistir a uma de suas apresentações. Os ingressos para o famoso Concerto de Ano Novo, assistidos por 50 milhões de pessoas pela televisão, são tão procurados que a venda se dá por sorteio.

Durante décadas, a Orquestra Filarmônica de Viena "tentou manter controle estrito sobre sua marca", declarou à DW Fritz Truempi, um dos três historiadores da comissão que tenta jogar luz sobre o destino dos músicos judeus e a real influência nazista sobre a orquestra.

Por não ser ligada ao Estado, a filarmônica sempre sustentou que não estaria obrigada a revelar detalhes de sua história durante o período da Segunda Guerra Mundial – como fizeram galerias de arte, museus e academias de ciência na Áustria.

No entanto, sob pressão, sobretudo do Partido Verde, foi fundada uma comissão para investigar seu passado. "No fim, a pressão política foi tão grande que abrir-se foi a melhor opção", diz Truempi. Os resultados foram divulgados nesta semana, quando são lembrados os 75 anos da anexação da Áustria pela Alemanha. E desvendaram uma série de episódios que até hoje ainda eram obscuros.

"Conseguimos descobrir alguns documentos num porão que normalmente continha arquivos musicais. Foi um membro da orquestra que nos indicou o local", conta o historiador Oliver Rathkolb, também membro da comissão.

Historiker Oliver Rathkolb
Historiador Oliver Rathkolb, da comissão que investigou o passado da orquestraFoto: picture-alliance/dpa

Entre as descobertas feitas estão novos detalhes sobre o destino dos judeus da orquestra. A historiadora Bernadette Mayrhofer diz que, após os nazistas chegarem ao poder, 13 músicos foram expulsos em 1938, ou por serem judeus ou por serem casados com judias.

A história de cada um deles, colocada no website da Filarmônica, compõe um relato comovente. Cinco foram mortos em campos de concentração, e um numa batida policial em sua casa. Nenhum dos que conseguiram sobreviver ao Holocausto voltou à orquestra. Para os nazistas que tocavam a seu lado, no entanto, a história foi diferente.

Condecoração a prefeito nazista

Os arquivos revelam que, em 1942, 60 dos 123 músicos eram membros do Partido Nazista – cifra muito superior à proporção de toda população austríaca e mais alta que as estimativas anteriores. Um deles, o trompetista Helmut Wobisch, era inclusive membro da famigerada SS.

Wobisch foi retirado da Filarmônica em 1945, mas retomou a carreira anos depois. Chegou a se tornar diretor-gerente de orquestra e, como se sabe agora, foi peça-chave num episódio lamentável do pós-guerra.

Durante a guerra, a orquestra deu sua máxima condecoração, o chamado "Anel de Honra", para o prefeito nazista de Viena, Baldur von Schirach, homem responsável pela deportação de milhares de judeus. Ele foi condenado por crimes de guerra e sentenciado a 20 anos de prisão.

Baldur von Schirach
Prefeito Von Schirach, condenado por crimes de guerra e condecorado pela FilarmônicaFoto: picture-alliance/dpa

Von Schirach perdeu o anel, mas, como seu filho revelaria mais tarde, após ser solto da prisão recebeu um novo de um membro da orquestra. Os historiadores descobriram que o esse músico era Helmut Wobisch, que fez uma réplica e a deu a Von Schirach. Segundo a comissão, no entanto, tratou-se aparentemente de uma iniciativa pessoal, e não em nome da orquestra.

Nem mesmo o famoso Concerto de Ano Novo pode ser desligado do período nazista, explicam os historiadores: o espetáculo data da Segunda Guerra, quando era parte da propaganda nacional-socialista.

A comissão alerta que seu trabalho está inconcluso, já que dispôs de apenas dois meses para preparar o relatório disponibilizado no site da orquestra na segunda semana de fevereiro. Mas os historiadores seguirão cavando e publicando. "O mais importante é manter viva a memória dos sobreviventes desse período, fazer as pessoas lembrarem. Não é só um estudo no papel, mas sim parte da nossa história", diz Oliver Rathkolb.

Autor: Kerry Skyring (rpr)
Revisão: Augusto Valente