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Ascensão da China deixa Europa em encruzilhada geopolítica

Lewis Sanders
16 de fevereiro de 2018

Líderes mundiais se reúnem em Munique para a Conferência de Segurança. Enquanto isso, UE se encontra num dilema entre Washington e Pequim – que se aproveita do declínio da influência americana na política internacional.

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"Sem o Partido Comunista, não haveria uma nova China", diz cartaz espalhado pelo país em outubroFoto: picture-alliance/AP Photo/Ng Han Guan

Líderes globais se encontram na Alemanha a partir desta sexta-feira (16/02) para a Conferência de Segurança de Munique de 2018, num momento em que se observa um declínio da influência dos Estados Unidos na política internacional sob o governo do presidente Donald Trump.

A China, por outro lado, vem sendo definida por sua crescente presença no cenário mundial, desde a luta contra as mudanças climáticas às normas de comércio global. A ascensão do país à posição de superpotência pode não ser um fenômeno novo, mas seu status foi consolidado no ano passado.

Num discurso descrito pela consultoria de risco Eurasia Group como "o evento geopoliticamente mais notável desde que Mikhail Gorbachev dissolveu formalmente a União Soviética", o líder chinês Xi Jinping proclamou o novo status de Pequim no 19º Congresso do Partido Comunista Chinês (PCC) em outubro.

"Com décadas de trabalho árduo, o socialismo com características chinesas atravessou as fronteiras de uma nova era", disse Xi. "Uma era que verá a China se aproximando do palco principal e fazendo maiores contribuições para a humanidade."

"Líder mundial a todo custo"

Na década de 1990, sob o então líder chinês Deng Xiaoping, Pequim implementou uma política externa que se sustentou em slogans como "esconder nossas capacidades e aguardar nosso momento", o que significava "manter um perfil baixo" para se concentrar no desenvolvimento do país, segundo publicação do diário Global Times, de propriedade do PCC.

Mas o historiador chinês Zhang Lifan afirmou à DW que essa estratégia "não é mais adequada ao status quo da China". "A situação atual é que a China quer ser líder mundial a todo custo", disse Zhang. "Os EUA estão agora implementando a política de America First. China e Xi Jinping querem aproveitar essa oportunidade para tomar a liderança da globalização."

Em muitos aspectos, o papel de liderança da China foi moldado ao longo do ano passado pelos objetivos da política externa dos EUA sob Trump. A China também fortaleceu sua posição em áreas estratégicas que continuarão impulsionando as relações internacionais, incluindo mudanças climáticas, segurança no Ártico, ciberespaço, comércio internacional e exploração espacial.

A China "parece ser o ator racional que está lutando contra as mudanças climáticas, que mantém os mercados abertos, que continua a louvar os méritos da globalização, que são inegáveis", disse Jan Gaspers, chefe da unidade de política chinesa europeia do Mercator Institute for China Studies (Merics), sediado em Berlim, em entrevista à DW. "Evidentemente a maior parte disso é apenas retórica, e não acontece da forma como eles falam."

China EU-Außenbeauftragte Federica Mogherini & Li Keqiang
Chefe da diplomacia da UE, Federica Mogherini, em visita à China em outubro: "China e UE são potências globais".Foto: Reuters/K. Fukuhara

Europa na berlinda?

Para a Europa, Pequim taticamente começou a desempenhar um papel que os EUA – seu aliado tradicional – aparentemente pararam de exercer desde a implementação da doutrina de America First (Estados Unidos em primeiro lugar). O governo chinês entende que, ao se associar à União Europeia (UE), pode aumentar sua legitimidade aos olhos de acionistas globais e garantir sua influência em qualquer reorganização dos papéis de liderança internacional.

"A China e a União Europeia são potências globais: temos a responsabilidade conjunta de trabalhar juntos para uma ordem mundial mais cooperativa e regulamentada", declarou a chefe da diplomacia da UE, Federica Mogherini, ao concluir uma visita oficial a Pequim no ano passado.

A China não pretende prejudicar qualquer tipo de relacionamento regulamentado em curto prazo, nem a Europa – especialmente porque isso redefine sua posição. Mas uma questão cada vez mais relevante é a forma como a UE se posicionará no que parece "ser uma relação mais conflitante entre EUA e China".

"Será interessante como a Europa navegará nessas águas difíceis, especialmente porque a própria Europa não está realmente unida [...] e há diferenças crescentes entre a UE e os EUA sobre mudanças climáticas, mercados abertos e comércio global", argumentou Gaspers.

A "melhor alternativa" da China

Além dos benefícios de a UE ser o maior parceiro comercial da China, a ascensão de Pequim também provocou um efeito adverso na Europa. A forte liderança da China encontrou apoio dentro da UE, como do primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán, e do presidente da República Tcheca, Milos Zeman.

A China se tornou muito mais confiante em apresentar seu modelo econômico e político como uma "melhor alternativa" à democracia liberal, afirmou Gaspers à DW, além de apontar que a influência da China se estendeu além da periferia política da Europa.

Um relatório publicado pela Merics no ano passado mostrou que a China "criou camadas de apoio ativo para os interesses chineses" ao "promover redes sólidas entre políticos, negócios, mídia, think tanks e universidades europeias", incluindo em Bruxelas, coração da política europeia.

"Os rápidos esforços de influência política da China na Europa e a autoconfiança de seus ideais autoritários representam um desafio significativo para a democracia liberal, bem como para os valores e interesses da Europa", segundo o relatório.

Embora os méritos de um relacionamento econômico profundo continuem a impulsionar a relação entre Bruxelas e Pequim, preocupações sérias sobre como isso poderia se desenvolver a nível político – seja nacional ou mundial –devem impactar as aspirações liberais da UE, bem como as ambições da China de se tornar líder mundial.

Este artigo contou com a contribuição de Ju Juan, da redação chinesa da DW.

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