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Negócios de armas em África atraem traficantes

António Cascais
15 de setembro de 2020

Exércitos estão a aumentar despesas com armamento em África. EUA e Europa colocam muito dinheiro em circulação para apoiar continente na luta contra o terrorismo, o que atrai traficantes de armas, muitos deles corruptos.

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Foto: picture-alliance/Zumapress/D. White

O autor sul-africano e ex-membro do Parlamento do ANC Andrew Feinstein pesquisa negócios internacionais de armas há mais de 20 anos. Nos últimos anos, o especialista em armas observou que a África está cada vez mais no foco do lobby internacional de armas.

"Se olhar para os últimos 20 anos, chego à conclusão que, onde há um potencial de conflito, seja ele provocado por grupos terroristas como o Boko Haram, ou por guerras civis, como no Sudão ou no Sudão do Sul, encontramos, nessas mesmas regiões, inúmeros traficantes de armas vindos de todo o mundo."

Escândalo no Níger: a ponta do iceberg

Recentemente Andrew Feinstein trouxe a público mais um escândalo de fraude particularmente flagrante: um caso que ocorreu no Níger, um dos países mais pobres do mundo, e que está no meio de uma guerra contra terroristas, maioritariamente de países vizinhos. O país do Sahel comprou armas e equipamentos por cerca de mil milhões de dólares americanos entre 2011 e 2019, principalmente com dinheiro dos EUA, França e outros países da União Europeia (UE).

Andrew Feinstein Autor
Andrew Feinstein, especialista em armas Foto: Simone Sultana

Uma pesquisa da associação de jornalistas "Projeto de Reportagem de Crime Organizado e Corrupção" (OCCRP), com a contribuição de Andrew Feinstein, mostra agora que empresários do Níger, mas também na Rússia e na Ucrânia, provavelmente enriqueceram em diversos negócios. Uma boa parte dos mil milhões terá ido parar aos bolsos de intermediários corruptos e não aos arsenais do exército do Níger.

Dois empresários próximos do Presidente do Níger terão orquestrado compras de armas na China, Rússia e Ucrânia, simulando uma competição entre fornecedores que de facto não existia. Uma informação que consta de um relatório interno do Governo do Níger, ao qual Feinstein e os jornalistas do OCCRP tiveram acesso.

Numerosos negócios fraudulentos de armas estão listados no relatório de auditoria do Governo do Níger. Em 2016, por exemplo, dois helicópteros de ataque MI-171Sh foram adquiridos pela agência de exportação estatal russa Rosoboronexport por 55 milhões de euros, quase 20 milhões de euros acima do preço normal.

Lavagem de dinheiro na Alemanha?

As comissões para intermediários e pagamentos de suborno para fornecedores russos ou ucranianos terão sido transferidas para contas bancárias na Alemanha, de acordo com Andrew Feinstein.

"Quando vemos dinheiro desviado para um banco na Alemanha, isso é um sinal de alarme. Começa-se a perguntar, porque é que eles colocam o dinheiro em dois bancos diferentes? A resposta é que colocando o dinheiro num banco na Alemanha, é menos provável que alertem o Departamento de Justiça americano do que se o dinheiro for diretamente para um banco em Moscovo", explica.

A outra razão, segundo o especialista sul-africano, é que "quando se coloca o dinheiro em bancos diferentes, em locais diferentes, fica muito mais difícil rastrear os pagamentos dos subornos e também quem é a fonte do dinheiro e quem é o beneficiário do dinheiro. As autoridades alemãs deveriam fazer muito mais para monitorizar esse tipo de transferências monetárias."

Niger Bundeswehr | Schulterabzeichen Lufttransportstützpunkt Niamey LTStp am Flughafen in Niamey
A Alemanha é um parceiro importante na luta contra o terrorismoFoto: picture-alliance/dpa/M. Kappeler

Níger não é um caso isolado

Segundo o ativista anticorrupção Paul Holden, o relatório do Governo do Níger destaca como essas empresas funcionavam. Ele confirma mais uma vez que o comércio de armas é particularmente sujeito à corrupção, diz o sul-africano, fundador da organização anti-corrupção "Shadow World Investigations", em Londres.

"Definitivamente, há muito mais negócios corruptos de armas em África. Infelizmente, o comércio de armas em todo o mundo é incrivelmente corrupto. O comércio de armas é responsável por 40% da corrupção no comércio global e, infelizmente, em muitos países africanos não se supervisionam os orçamentos de defesa. Eles não são transparentes", diz.

A corrupção não é apenas organizada pelos intermediários africanos, afirma ainda Paul Holden. Os corruptos em África sempre tiveram cúmplices na Europa. E não apenas em países como a Rússia, considerados menos transparentes.

Holden lembra de um caso suspeito de corrupção no ano 2000 que afetou a África do Sul - o seu país natal - e a Alemanha. Naquela época, os sul-africanos compraram quatro navios de guerra Meko A-200 de um consórcio alemão por impressionantes 731 milhões de euros em "luvas", um negócio que terá sido possível devido ao pagamento de milhões, por parte dos vendedores alemães. No entanto, as investigações, tanto na Alemanha como na África do Sul fracassaram.

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