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Discriminação ainda é a maior barreira para o combate à aids no Brasil

Clarissa Neher17 de julho de 2014

Relatório da ONU mostra aumento no número de infecções com HIV e de mortes relacionadas à aids no país, em oposição à tendência mundial.

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Foto: michaeljung - Fotolia

A média global do número de novas infecções com o vírus HIV e de mortes causadas por doenças relacionadas à aids apresentou queda nos últimos anos. No Brasil, porém, a tendência é outra: em ambos os casos foram registradas altas. Para a ONU, a maior responsável por esse cenário é a discriminação.

Enquanto no mundo todo, desde 2001, o número de novas infecções caiu 38%, com uma redução de 13% entre 2010 e 2013, no Brasil houve um aumento de 11% entre 2005 e 2013, como aponta o novo relatório global do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids), divulgado nesta quarta-feira (16/07).

"Falamos de uma fadiga, de um cansaço. Depois de 30 anos de epidemia, estamos voltando a ter uma nova onda de infecção entre jovens, principalmente homossexuais", diz a diretora da Unaids no Brasil, Georgiana Braga-Orillard.

Na América Latina, estima-se que cerca de 33% das novas infecções ocorram na faixa etária dos 15 aos 24 anos, e que dez pessoas são infectadas por hora.

"Esse relatório confirma aquilo que o Ministério da Saúde tem dito nos últimos anos. Apesar de termos uma prevalência baixa de HIV na população geral, de 0,4%, em alguns grupos mais vulneráveis, por exemplo jovens gays, ela chega a 12%, e entre travestis e profissionais do sexo, varia de 5 a 6%", avalia Jarbas Barbosa, secretário de vigilância em saúde do ministério.

O preconceito continua sendo um dos fatores que dificultam a contenção da epidemia, não somente no mundo, mas também no Brasil. "Temos que trabalhar principalmente a discriminação. Ainda vemos as pessoas sendo discriminadas e, por isso, ficam sem acesso aos serviços de saúde", afirma Orillard.

Panorama global

O declínio no contágio do HIV foi registrado, principalmente, na transmissão de mãe para filho, devido à ampliação mundial da oferta de tratamento a mulheres grávidas e mães. "Como o Brasil já havia reduzido esse tipo de infecção antes do período analisado pelo relatório, fica difícil comparar os dados", diz Orillard.

Atualmente 35 milhões de pessoas vivem com o vírus da aids no mundo e 19 milhões delas não sabem que são soropositivas. Somente na América Latina estima-se que 1,6 milhão de pessoas sejam portadoras do HIV, sendo que 47% dos casos estão concentrados no Brasil, seguido pelo México, com 11%, e pela Colômbia, com 9%. Nessa região, a doença está concentrada nas áreas urbanas, de rotas comerciais e portuárias.

Kampf gegen HIV bedroht
Brasil lançou a política do testar e tratar, ou seja, a pessoa recebe o tratamento logo em seguida ao testeFoto: picture-alliance/dpa

O relatório da Unaids também mostrou que o tratamento antirretroviral chega a um número maior de doentes. Em 2013, quase 12,9 milhões de pessoas tinham acesso a essa terapia. A percentagem sem tratamento caiu de 90% em 2006 para 63% em 2013.

Outro aspecto positivo destacado pela Unaids é a redução, desde 2005, em cerca de 35% do número de mortes relacionadas à aids. Em 2013, 1,5 milhão de pessoas morreu com essa doença. As maiores quedas foram registradas na África do Sul, 51%, na República Dominicana, 37%, e na Ucrânia e no Quênia, 32%.

Nesse aspecto novamente o Brasil vai contra a tendência mundial. Apesar de mais de 40% dos portadores de HIV terem acesso ao tratamento antirretroviral no país, houve um aumento de 7%, entre 2005 e 2013, nos casos de mortes relacionadas à aids.

Para Braga, a discriminação também é responsável por esse aspecto. "As pessoas têm tanto medo de fazer o teste que quando chegam ao tratamento já é muito tarde. Em Porto Alegre, por exemplo, 20% dos casos de aids são detectados no óbito. Ou seja, a pessoa passou por tudo aquilo e morreu sem saber que tinha o vírus", revela.

Prevenção e tratamento

Segundo o Ministério da Saúde, estima-se que 150 mil pessoas não saibam que são portadoras do HIV no Brasil. E, para combater e tratar de maneira correta a doença, Orillard recomenda políticas públicas voltadas à informação, à saúde, ao combate ao preconceito que abranjam os três níveis de governo – federal, estadual e municipal –, além da participação da família, da escola, da sociedade civil e de ONGs.

"O Brasil lançou a política do testar e tratar, ou seja, a pessoa recebe o tratamento logo em seguida ao teste, e é único país em desenvolvimento que está fazendo isso. Além disso, também começou a oferecer testes rápidos, quebrando um pouco do tabu do teste. Nós estamos com esperança de que essas medidas ajudem a reduzir esses novos casos", reforça Orillard.

Segundo Barbosa, em 2013, 40 mil pessoas foram incluídas no tratamento da aids no país. Somente no primeiro semestre deste ano foram 35 mil pessoas. "A nossa meta para este ano é chegar a 100 mil", afirma o secretário.

O relatório da Unaids aponta que é possível acabar com a epidemia de aids no mundo até 2030, com medidas para ampliar o acesso ao tratamento, leis que protejam a liberdade e a igualdade, além da continuidade, com o mesmo comprometimento, do trabalho que a comunidade internacional vem realizando nos últimos dez anos.