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Clima e longas distâncias são adversários extras para seleções estrangeiras

Fernando Caulyt19 de maio de 2014

Para equipes visitantes, combinação de variações climáticas bruscas e grandes distâncias preocupa mais que alguns rivais na Copa. E pode comprometer desempenho de jogadores e favorecer lesões.

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Imagem de computador da Arena da Amazônia, em Manaus, cidade com temperaturas acima de 30ºC e umidade de 80%Foto: GMP

Antes do sorteio dos grupos da Copa do Mundo, o técnico da Inglaterra, Roy Hodgson, causou polêmica ao dizer que preferiria jogar no "grupo da morte" a ter que disputar uma partida em Manaus – que, para ele, deveria ser evitada por causa do intenso calor tropical. Após a definição das chaves, os ingleses viram as duas possibilidades se concretizar. E, de quebra, estão entre os que mais terão que se deslocar na primeira fase da competição.

Eles estreiam em Manaus, contra a Itália; depois viajam a São Paulo para enfrentar o Uruguai; e fecham sua participação em Belo Horizonte, contra a Costa Rica. No total, são cerca de 3.200 quilômetros – o que corresponde a ir de carro de Lisboa a Varsóvia. Se passar em primeiro no grupo D, Hodgson ainda terá que voltar ao Nordeste, precisamente ao Recife, para jogar as oitavas de final.

O exemplo inglês ilustra por que muitos técnicos afirmaram, depois do sorteio, que a combinação entre variação de clima e distâncias percorridas pode ser considerada um dos grandes adversários das seleções favoritas a levarem o Mundial. Além do cansaço das longas viagens, os jogadores deverão sofrer também com mudanças bruscas de temperatura entre um jogo e outro.

Calor no inverno brasileiro

O evento ocorre no inverno brasileiro, e as 12 cidades-sede devem apresentar temperaturas distintas no período: enquanto Porto Alegre e Curitiba têm média de clima seco e frio (entre 2ºC e 20ºC), jogadores – e seus torcedores – terão que enfrentar temperaturas máximas que passam dos 30ºC em cidades como Cuiabá, Brasília, Manaus, Recife e Fortaleza.

"Temos um país continental e parte das seleções vai jogar em condições climáticas diversas entre uma partida e outra. Isso causará também um grande prejuízo à performance dos jogadores", afirma o fisiologista Turíbio Leite de Barros, que trabalhou na seleção brasileira e 25 anos no São Paulo. "Muitas seleções, principalmente da Europa e da Ásia, vão ter dificuldades para se aclimatar."

Roy Hodgson
Hodgson disse que preferiria o "grupo da morte" a ter que disputar uma partida em Manaus. Acabou com os doisFoto: AP

A umidade relativa do ar também é uma das preocupações dos especialistas. Para regular a temperatura, um dos recursos do organismo é perder líquidos através do suor e, assim, resfriar o corpo. Mas, quando a umidade do ar está muito alta, o atleta tem mais dificuldade para suar, resultando num desconforto térmico e numa situação extrema de não conseguir manter mais a temperatura corporal.

"Num dia, o atleta joga em Manaus, onde a temperatura passa dos 30ºC e a umidade do ar é maior que 80%. Na próxima partida, em São Paulo, a temperatura chega a 20ºC e 60% de umidade relativa do ar. Isso gera um desgaste físico muito grande para o organismo", afirma Miguel de Arruda, professor da Faculdade de Educação Física da Unicamp. "Existe um período de aclimatização de no mínimo três dias, que varia de atleta a atleta. E esse tempo eles não vão ter durante o torneio."

O Brasil não vai enfrentar grandes choques térmicos: vai jogar em São Paulo, Fortaleza e Brasília. Mas uma das seleções que mais deverá sofrer no quesito distância e diferenças bruscas de temperatura é a dos EUA: os americanos jogam em Natal (contra Gana), Manaus (Portugal) e Recife (Alemanha) e vão percorrer cerca de 5.600 quilômetros na primeira fase do torneio.

Desempenho comprometido

Especialistas explicam que, além do mal-estar, as mudanças bruscas de temperatura podem comprometer o rendimento dos atletas e contribuir para o aumento de lesões. Os horários de alguns jogos reforçam a preocupação: dos 64 confrontos, 24 serão disputados às 13h locais e alguns serão sediados em Natal, Recife, Fortaleza e Salvador – cidades que apresentam temperaturas acima dos 30ºC.

"O jogador vai ter uma perda de líquido muito grande, de rendimento e de coordenação motora, que são alguns dos fatores que predispõem às lesões. Há desgaste também associado ao fato de que os atletas vão se deslocar por grandes distâncias", explica Turíbio Leite.

Na condição de calor intenso, atletas podem sofrer ainda hipertermia – situação em que o corpo não consegue manter a temperatura de forma adequada, como num superaquecimento. Mesmo que um jogador de seleção tenha resistência física superior, a hipertermia pode causar lesões graves em alguns órgãos.

"O nível técnico dos jogadores será prejudicado principalmente nos jogos nas cidades nas regiões Norte e Nordeste. Não é no torneio como um todo, mas principalmente nessas sedes, onde existe uma condição desfavorável aos jogadores do ponto de vista climático", diz Turíbio Leite.

Na luta contra as diferenças bruscas de temperatura e as longas distâncias, a equipe médica de cada seleção terá importância maior do que já tem, pois profissionais como nutricionistas e fisiologistas terão que realizar dietas balanceadas, principalmente as de ordem líquida, para tentar ajustar os quadros e tentar diminuir os efeitos das condições climáticas adversas em seus jogadores.

"A equipe médica que estiver por trás também será determinante", diz Miguel de Arruda, que também é conselheiro científico da Confederação Brasileira de Atletismo. "Claro que o determinante é o desempenho do time. Mas, para sustentar isso, a equipe médica vai ter que entrar em ação."