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Documenta 13 chega ao fim: "mostra sem concepção"?

16 de setembro de 2012

Grande exposição de arte em Kassel seguiu princípio de "um pouco de tudo para todos", avalia articulista da DW Jochen Kürten. Para a próxima edição da mostra alguns defendem o retorno à orientação temática.

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Giuseppe Penone: "Idee di Pietra"
Giuseppe Penone: "Idee di Pietra"Foto: DW

A exposição de arte contemporânea Documenta 13 chega ao fim no domingo (16/09). Nestes últimos 100 dias, Carolyn Christov-Bakargiev manteve-se reservada. Bem ao contrário dos meses antecedentes à grande mostra na cidade alemã de Kassel, quando a curadora ítalo-americana de raízes búlgaras falava e falava, sempre acentuando que não tinha uma concepção pronta.

Quando a Documenta se iniciou, em junho, ela deixou os artistas e suas obras falarem. Foi uma jogada inteligente, permitindo aos visitantes de todo o mundo formar a sua própria imagem da exposição. Já na primeira metade da duração do evento, os organizadores computavam 400 mil frequentadores, um recorde parcial que deverá se confirmar de forma absoluta agora, no domingo.

Isso representa um sucesso, sem dúvida. Mas será possível realizar sem concepção pré-definida uma mostra cujo porte e importância também se baseiam no fato de ela só se realizar a cada cinco anos?

Carolyn Christov-Bakargiev, curadora da 13ª edição da mostra
Carolyn Christov-Bakargiev, curadora da 13ª edição da mostraFoto: Reuters

O curador é um fator determinante de cada edição, pois ele/ela é que decide quem é convidado, que obras serão expostas. O curador dispõe de enorme influência: através de todas as suas escolhas e decisões, acaba tornando-se, ele mesmo, uma obra de arte.

Este ano, Carolyn Christov-Bakargiev foi quem assumiu esse papel. Ela convidou quase 200 artistas do mundo inteiro, 100 peças foram criadas especialmente para esta Documenta. A edição de 2012 fez jus ao aposto "mostra de arte do mundo", também pelo fato de três filiais menores suas terem sido inauguradas nas cidades de Cabul, Cairo e Banff (Canadá), paralelamente à grande exposição em Kassel.

Arte em abundância: 'Volumes – Inncompleteset', Paul Chan, 2012
Arte em abundância: 'Volumes – Inncompleteset', Paul Chan, 2012Foto: DW/Kürten

Diversidade sem limites

Será sequer possível avaliar um evento tão amplo, transbordante mesmo, que dá espaço não só a todas as artes, mas também às ciências? A alegação da curadora de que não teria uma concepção se torna, ela própria, uma concepção. Os artistas não apenas vinham de todos os cantos do mundo: eles também representavam todas as tendências imagináveis da arte contemporânea.

Estiveram expostos: quadros e esculturas, videoinstalações e projetos tecnológicos, arte conceitual e informática, fotografia e gravura. Viram-se trabalhos novos e antigos, artistas vivos e mortos. E isso não foi tudo: música e cinema tiveram espaço, literatura e arquitetura, design e filosofia, dança e teatro.

E também as ciências foram integradas à mostra: arqueologia e astronomia, zoologia, ecologia e economia, química, física e medicina. Tudo isso encontrou seu lugar na Documenta 13, de alguma forma, em algum local.

Mulher-abelha em Sem título, Pierre Huyghe, 2012
Mulher-abelha em Sem título, Pierre Huyghe, 2012Foto: DW

À diversidade, não se impôs nenhum limite. O estande com oferta de frutas e legumes orgânicos foi declarado obra de arte, da mesma forma que a instalação sonora na praça central da Documenta, ciclos de filmes e diversos eventos de debate. Também uma cidade-acampamento temporária no centro de Kassel – onde participantes de todo tipo tiveram chance de protestar contra todas as manifestações possíveis do crescimento sem fronteiras – tornou-se subitamente parte do espetáculo total.

E havia também os animais, sobretudo os cães. Como formulou a curadora: ela queria ampliar o olhar das pessoas, criar novas perspectivas para todas as criaturas vivas do mundo, e dar à gente a chance de adotar o ponto de vista dos seres não humanos.

Com esse fim, instituiu-se um playground canino e durante os 100 dias da mostra outra obra de arte paisagística foi declarada habitat de dois cães, um deles com a pata dianteira tingida de rosa-choque. Queridos pelo público, os bichos tiveram a oportunidade de brincar e rolar na lama, durante a Documenta.

Cão com pata rosa-choque em Sem título, Pierre Huyghe, 2012
Cão com pata rosa-choque em Sem título, Pierre Huyghe, 2012Foto: DW

"Tudo é arte"...?

Nos últimos 100 dias, tudo era arte, ou foi declarado como tal. Entre os numerosos museus, salões de exposições, areais e arenas ao ar livre espalhados por toda a região de Kassel, encontravam-se também as casas onde artistas se instalaram para dar o exemplo concreto de formas alternativas de vida.

Ecologia e sustentabilidade foram conceitos centrais, a que Christov-Bakargiev se referiu repetidamente, em seus discursos e textos. Ela quis criar um espaço em que arte e natureza se unissem. As palavras construction ereconstruction apareceram repetidamente, nesse contexto.

"A Documenta 13 se dedica à pesquisa artística e a formas de força imaginativa que investiguem engajamento, matéria, coisas, incorporação e vida ativa em conexão com a teoria, sem, no entanto, se subordinar a ela", anunciou a curadora da mostra.

Arte é tudo e tudo é arte: antes dela, outros protagonistas do setor já haviam se expressado dessa forma ou de modo semelhante – basta pensar em Joseph Beuys, nome estreitamente ligado á Documenta. Carolyn Christov-Bakargiev foi mais um passo adiante, e assim, para certos visitantes e alguns observadores profissionais, derrubou barreiras intelectuais e abriu novas perspectivas.

Escultura com cadafalsos, de Sam Durant
Escultura com cadafalsos, de Sam DurantFoto: DW

Ao declarar tudo e todos coadjuvantes, artistas e agentes, a norte-americana também transformou a Documenta numa grande rota da arbitrariedade. Havia sempre algo para satisfazer a todo e qualquer espírito contemporâneo crítico, quer ambientalista, quer crítico do crescimento, especialista em arte ou livre pensador da filosofia: havia lugar para todos em Kassel.

Pode-se celebrar isso como grande libertação ou ação artística autônoma – mas também criticá-lo. Uma das críticas aponta: "É uma grande pena que Christov-Bakargiev não queira falar sobre os critérios, as diferenças, os abismos qualitativos da aquisição artística de saber".

Um outro opina: "Dá para sentir que a ideia é, dentro do possível, ter um pouco de tudo para todos, muitas facetas e expectativas contraditórias. Assim, apresenta-se radical crítica conceitual do mercado lado a lado com o kitsch esotérico folclorístico, o impiedoso filme de autor com quatro horas de duração ao lado da despreocupada instalação com ervas e flores".

'The Importance of Telepathy', de Apichatpong Weerasethakul
'The Importance of Telepathy', de Apichatpong WeerasethakulFoto: DW

Volta aos temas

É possível que as várias centenas de milhares de visitantes ocasionais deem razão à curadora. Porém o público especializado de todo o mundo também vem a Kassel a cada cinco anos. Ninguém, que tenha qualquer coisa a ver com arte, consegue ignorar o megaevento Documenta. E é questionável que as dezenas de milhares de pessoas passeando pelos verdes parques no coração da cidade sejam um argumento a favor da arte exposta.

Assim, foi como com outros eventos culturais sob o signo das boas intenções: os que são contra a destruição do meio ambiente e o crescimento desmedido vão aceder sofregamente com a cabeça e degustar a arte. Outros utilizam a mostra para passear e discutir.

É claro que os adeptos da arte "clássica" também puderam sair satisfeitos. Obviamente havia muitas obras impressionantes, entre os objetos expostos. O princípio "um pouco de tudo para todos" funcionou. Porém procede a projeção feita um grande jornal alemão: "Da 14º edição da Documenta, dentro de cinco anos, espera-se que ela reencontre a orientação temática, que tente estabelecer critérios e parâmetros – não importa em que áreas".

Autor: Jochen Kürten (av)
Revisão: Carlos Albuquerque