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Jornalista diz que jovens não têm medo de se manifestar em Angola

20 de dezembro de 2012

Está prevista uma manifestação em Luanda no próximo dia 22 de dezembro. Será a última de 2012, ano rico em protestos populares em Angola. Contudo, pouco melhorou na vida das pessoas, avalia jornalista Coque Mukuta.

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Protesto em Benguela, julho de 2012
Protesto em Benguela, julho de 2012Foto: DW

De Luanda chegaram informações que davam a mostra de um ambiente de tensão, logo no início do ano. A primeira manifestação contra o Presidente José Eduardo dos Santos, a 14 de janeiro, morreu à nascença com a intervenção de forças policiais.

Os jovens tentaram protestar contra a governação de Eduardo dos Santos, há 32 anos no poder, e lançar o apelo ao fim da corrupção, que se suspeita estar enraizada no executivo, e em prol melhoria da situação social dos angolanos.

No entanto, a manifestação de estreia em 2012 terminou à bastonada. Quando os jovens iniciaram a sua marcha, depois da concentração, um forte cordão policial travou a progressão.

“A polícia montou um aparato, estava acompanhada de indivíduos à paisana que chegaram mesmo ao sítio onde nós nos estávamos a juntar e pagaram-me, começaram-me a torturar de imediato", disse uma jovem estudante.

O ambiente agitado que se viveu viria a ser repercutido ao longo do ano na capital e noutras cidades angolanas. A maior parte das manifestações foi organizada por jovens, em período pré-eleições gerais, que viriam a realizar-se a 31 de agosto.

A música foi utilizada por muitos jovens como meio de contestação. Muitos rappers lançaram novas músicas, como por exemplo Marshall ou MCK, que estreou a faixa “Eu queria morar em Talatona”, referindo-se a um bairro nobre da capital angolana.

Para analisar o ambiente fértil em manifestações juvenis no ano de 2012, a DW África conversou com o jornalista angolano Coque Mukuta. Mukuta e Cláudio Fortuna escreveram um livro sobre as manifestações no país, em 2011, intitulado “Os Meandros das Manifestações em Angola”.

DW África: Principalmente nos primeiros meses, o ano de 2012 não foi muito tranquilo?
Coque Mukuta (CM): Não foi muito tranquilo e nós devíamos mesmo lembrar algumas coisas que ficaram marcadas. Marcou o pleito eleitoral de agosto último, a realização de manifestações e aqui há que sublinhar o desaparecimento de Alves Kamolingue e de Isaías Cassule, dois ativistas que desapareceram até aos dias de hoje. Há seis meses que não se sabe do paradeiro dessas pessoas. Este foi um ano que se pode chamar de “ano negro” pela forma negativa como se trataram os Direitos Humanos neste país.

DW África: Ao longo deste ano chamaram a atenção manifestações de jovens, principalmente dos rappers. Pode comentar?

CM: Tudo isso por causa do quadro negro que se regista em Angola, naquilo que tem a ver com o tratamento das pessoas. E as pessoas só pedem mesmo, no dia a dia, água, luz, saúde, educação, pois estamos cada vez pior.

DW África: Destaca algum avanço neste ano 2012, sobretudo do ponto de vista dos jovens?
CM: Há um andamento aqui. Uma boa parte dos jovens angolanos perdeu o medo por causa dessas iniciativas, o que é muito bom. Se os jovens já perderam o medo é sinónimo de que os dias hão-de melhorar porque os jovens vão enfrentar, vão fazendo coisas positivas por eles mesmos. Outra coisa que pode ser considerada como avanço é o fato de que hoje, em Angola, já se pode criticar José Eduardo dos Santos, a má governação, até no táxi, num autocarro público. Antigamente não se podia criticar.

DW África: Noutras áreas, como por exemplo na economia, na qualidade de vida, viu algum avanço para a população de Angola?

CM: Para a população de Angola não se nota nada. O que se nota, na verdade, é o enriquecimento de uma determinada família que é conhecida, a família “real”, do Presidente Eduardo dos Santos e seus amigos. Há dias tomámos nota da compra do condomínio de Samba da filha do Presidente, Isabel dos Santos - o que acontece com normalidade.
Mas para os jovens, do ponto de vista do melhoramento da economia, da vida social, a situação é cada vez mais degradante. Nós não temos luz, não temos água, os salários não chegam para equilibrar o nível de vida em Luanda. Luanda é uma das cidades mais caras para se viver. E para a juventude torna-se cada vez mais complicado.

DW África: O que poderá esperar pessoalmente e a população de Angola para o próximo ano de 2013?

CM: Pessoalmente, espero maior sensibilidade dos governantes para com os governados. Por exemplo, quem tem duas casas não teria a possibilidade de receber a terceira casa. Existem muitos condomínios em Angola mas esses condomínios são distribuídos para as mesmas pessoas, o que é muito mau. Seria bom que os jovens, e não só, tivessem possibilidade de aceder a esses bens que são público. Porque Angola não é “lavra da mãe Joana”. Angola é o país de todos nós, a única riqueza que Deus deu. Seria muito bom se dessem aos jovens oportunidades, se os condomínios fossem distribuídos de forma equitativa, se os concursos [para aceder aos condomínios] fossem mais claros do que o que tem acontecido.

Autor: Wellington Carvalho
Edição: Glória Sousa / Márcio Pessoa

Jovens perderam medo de se manifestar em Angola, diz jornalista angolano

Intervenção policial em manifestação de ex-militares, no Lubango, em agosto de 2012
Intervenção policial em manifestação de ex-militares, no Lubango, em agosto de 2012Foto: DW
Jornalista e escritor angolano critica a concentração de riqueza na família presidencial
Jornalista e escritor angolano critica a concentração de riqueza na família presidencialFoto: Reuters
A qualidade de vida dos jovens angolanos é "cada vez mais degradante", segundo Coque Mukuta
A qualidade de vida dos jovens angolanos é "cada vez mais degradante", segundo Coque MakutaFoto: DW/R. Krieger
Manifestação em Benguela, sul de Angola, março de 2012
Manifestação em Benguela, sul de Angola, março de 2012Foto: DW
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