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Bombas e tiroteios: o cotidiano de uma cidade da Suécia

Nancy Isenson
25 de novembro de 2019

Malmö, no extremo sul do país, é marcada há anos por violentos conflitos entre gangues. Assassinato recente de um adolescente numa pizzaria leva polícia a montar força-tarefa para combater a violência na área.

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Policiais na frente da entrada destruída de uma discoteca atingida por uma bomba, em março, em Malmö
Policiais na frente da entrada destruída de uma discoteca no centro de Malmö, que foi atingida por uma bomba em marçoFoto: Imago Images/TT/J. Nilsson

Às vezes, parece que Malmö tem mais em comum com Bagdá do que com outras cidades europeias. Este ano, 29 explosões de bombas sacudiram a cidade sueca de 317 mil habitantes – dados compilados até 11 de novembro. A polícia sueca relatou 50 tiroteios na região de Malmö até o final de outubro – em um país onde é difícil encontrar armas de proveniência legal.

Malmö, outrora uma cidade industrial conhecida pela construção naval, voltou a prosperar desde a inauguração em 2000 da Ponte de Öresund, que a conecta à capital dinamarquesa Copenhague. A terceira maior cidade de Suécia se tornou um centro de conhecimento, com uma nova universidade que atrai estudante da Escandinávia e do exterior, e cada vez mais empresas, incluindo os gigantes da indústria de videogames Massive e King, estão se instalando no lado leste do estreito de Öresund.

Localizada no extremo sul da Suécia, Malmö é também a cidade mais diversificada do país: cerca de um terço da população local é formado por pessoas nascidas no exterior.

Os residentes de Malmö estão acostumados com relatos quase diários sobre crimes violentos. Na terça-feira da semana passada, por exemplo, a emissora pública SVT informou que membros de uma gangue forçaram uma rede de supermercados a deixá-los esconder drogas numa loja no centro da cidade. A polícia tem tido bastante trabalho para conter a violência, atribuída principalmente a gangues que traficam entorpecentes.

A diligência mais recente foi motivada por um tiroteio em 9 de novembro em frente a uma pizzaria, que matou um garoto de 15 anos. Um outro jovem teve que ser levado a um hospital. A polícia declarou um "evento especial" nacional e criou uma força-tarefa para conter a violência de gangues.

"Está na hora e é bom para as pessoas em Malmö e para as pessoas fora de Malmö", disse Federico Moreno, repórter que cobre o noticiário local de Malmö há mais de uma década. "Toda vez que eles matam uma criança, deveria ser algo especial, em que todos reajam. É importante que a polícia envie um sinal e também que o Estado esteja mostrando que precisamos enviar um sinal."

Dano colateral

Embora muitas das vítimas e agressores tenham sido conectadas a gangues, também há relatos de pessoas circunstantes feridas ou mortas, como a médica Karolin Hakim, de 31 anos, que foi atingida por uma bala em agosto numa rua de Malmö e morreu enquanto segurava seu bebê nos braços.

E isso é algo que preocupa Petra Metz, professora que ensina sueco a adultos imigrantes numa escola em Fosie, um bairro considerado problemático e onde ocorreram numerosos tiroteios. Metz afirmou ter medo de andar de bicicleta do trabalho para casa depois que escureceu.

Policiais suecos examinam veículo carbonizado em Malmö
Policiais suecos examinam veículo carbonizado, nas redondezas de onde a médica Karolin Hakim foi morta em Malmö Foto: Getty Images/AFP/TT News Agency/J. Nilsson

Mas ela disse que se preocupa menos com sua própria segurança do que a de seus três filhos, todos adolescentes entre 13 e 18 anos, especialmente depois de um tiroteio relacionado a uma briga de gangues que não conseguiu aniquilar o alvo pretendido, mas deixou três jovens mortos numa lan house em junho de 2018.

"Se tivesse sido um mês antes, talvez tivesse sido meu filho que estava sentado lá", disse Metz. Seu filho mais velho havia passado algum tempo no cyber café poucas semanas antes do tiroteio. Metz considerou mudar de cidade para escapar do perigo, mas afirmou que o sacrifício de seus filhos – deixar amigos, escolas e atividades extracurriculares – seria demais.

"Eu desisti", disse a professora. "Pensei que em breve eles terão idade suficiente e partirão para outra cidade quando forem estudar [numa universidade]." Metz contou que amigos dela com crianças menores estão pensando mais seriamente em deixar Malmö.

Essas famílias podem estar considerando Staffanstorp, a 20 minutos de carro a nordeste de Malmö. Poucos dias depois do tiroteio na pizzaria, o município publicou um vídeo no qual incentiva os moradores de Malmö a escapar da violência e construir uma nova vida num local "como o resto da Suécia deveria ser". O vídeo foi assistido mais de 250 mil vezes.

Banalização da violência

"Eu amo Malmö", garantiu Moreno, que disse não ter planos de se mudar, apesar das ameaças que recebe por sua cobertura jornalística sobre as gangues. Ele citou como paralelo uma viagem de reportagem feita ao México, onde as pessoas vivem aterrorizadas pelos cartéis de drogas, mas conseguem seguir suas vidas cotidianas.

"Sinto que, às vezes, você também pode se acostumar com alguma coisa", disse Moreno. "Por exemplo, quando falo com pessoas que me dizem que estão mudando os quartos da casa – como se fosse normal: 'Estou mudando as coisas para que, caso uma bomba explodir, meus filhos não se machuquem'. Acho que isso afeta a todos nós, mesmo que não entendamos isso naquele momento."

O crime violento em Malmö diminuiu desde 2017, ano em que foram registradas explosões de 58 bombas e 81 tiroteios na região. Mas ainda há um longo caminho até que a cidade perca sua reputação pelo alto índice de violência.

"Malmö, de cerca forma, é uma catástrofe", disse Moreno. "Mas também é uma cidade muito bonita e animada. É realmente diferente de outras cidades suecas, e de uma maneira positiva."

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