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Análise: Manifestações dão fôlego a Bolsonaro

27 de maio de 2019

Ainda que menores do que protestos contra cortes na educação, atos demonstram que núcleo do eleitorado bolsonarista segue apoiando presidente. Mas pressão popular não deve intimidar centrão e acelerar agenda do governo.

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Boneco inflável com a figura do presidente Jair Bolsonaro em ato na Avenida Paulista
Boneco inflável com a figura do presidente Jair Bolsonaro em ato na Avenida PaulistaFoto: AFP/N. Almeida

Manifestações em 156 cidades – este é o balanço das manifestações pró-Bolsonaro deste domingo (26/05). Em comparação, os atos do dia 15 de maio contra os cortes na educação – aos quais os atos deste domingo seriam uma resposta – ocorreram em 222 cidades.

Apesar da falta de dados oficiais, há uma percepção de que um número menor de pessoas saiu às ruas do que há duas semanas, nos protestos contra as políticas de austeridade do presidente Jair Bolsonaro.

Entretanto, para o cientista político Ricardo Ismael, o balanço foi positivo. "[Compareceu] mais gente do que eu esperava, apesar do pouco tempo que se teve para convocar", observou.

A ausência de alguns dos grupos mais importantes que contribuíram para a vitória eleitoral de Bolsonaro no ano passado enfraqueceu os atos de domingo. Foi o caso do Movimento Brasil Livre (MBL) e do Vem pra Rua. Até mesmo políticos do PSL se posicionaram contra a realização das manifestações.

Porém, segundo Ismael, o fato de milhares de pessoas saírem às ruas demonstra que "existem setores da direita e setores de bolsonaristas sangue-puro que certamente estão mobilizados em defesa do governo e da agenda do governo".

 As maiores preocupações dos manifestantes giravam em torno da reforma da Previdência proposta pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, e o pacote anticorrupção e anticrime do ministro da Justiça, Sergio Moro.

O cientista político Sérgio Praça, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), avalia que "as manifestações foram um pouco maiores do que se imaginava, mas não foram todas exatamente pró-governo".

"Foi uma pauta muito difusa, com alguns manifestantes contra as instituições, como o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF), e essa não é uma posição oficial do governo", observou.

Nos cartazes dos manifestantes, o STF e o Congresso foram acusados de bloquear a agenda do governo. Alguns pediram o fechamento dessas duas instituições ou até mesmo a invocação do artigo 142 da Constituição, segundo o qual as Forças Armadas podem intervir para garantir a manutenção "da lei e da ordem".

Dessa forma, não surpreende que a elite política brasileira tenha optado por se manter afastada das manifestações, avalia o cientista político da FGV.

Apesar de o próprio Bolsonaro ter lançado a ideia dos atos deste domingo, o presidente acabou se afastando das manifestações e pedindo a seus ministros que ficassem em casa. "Não foi uma jogada esperta dele, pois a direita está dividida hoje", avalia Praça.

"Acho que ele convocou esses atos imaginando que seria uma resposta muito forte aos protestos contra os cortes na educação. E rapidamente percebeu que não seriam manifestações tão grandes assim", avaliou.

Durante uma visita a uma igreja neste domingo, Bolsonaro minimizou a convocação que ele próprio tinha feito para os atos. "Hoje é um dia em que o povo está indo às ruas. Não para defender um presidente, um político ou quem quer que seja. Está indo para defender o futuro desta nação. Uma manifestação espontânea."

Ismael acredita que Bolsonaro esteja 100% de acordo com os atos, mesmo que posições anticonstitucionais tenham sido defendidas por manifestantes. "É evidente que ele estava apoiando. É a base social dele, uma parte daqueles que o elegeram e ainda continuam fiéis a ele, apoiando ele. E ele precisa disso."

Além disso, segundo Ismael, para Bolsonaro é bastante conveniente que ocorram protestos de massa contra as atitudes e os bloqueios impostos pelos partidos do chamado "centrão" e pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia. 

"Maia estava ganhando um poder tão grande que daqui a pouco ele iria acabar com o governo Bolsonaro", afirma Ismael. "Então, a reação das ruas é um aviso também: o país não pode ficar refém desse centrão fisiológico. Aí o país entraria num beco sem saída."

Um dos exemplos seria o questionamento de Maia em relação à Medida Provisória nº 870, que trata da reestruturação administrativa do governo. Após a convocação aos atos pró-Bolsonaro, na semana passada a Câmara voltou a colocar a medida em pauta.

"Uma manifestação para pressionar o Congresso é algo absolutamente legítimo para defender a pauta do governo, que, aliás, foi eleito com essa pauta", defende Ismael. "O presidente eleito foi Bolsonaro, e não Rodrigo Maia", observou, acrescentando que Bolsonaro agora possui novas cartas na mesa para lidar com o centrão. 

"É para começar a negociar com o centrão numa nova base, mostrando que ele tem o apoio das ruas", diz Ismael. Segundo o cientista político, a mensagem de Bolsonaro a partir de agora será: "Não vou aceitar chantagem por cargos ou que vocês agora pautem o governo. Vamos negociar."

Praça, por sua vez, não acredita que Maia e os partidos de centro se deixarão intimidar pelas manifestações. "Não acho que o centrão se incomodou", diz.

Para o cientista político, não faz sentido que os manifestantes utilizem Maia como bode expiatório para o impasse na reforma da Previdência, uma vez que, segundo afirma, o presidente da Câmara seria quem mais estaria comprometido com a adoção da reforma. De modo geral, Praça acredita que as manifestações não vão modificar o panorama atual em Brasília.

Por outro lado, Ismael aponta mais um aspecto positivo para o presidente: "Se por acaso tentarem derrubar Bolsonaro com manifestações, haverá uma reação nas ruas."

Para o analista, após as manifestações deste domingo, Bolsonaro certamente não se encontra na mesma situação de desamparo enfrentada pelo ex-presidente Fernando Collor de Mello, que perdeu o apoio das ruas e logo acabou caindo.

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