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Cartões-postais para o chefe de governo

Deanne Corbett ( rf )30 de agosto de 2005

A algumas semanas das eleições, a artista americana Sheryl Oring traz a democracia segundo o modelo norte-americano às ruas da Alemanha.

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Cidadão descreve seus desejos no centro de BerlimFoto: DW

Quando o movimento começa a esquentar na agitada estação da Schönhauser Allee, em Berlim, as pessoas vão se aglomerando e fazem de tudo para não perder o trem. Bem no meio desse empurra-empurra, lá está Sheryl Oring, vestida com roupas de tom vermelho que lembram uma secretária típica de filmes dos anos 50, batendo numa máquina de escrever daquelas bem antiquadas.

Wenn ich Kanzler wäre… Kunstaktion Sheryl Oring Schönhauser Allee Arkaden in Berlin mit Brief
Um cartão para Schröder com carimbo de urgênciaFoto: DW

Muita atenta, ela escuta um cidadão que, sentado ao seu lado, lhe faz um relato. Do lado deles, a placa com um escrito: "Se eu fosse chanceler..."

Quando o homem termina de ditar sua mensagem à liderança política da Alemanha, a "secretária" lhe entrega o cartão-postal mais os selos correspondentes. O cliente analisa alguns carimbos ao seu redor e escolhe um, com o título "urgente". Estampa com ele em vermelho vivo o seu cartão e, já com ar de satisfação, coloca-o na caixa de correio, montada logo ao lado para facilitar.

Uma cena como esta, por um lado uma ação política e por outro um happening artístico, chama atenção das pessoas, tanto que estas começam a deter a correria. Algumas, quando passam, apenas olham o que está acontecendo, mas outras decidem entrar na fila para poder relatar os seus anseios. A idéia do evento é de Sheryl Oring, artista e jornalista norte-americana – a "secretária" em roupas vermelhas.

Em 2004, no ano das eleições americanas, Oring atravessou os Estados Unidos. Na mala, carregava seu projeto I wish to say – eu quero falar. Datilografou as preocupações e os anseios de mais de mil pessoas em cartões-postais, enviados para o destinatário George W. Bush. "A reação foi tão fantástica, que então pensei em realizar a idéia também em outros países", comenta Oring, que já morou e estudou na Alemanha e domina o idioma fluentemente.

Gramática alemã

Wenn ich Kanzler wäre… Kunstaktion Sheryl Oring Schönhauser Allee Arkaden in Berlin
A jornalista deixa o cartão ser revisadoFoto: dpa

Mesmo dominando a língua, ela teve seus receios em trazer este "show" para a Alemanha. "Eu pedia às pessoas para que falassem devagar, pois o alemão não é a minha língua materna. Depois de ter escrito o cartão, solicitava às pessoas que lessem, para que pudessem corrigir qualquer erro", conta ela com risos. "Até que ser estrangeira tem lá as suas vantagens em certas ocasiões, uma curiosidade surge nas pessoas fazendo com que elas participem mais facilmente."

"Eu não estava certa de que minha idéia iria funcionar na Alemanha, mas as pessoas realmente demonstraram vontade de participar. Elas se preocupam, por exemplo, com o desemprego, com a ajuda social do Estado, e querem falar sobre isto. Acham que nem a mídia e nem os políticos escutam o que têm a dizer. Mas este projeto lhes dá oportunidade de desabafar as suas preocupações. Um tipo de serviço de assistência ao cidadão."

Thomas, um berlinense de 42 anos, conta como está insatisfeito com a atual situação econômica e social da Alemanha. No cartão-postal para o chanceler federal Schröder ele escreve: "Quando se trata de política para o mercado de trabalho, o país se orienta muito rápido pelos Estados Unidos. As pessoas são obrigadas a aceitar qualquer emprego que aparece, mesmo sendo qualificadas em alto nível, só para retornarem à vida profissional".

Empolgado com o projeto de Oring, ressalta: "Quando se expressa uma opinião dentro de um projeto cultural, sabe-se que isto não resultará numa conseqüência qualquer. É um caminho seguro para exprimir seu pensamento".

Outros interesses

Enquanto muitos cartões-postais saem da mesa de Oring tratando de temas eleitorais como o desemprego, a aposentadoria ou a educação, existem desejos populares que sublinham outras questões. Não há limites para a imaginação.

"Eu cobraria uma taxa dos donos que deixam seus cães sujarem a cidade", escreve um berlinense aborrecido. Outro morador vai além, afirmando que "queria ser o rei de Berlim" e indicando um cassino gigantesco como solução para a cidade: "Assim todos ficariam felizes".

Wenn ich Kanzler wäre… Kunstaktion Sheryl Oring Schönhauser Allee Arkaden in Berlin
Crianças participando da ação 'Se eu fosse chanceler federal'Foto: DW

Gabriel, de 8 anos, se alinhou na fila eufórico com uma lista de leis para mandar para o chanceler federal. Uma delas delibera que as crianças podem jogar futebol em todo lugar. Por enquanto, a garotada só pode jogar bola respeitando determinações de hora e local.

A rica variedade de interesses é que mantém vivo o trabalho da artista americana. Ela já visitou várias cidades alemãs com o projeto "Se eu fosse chanceler...", calcula ainda escrever algumas centenas de cartões. Oring guarda uma cópia de cada exemplar e espera um dia montar uma exposição ou publicar um livro com eles.

"Estou sempre me surpreendendo com os interesses das pessoas. Mesmo que este projeto já não seja mais uma novidade para mim, nada se repete. Quando encontro alguém e escuto uma história comovente, acho que vale mesmo a pena."