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Órgão do MPF defende publicação de diálogos da Lava Jato

16 de julho de 2019

Em nota, Procuradoria dos Direitos do Cidadão diz que juízes precisam ser imparciais e que a imprensa tem direito de divulgar mensagens, mesmo que obtidas ilegalmente.

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Justizminister Sérgio Moro
Mensagens entre Sergio Moro e Deltan Dallagnol começaram ser publicadas em junho, abalando a imagem das principais figuras da Lava JatoFoto: Marcelo Camargo/Agencia Brasil

A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão vinculado à Procuradoria-Geral da República que atua na área dos direitos humanos, divulgou nota nesta segunda-feira (15/07) na qual crítica a Lava Jato e defende  "a liberdade de publicação" das mensagens obtidas pelo site The Intercept Brasil.

Segundo a PFDC, o "enfrentamento à corrupção, como a qualquer outra violação aos direitos humanos, deve respeitar integralmente todos os direitos fundamentais ou humanos fixados na Constituição e no direito internacional".

Em seguida, o órgão adverte: "a investigação, acusação e punição de crimes em situação alguma podem se confundir com uma cruzada moral ou se transformar num instrumento de perseguição de qualquer natureza".

"Do contrário, suprimir-se-ia a legitimidade do próprio esforço de combatê-la. É inadmissível que o Estado, para reprimir um crime, por mais grave que seja, se transforme, ele mesmo, em um agente violador de direitos fundamentais", completa a nota.

Essa foi a primeira vez que um órgão do MPF se manifestou oficialmente em tom crítico aos métodos da Lava Jato desde que as mensagens de membros da operação foram reveladas.

Outro trecho menciona que um dos elementos essenciais é o direito a um julgamento perante juízes "independentes e imparciais, no qual o réu e seus advogados são tratados com igualdade de armas em relação ao acusador".

O texto não cita nominalmente o ministro da Justiça e ex-juiz Sergio Moro ou o coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, Deltan Dallagnol, pivôs do escândalo revelado pelo The Intercept, mas faz menção direta à publicação dos diálogos e as implicações do caso.

"Portanto, é vedado ao magistrado participar da definição de estratégias da acusação, aconselhar o acusador ou interferir para dificultar ou criar animosidade com a defesa. (...) Um julgamento justo somente ocorrerá quando estritamente observada a separação do papel do Estado-acusador (Ministério Público) em relação ao Estado-julgador (juiz ou tribunal)."

O texto é assinado pela chefe do órgão, procuradora Deborah Duprat, e pelos procuradores Domingos Dresch da Silveira, Marlon Weichert e Eugênia Gonzaga. A nota foi publicada no próprio site da Procuradoria-Geral da República (PGR), comandado pela procuradora-geral Raquel Dodge.

As matérias publicadas pelo site ou em parceria com outros veículos como o jornal Folha de S.Paulo e a revista Veja mostraram Moro e Deltan combinando estratégias contra réus, trocando informações sobre testemunhas e até mesmo discutindo futuras ações da Lava Jato. No domingo, a Folha ainda mostrou que Deltan chegou a montar um plano de negócios com um colega de procuradoria para abrir uma empresa de palestras e lucrar com a fama obtida pela Lava Jato.

Nesta segunda-feira, foi a vez de o jornalista Reinaldo Azevedo divulgar, com base nas mensagens obtidas pelo Intercept, que Deltan pediu a Moro para que ele liberasse verba em poder da 13° Vara Federal em Curitiba para financiar uma propaganda do pacote de Dez Medidas de Combate à Corrupção –  projeto defendido pelos membros da Lava Jato. Segundo os trechos divulgados por Azevedo, Moro concordou com o pedido.

Outra conversa revelada pelo jornalista nesta segunda-feira mostra que Deltan e Moro marcaram uma reunião com a Polícia Federal em 2015 para discutir prioridades da Lava Jato e tratar novas fases da operação, reforçando a suspeita de que o ex-juiz exercia um papel de influência na condução das investigações e denúncias. 

Liberdade de imprensa

Na parte final da nota, os procuradores defendem a divulgação dos conteúdos das conversas de Moro, Deltan e outros procuradores pelo Intercept Brasil e outros veículos.

Segundo a PFDC, mesmo que o material tenha sido obtido ilegalmente, isso não "não obstrui o direito de publicação".

"Assim, não é possível censura prévia a qualquer publicação jornalística, ainda que ela incorra em ilegalidades ou abusos, inclusive no que diz respeito ao direito de privacidade", diz a nota.

"Convém, nesse último ponto, recordar que o espaço de privacidade de agentes públicos é sempre mais reduzido do que de cidadãos em geral, em razão do exercício da função pública. De modo que a publicidade de seus atos é, em geral, a regra. (...) A ilegalidade na obtenção das mensagens também não obstrui o direito de publicação. Eventual responsabilidade pela invasão indevida de privacidade deve ser investigada de modo autônomo e, se comprovada, sancionada, sem, contudo, interferir na liberdade de publicação dos conteúdos."

Por fim, a PFDC diz que o Estado deve informar se existe alguma investigação contra "jornalistas ou meios de comunicação que estejam envolvidos com a publicação de informações jornalísticas de potencial desagrado de autoridades".

A última parte é uma referência a uma notícia divulgada no início do mês por um site pró-governo de que o jornalista Glenn Greenwald, fundador do Intercept, estaria sendo investigado pela Polícia Federal.

No início do mês, Moro, durante uma audiência na Câmara, se esquivou de responder se a PF tem liderado alguma investigação nesse sentido. "A Polícia Federal tem absoluta autonomia. Eu não interfiro nessas investigações específicas", disse ele na ocasião. Na semana passada, Greenwald disse que o posicionamento de Moro é uma tentativa de intimidar a equipe do site. "O clima que o ministro da Justiça está tentando criar, acho que isso é uma ameaça a uma imprensa livre", afirmou Greenwald, durante audiência no Senado.

Segundo a PFDC, represálias contra os veículos "podem, inclusive, ser consideradas crime de responsabilidade e improbidade administrativa".

JPS/ots

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