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"Leis em Angola são muito bonitas, o problema é aplicá-las"

João Carlos (Lisboa)3 de setembro de 2014

O escritor angolano Lopito Feijóo diz que não há interferência política na atividade literária ou que ponha em causa a liberdade dos autores. Há leis no país que garantem isso. "O problema é a sua aplicação."

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Foto: DW/J. Carlos

"A liberdade de expressão e editorial em Angola está no bom caminho", comenta o escritor angolano Lopito Feijóo, que é também presidente da Sociedade Angolana do Direito de Autor. Não há uma interferência do poder político porque, diz Feijóo, "fundamentalmente, as leis são muito bonitas em Angola. Eu fui legislador. O problema é a regulamentação e aplicação prática destas leis. E a sociedade civil tem de se bater pela aplicação prática da lei de imprensa, da lei de divertimento e espetáculos e da lei do direito do autor."

Há escritores, considerados mais críticos, que preferem lançar as respetivas obras fora de Angola por recearem a censura ou interferência do poder político. Mas Lopito Feijóo relativiza. Esses autores "não são inimigos políticos", refere.

"Eles não representam nada num país com 20 milhões pessoas onde só publicam mil exemplares", diz o escritor angolano. "Esses mil exemplares passam de mão e mão mas não influenciam 20 milhões de pessoas. É uma gota no oceano. Mas incomoda."

"Não cuspo no prato onde comi"

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Na conversa com a DW África na sua casa em Lisboa, recheada de arte, o ex-deputado reconhece ser "um homem do sistema”"político no poder, que não "cospe no prato onde comeu".

"Eu representei o partido político no poder durante 16 anos. [O partido] tem mais aspetos positivos do que negativos", diz. "Temos é de ajudar o país a crescer e não ficar apenas a criticar a partir de fora. Quando eu quero criticar, critico dentro do próprio país."

Perda de valores

Lopito Feijóo reconhece, entretanto, que em Angola falta espaço de promoção da produção literária.

"Só há um jornal de cultura em Angola", lamenta o escritor. "A imprensa privada não dá espaço suficiente à cultura. Não tem suplementos culturais como nós já tivemos no Jornal de Angola."

Considerado um dos 15 maiores poetas africanos dos anos 80, Lopito Feijóo assume-se como um escritor de crítica social. É nessa qualidade que denuncia a perda de valores, não só na sociedade angolana.

"Os sistemas de poder impõem a secundariedade dos motivos de espírito, por isso é que há a tal perda de valores. Porque se os motivos de espírito fossem fundamentais não havia essa perda de valores, as faltas de respeito que há hoje, inclusive dos símbolos nacionais", afirma Feijóo.

Buchcover Lopito Feijóo Desejos de Aminata
Novo livro de Lopito Feijóo, "Desejos de Aminata"Foto: DW/J. Carlos

Esta perda de valores, sublinha, afeta a produção literária, mas também a qualidade do ensino e da educação. "Há um poder de compra de livros muito baixo. Há um poder de compreensão daquilo que vem nos livros muito baixo. Há um poder de literacia muito baixo e um poder de iliteracia muito alto", diz o escritor angolano.

Lopito Feijóo aponta um dos caminhos para combater o défice na qualidade do ensino em Angola: "Quando os professores de língua portuguesa souberem escrever bem os alunos vão escrever bem", comenta.

É na língua de Camões que Feijóo produziu o seu novo livro de poesia "Desejos de Aminata", que foi lançado esta terça-feira (03.09) em Braga, no norte de Portugal.

Neste livro, de 40 textos poéticos intimistas e de densidade erótica, o autor inspira-se no oceano Atlântico e no colorido dos trajes das mulheres de África, berço da humanidade. A obra é, portanto, uma homenagem à sua esposa Aminata Goubel e à mulher africana.