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Fotojornalista ganha processo em tribunal contra a polícia

27 de março de 2019

Tribunal Judicial da cidade de Pemba, em Cabo Delgado, proferiu o veredito que envolveu em abril de 2017 o espancamento e detenção do fotojornalista moçambicano Estácio Valói, em pleno exercício das suas funções.

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Mosambik Prozess gegen Journalistin in Pemba, Cabo Delgado
Foto: DW/D. Anacleto

Na sentença proferida esta quarta-feira (27.03), o Tribunal Judicial da cidade de Pemba na província moçambicana de Cabo Delgado condenou os agentes Aires Aureliano Tiquelia e Augusto Castigo José Guta a penas de cinco meses de prisão e o pagamento de uma indemnização no valor de 50 mil meticais, cerca de 700 euros, ao fotofornalista Estácio Valói.

Segundo a juíza Felicidade Fremo, que julgou o caso, Valói foi intercetado por agentes da polícia quando, a 7 de abril de 2017, realizava uma reportagem fotográfica numa cerimónia pública alusiva ao Dia da Mulher Moçambicana.

Na altura, os agentes exigiram que o fotojornalista se identificasse. Durante a discussão e sem qualquer consenso, o co-réu Augusto Guta e um outro agente não identificado conduziram o ofendido numa viatura da polícia à 2ª esquadra da cidade de Pemba.

Mosambik Journalist Estácio Valói festgenommen
Estácio ValóiFoto: privat

Material apreendido

O co-réu Aires Tiquelia, que à data dos fatos exercia as funções de Comandante da 2ª Esquadra, ordenou que o ofendido fosse algemado e colocado numa cela com outros detidos. Estácio Valói teve de entregar o seu material de trabalho, que consistia numa camera fotográfica e respetivo cartão de memória. Mesmo depois de apresentar a sua credencial, o fotojornalista permaneceu detido por cerca de duas horas.

No tribunal, ficou agora provado que os co-réus praticaram o crime de violência no exercício das funções públicas, que é previsto e punido nos termos do artigo 498 do Código Penal, sancionável com pena de prisão de um a seis meses.

Na mesma circunstância, aquele órgão da administração da justiça, absolveu o réu Cornélio Albino Tuvane, que na altura exercia as funções de Comandante da Polícia Municipal por não ter sido provado o seu envolvimento no caso.Ao ler a sentença ditada esta quarta-feira (27.03.), a juíza Felicidade Fremo anunciou que "por unanimidade, em nome da lei e da República de Moçambique decidiu absolver o réu Cornélio Albino, por entender que este não cometeu o crime de que é acusado. Por outro lado, são condenados os co-réus Aires Aureliano Tiquelia e Augusto Castigo José Guta, a igual pena de cinco meses de prisão”.

Moçambique: Agentes da polícia condenados em tribunal por agressão a fotojornalista

Pena inclui indemnização

Os condenados deverão ainda indemnizar Estácio Valoi, no valor de 50 mil meticais (700 euros), pagarem individualmente o imposto de justiça e emolumentos à favor do defensor oficioso.

"Nos termos das conjugações legais dos artigos 102, número Um, alínea A, 114, número Um e 115, todos do código penal, fica a execução da pena suspensa por um período de dois anos, atendendo e considerando o fato que esses co-réus são primários", acrescntou a juiza Felicidade Fremo.Dionísio Pedro, advogado do fotojornalista, considerou a sentença como justa e uma forma de desencorajar os excessos praticados por agentes da polícia, perante a atividade jornalística.

Mosambik Prozess gegen Journalistin in Pemba, Cabo Delgado | Dionísio Pedro, Anwalt
Dionísio PedroFoto: DW

Excesso por parte dos agentes

Para este magistrado, houve sim um excesso por parte dos agentes ao impedir o exercício da atividade jornalística. Ele alerta que "para proibirmos alguma coisa de se fazer é preciso que haja legislação. Depois, se é proibido fazer-se a captação de imagens é preciso que haja uma sinalização neste sítio. Num espaço público, podemos sim fazer a captação de imagens. Se a polícia ou qualquer agente tenta reprimir esta função do jornalista, que tenha como base alguma lei".

No seio dos jornalistas de Cabo Delgado as opiniões estão divididas. Alguns deles que falaram à DW Africa consideram que a pena aplicada aos infratores foi leve.

É o caso de Milda Quaria, jornalista da Rádio Sem Fronteira. "Geralmente as pessoas não tem noção da infração que cometeram quando não sentem as consequências do seu erro", destacou.

Hizidine Achá, da televisão privada STV, diz estar satisfeito com o veredito e espera que o Ministério Público fiscalize o cumprimento desta decisão, pois, no seu entender com a sentença condenatória a agentes da policia, a classe jornalística poderá correr alguns riscos, nomeadamente atos de vingança por parte dos agentes.

Mosambik Prozess gegen Journalistin in Pemba, Cabo Delgado | Hizidine Acha - Jounalist STV-Cabo Delgado
Hizidine AcháFoto: DW/D. Anacleto

"Virou hábito a proibição de captação de imagens, mesmo a recolha de informações em lugares públicos, sobretudo quando começaram os ataques armados à região de Cabo Delgado. Então, espero que a polícia consiga saber onde de fato deve proibir a captação de imagens, para que o jornalista possa fazer o seu trabalho com total segurança", afirmou Achá.

Milda Quaria aproveita para deixar um apelo às autoridades: "Queremos ir buscar imagens de fatos, imagens daquilo que está a acontecer, porque nós queremos informar Moçambique, sobre o que está a acontecer”.

Ação contra militares

Recorde-se que o fotojornlista Estácio Valói esteve também sob custódia militar por 48 horas (entre 16 e 18 de dezembro de 2018), quando realizava uma reportagem fotográfica na região entre os distritos de Palma e Mocímboa da Praia. 

Também o equipamento de trabalho e o telemóvel foram apreendidos pelos militares. Valói em entrevista à DW disse na altura que "vamos entrar com uma ação contra estes militares, porque achamos que estamos num Estado de direito. Muito mais além do que é a liberdade de imprensa é a de expressão. E o tratamento que tive foi de ameaça de morte".

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