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Moçambique: Estado da Nação vai "de mal a pior"

António Cascais
20 de dezembro de 2022

Diretor do Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD) diz que, no discurso do Estado da Nação, o Presidente Filipe Nyusi passou por cima das principais questões que preocupam os moçambicanos.

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Presidente moçambicano, Filipe Nyusi
Foto: Sitoi Lutxeque/DW

Moçambique vai "de mal a pior", e o Presidente Filipe Nyusi opta por usar óculos cor-de-rosa. É o que diz Adriano Nuvunga, diretor do Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD), depois de ouvir o discurso do Estado da Nação de Nyusi, esta terça-feira.

Em entrevista à DW, Nuvunga diz que houve uma série de temas que ficaram esquecidos, como os problemas na educação, saúde e abastecimento de água.

Além disso, temas estruturantes como o combate ao terrorismo em Cabo Delgado, o processo de Desarmamento, Desmobilização e Reintegração (DDR) e a implementação da Tabela Salarial Única (TSU), que provocou enorme descontentamento social no país, foram abordados "de forma superficial", diz o ativista.

DW África: O Presidente Filipe Nyusi pintou um quadro realista do Estado da Nação?

Adriano Nuvunga (AN): O Estado da Nação vai de mal a pior. Os temas que o Presidente destacou, designadamente o terrorismo, o DDR e a TSU, são temas estruturantes neste momento, mas foram abordados de uma forma superficial.

Em relação ao DDR, não se trata apenas de meia dúzia de militares da RENAMO. É uma questão mais social e de uma marginalização histórica da região centro do país em detrimento de outras regiões, que não se está a abordar adequadamente. Depois, tem a questão da TSU, que já não se sabe mais o que é, porque o que se tinha concebido não se efetivou na prática. A TSU tornou-se um instrumento de promoção do consumismo das elites, não tem servido para a [desejada] uniformização e criação de uma Tabela Salarial Única. Pelo contrário, está a promover a desordem na Função Pública e uma série de violações das liberdades e direitos humanos dos funcionários.

DW África: Nyusi afirmou que o inimigo em Cabo Delgado sofreu baixas e se refugiou. Esta descrição será baseada em factos ou será que se trata de "fake news"?

Adriano Nuvunga
Adriano Nuvunga diz que, no discurso do Presidente moçambicano, ficaram muitos temas por abordarFoto: DW

AN: Em relação ao terrorismo, Filipe Nyusi não falou da normalização da crise humanitária em Cabo Delgado, a que se assiste neste momento. Ignora-se o sofrimento. Por outro lado, o Presidente não destacou adequadamente as causas do conflito em Cabo Delgado, que remetem para a questão interna. É preciso esclarecer a forma como as elites no poder se beneficiam do conflito e contribuíram [para ele] através do extrativismo elitista.

Nyusi também não abordou a preocupação que temos por Moçambique ser incapaz de mobilizar-se como nação para defender a sua soberania e precisar de um país como o Ruanda, que recebe fundos em nome de Moçambique, para vir proteger a nossa riqueza e o nosso povo.

DW África: Que temas deveriam ter sido abordados pelo Presidente da República, na sua perspetiva?

AN: O Presidente não abordou o tema da deterioração dos serviços sociais, não falou da questão da qualidade da educaçãoe de todas as situações de sabotagem do sistema de educação. Não falou a questão da saúde, da falta de medicamentos, uma violação clara dos direitos humanos. Não falou das dificuldades no acesso à água, nem da questão da precariedade dos transportes públicos. Tão-pouco mencionou a problemática do crime organizado.

Como se não bastasse, teve a coragem de ir ao Parlamento, falar diante de um deputado que é um barão da droga e não mencionar o nível elevado de corrupção que atingimos. Também não falou da limitação e do fechamento do espaço cívico das liberdades em Moçambique. Agora é proibido fazer manifestações, a não ser que sejam protagonizadas pelos membros da FRELIMO. Neste contexto todo, não se pode ter um Estado da Nação que seja de encorajamento. É um Estado da Nação que vai de mal a pior.

Entrevista exclusiva do Presidente de Moçambique

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