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Prémio Nobel da Paz para Nadia Murad e Denis Mukwege

Cristina Krippahl
5 de outubro de 2018

O Prémio Nobel da Paz 2018 distingue duas personalidades que dedicam a sua vida à luta contra a violência sexual:o médico congolês Denis Mukwege e a ativista iraquiana da minoria religiosa yazidi Nadia Murad.

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"Identifico cada criança violada como sendo minha. Como é possível calarmo-nos?” Denis Mukwege, o médico congolês que há muitos anos se dedica a ajudar as vítimas de violência sexual num país onde a violação e o estupro são armas comuns nos conflitos que proliferam um pouco por toda a arte, viu reconhecida a sua cruzada nesta sexta-feira, 5 de outubro, com a atribuição do Prémio Nobel da Paz 2018.

O ginecologista de 63 anos partilha o prémio com  Nadia Murad, ativista pelos direitos da minoria yazidi no Iraque. Em 2014, foi sequestrada e violada por combatentes do grupo radical auto-intitulado Estado Islâmico, mas conseguiu fugir aos raptores.

Segundo a presidente do comité Nobel, Berit Reiss-Anderesen, ambos foram galardoados pelos seus "esforços para pôr termo à violência sexual como arma de guerra”.

Viver para os outros

Foi pai quem o inspirou, contou Denis Mukwege numa entrevista com a DW há alguns anos: "Ele ensinou-me a viver para os outros”. No início do século, o ginecologista fundou o hospital de Parzi na capital de província Buvaku para prestar assistência às dezenas de milhares de mulheres e crianças maltratadas e violadas por grupos rebeldes e soldados do Governo nas guerras do Congo no final da década de 1990 e início de 2000. Para além de providenciar tratamentos médicos às vítimas, Mukwege também organizou para elas programas de apoio jurídico e psicológico.

Kongo Kinshasa  - Krankenhaus: Panzi Hospital
Denis Mukwege fundou um hospital para ajudar mulheres e crianças vítimas de violação Foto: picture-alliance/Yonhap/YNA

O médico congolês luta também pelos direitos das mulheres. Foi galardoado com prémios múltiplos, como o Sacharow do Parlamento Europeu em 2014 do Prémio Nobel alternativo, ocasiões que usou para chamar a atenção para os crimes que continuam a ser cometidos na República Democrática do Congo.

Pelo fim da impunidade

"Em Bukavu nascem cada vez mais crianças que resultam de violações. Não mataram as mães, mas destruíram completamente os seus órgãos genitais. Trata-se de uma forma de violência que tem por objetivo traumatizar toda a sociedade. Como se pode falar de paz, quando estes crimes não são punidos?", disse Mukwege à DW em 2014. 

O médico congolês não se deixa intimidar por ameaças ou violência. Em 2012 a sua casa foi assaltada por homens armados, que mataram um empregado que o tentou avisar. Mukwege fugiu para a Europa com a mulher e os filhos. Mas não conseguia esquecer as mulheres que precisavam da sua ajuda. Regressou três meses mais tarde e durante algum tempo viveu com guardas 24 horas por dia no recinto do hospital.

Nadia Murad: Combatente por um povo quase esquecido

Jesdidin Jeside Frau Mutter mit Baby Flucht vor IS Irak
Terorsitas islamitas cometeream as maiores atrocidades contra a minoria yazidiFoto: Getty Images/AFP/A.Al-Rubaye

Durante três meses, Nadia Murad foi torturada, espancada e violada. Hoje a jovem iraquiana yazidi de 25 anos luta para que ninguém mais tenha que sofrer semelhante martírio. Ao ser nomeada emissária especial das Nações Unidas para o comércio humano em 2016 prometeu: "Estou aqui para representar aqueles que morreram. Não podemos ressuscitá-los. Mas com eles no pensamento não deixaremos nunca de lutar”.

Antes do dia 15 de Agosto de 2014, a vida de Murad decorria tranquila nas montanhas Sinjar no norte do Iraque. Frequentava a escola na sua aldeia de Kocho com 2000 habitantes e planeava o futuro como professora de história ou proprietária de um salão de beleza.

Terroristas do chamado EI assaltaram a sua aldeia, massacraram grande parte dos habitantes, chacinaram os seus seis irmãos diante dos seus olhos, porque estes recusaram a conversão ao islão, e mataram também a sua mãe. Os sobreviventes como Murad fora transportados para Mossul. Foi entregue como "prenda” a um combatente do EI, que a humilhava e torturava diariamente.

Um empenho crucial

Prémio Nobel da Paz para Nadia Murad e Denis Mukwege

Quando tentou fugir fecharam-na num quarto e obrigaram-na a despir-se. Os guardas violaram-na durante tanto tempo que desmaiou. Mais tarde disse a propósito da escravatura sexual a que foi subjugada: "Não me queria suicidar, mas queria que me matassem”. Três meses mais tarde conseguiu fugir.

Quando o mundo começou a esquecer-se do martírio dos yazidi, Murad, entretanto refugiada na Alemanha, foi incansável em divulgar os crimes cometidos contra o seu povo.  Ao nomeá-la emissária especial, o secretário geral das Nações Unidas Ban Ki Moon disse que o destino de Murad o comovia às lágrimas, "mas também a sua força, coragem e dignidade”. O seu empenho já valeu à jovem várias condecorações importantes, como o Prémio Vaclav Havel do Conselho Europeu e o Prémio Sacharow. O Nobel da Paz coroa um empenho que o comité considerou crucial para a luta contra a violência sexual no mundo.

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