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Alemanha sob fogo por hesitação na crise Rússia-Ucrânia

3 de fevereiro de 2022

Em meio a temores de uma invasão da Ucrânia pela Rússia, governo alemão enfrenta críticas por falta de postura clara frente a Putin e tem sua imagem de aliado confiável do Ocidente arranhada.

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O chanceler federal alemão, Olaf Scholz, diante de bandeiras da UE e da Alemanha
Em meio a críticas, chanceler federal alemão, Olaf Scholz, anunciou que se reunirá com Putin em breveFoto: Markus Schreiber/AFP/Getty Images

Enquanto estimados mais de 100 mil soldados russos estacionados na fronteira da Ucrânia geram temores de uma invasão, para muitos observadores nos Estados Unidos e em alguns países do Leste Europeu já são visíveis algumas rachaduras na imagem da Alemanha como um aliado confiável.

Uma onda de críticas recaiu sobre Berlim – às vezes acompanhadas de uma zombaria amarga –, especialmente após a Alemanha responder a um pedido do governo ucraniano por armamentos com uma promessa de enviar 5 mil capacetes.

Pouco depois, foram publicados mapas das rotas dos aviões britânicos que transportam armas para o território ucraniano, que mostram claramente que tiveram de desviar do espaço aéreo alemão.

Ao lidar com sua primeira grande crise na política externa, a nova coalizão de governo alemã se vê, portanto, também diante de uma crise da própria imagem. 

Piotr Buras, diretor do think tank Conselho Europeu de Relações Exteriores, em Varsóvia, se diz perplexo com a comunicação caótica em Berlim. "O governo alemão não fala com uma só voz. Já ouvimos muitas opiniões, mas nenhuma estratégia clara", afirmou ao jornal alemão Taz.

Jornais internacionais, do The New York Times ao Deccan Herald, de Bangalore, na Índia, publicaram manchetes indagando de que lado a Alemanha está no conflito envolvendo a Ucrânia.

Talvez isso fique mais claro nos próximos dias. O chanceler federal alemão, Olaf Scholz, afirmou nesta quarta-feira (02/02) que viajará a Moscou em breve para conversar com o presidente russo, Vladimir Putin, sobre a crise russo-ucraniana.

Não às armas para a Ucrânia, sim ao gás russo?

A Espanha destacou uma fragata para o Mar Negro; a Dinamarca enviou caças à Lituânia e uma fragata para o leste do Mar Báltico, enquanto os Estados Unidos colocaram tropas de prontidão e anunciaram o envio de mais soldados à Europa – tudo isso demonstra um forte contraste com a recusa alemã de enviar armamentos a Kiev.

A Alemanha, até agora, vem se recusando a permitir que a Estônia envie nove canhões de artilharia da Alemanha para a Ucrânia. A justificativa de Berlim é a sua política de restrição de exportação de armas para regiões em crise.

Alexander Graf Lambsdorff, vice-presidente da bancada do Partido Liberal Democrático (FDP) no Bundestag (Parlamento alemão), acredita que essas exportações não fariam muita diferença. "Temos uma situação em que as Forças Armadas ucranianas são militarmente inferiores às forças russas em uma proporção que jamais poderia ser compensada pela entrega de armamentos", afirmou o parlamentar.

Críticos apontam para os interesses econômicos da Alemanha e para a dependência do país do abastecimento de energia da Rússia. Moscou é responsável por mais de 40% das importações alemãs de petróleo bruto e por 56% do gás natural.

Esse percentual pode ainda aumentar quando o gasoduto Nord Stream 2, cuja construção foi concluída há poucos meses, entrar em operação. Scholz sinalizou somente recentemente que, no caso de uma invasão militar russa à Ucrânia, o gasoduto poderia não ser ativado.

Soldado no leste da Ucrânia.
Soldado no leste da Ucrânia. Alemanha respondeu a um pedido do governo ucraniano por armamentos com uma promessa de enviar 5 mil capacetesFoto: Vadim Ghirda/dpa/AP/picture alliance

Dificuldade em encontrar posição comum

O Partido Social-Democrata (SPD), de Scholz, que lidera a coalizão de governo, tende a reforçar a necessidade de negociar e reduzir as tensões no relacionamento com a Rússia. Seus parceiros de coalizão, o Partido Verde e o FDP, defendem uma postura mais rígida.

Mas, mesmo entre os social-democratas, foi possível ouvir uma verdadeira cacofonia nos últimos dias. Na segunda-feira, dirigentes do partido, parlamentares e membros do governo conseguiram finalmente chegar a uma posição conjunta: no caso de uma invasão, todas as opções para a imposição de sanções mais rígidas estarão sobre a mesa, incluindo reconsiderar a entrada em funcionamento do Nord Stream 2.

Ao mesmo tempo, todos os canais diplomáticos deveriam ser explorados, especialmente as conversações no formato Normandia, mediadas pela Alemanha juntamente com a França. Entretanto, a proibição das exportações de armas para a Ucrânia continuaria em vigor.

Nesse último ponto, os social-democratas estão alinhados com a maioria da população. Segundo uma pesquisa do instituto YouGov, 59% dos alemães apoiam a decisão de não enviar armas à Ucrânia. Somente 20% são a favor. Afinal, a Alemanha já é o principal doador da Ucrânia em ternos econômicos e humanitários.

Lacuna deixada por Merkel

Observadores internacionais ressaltam que a saída da ex-chanceler federal Angela Merkel da arena política enfraqueceu substancialmente a política europeia referente à Rússia, além de deixar uma lacuna que Scholz, aparentemente, ainda não foi capaz de preencher.

A revista britânica The Economist, por exemplo, destacou que o canal de comunicação entre Berlim e Moscou secou desde a mudança de governo, no início de dezembro.

"A vantagem da chanceler Merkel era poder ligar para Putin a qualquer hora e ter uma conversa", observou à DW o ex-assessor de segurança do governo alemão Horst Teltschik.

Até agora, Scholz teria entrado em contato com o Kremlin apenas uma vez, no final de dezembro.