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"Estado angolano não tem interesse em investigar execuções"

3 de junho de 2018

Para a associação OMUNGA, o Ministério do Interior, que determinou a responsabilização do agente do Serviço de Investigação Criminal acusado de executar uma pessoa em Luanda, não deverá investigar outras denúncias.

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Polícia em Luanda (arquivo/2013)Foto: Getty Images/Afp/Estelle Maussion

A execução de um suspeito de roubo por um agente do Serviço de Investigação Criminal (SIC) na capital angolana, na sexta-feira (01.06), que foi filmada por uma cidadã e teve o vídeo amplamente partilhado nas redes sociais, está a causar "uma grande indignação nas organizações da sociedade civil", afirmou à DW África neste domingo (03.06) o diretor-executivo da associação OMUNGA.

De acordo com José Patrocínio, parte desta indignação tem a ver com o facto de que a vítima, "independentemente de ser ou não procurada pela polícia, já estava baleada no chão e, portanto, não oferecia qualquer resistência ou ameaça para os agentes de segurança e muitos menos para os cidadãos".

Rui Ferreira
José Patrocínio, da diretor da OMUNGAFoto: DW/Sul d'Angola

Ainda na sexta-feira, o Ministério do Interior de Angola divulgou um comunicado informando que determinou a investigação do caso e a responsabilização criminal e disciplinar do agente do SIC que foi flagrado durante a ação. Porém, para Patrocínio, a declaração oficial é mais um motivo de revolta por parte da sociedade angolana.

Investigação de um "caso isolado"

"Aparentemente há uma intervenção do Ministério do Interior para resolver este caso. Mas a tentativa, na verdade, é de apresentar este facto como sendo um caso isolado, uma questão casual, que por acaso um elemento da polícia fez esse procedimento. E isto realmente preocupa a sociedade civil", disse o ativista da OMUNGA, ressaltando que o ministério não mencionou no comunicado outros casos de execução já denunciados em Angola.

José Patrocínio lembra que este tipo de crime tem sido frequentemente denunciado por ativistas, nomeadamente o ativista e jornalista Rafael Marques, que denunciou por meio de um relatório no ano passado a existência de "esquadrões da morte" na polícia, com respostas do Ministério do Interior e do Governo a tentar desmentir essas denúncias, "o que leva a crer que nunca forma investigadas".

"E agora este facto [a execução filmada e partilhada nas redes sociais] é demasiado público, não se pode desmentir", considerou o ativista angolano, alertando que "não se está a tentar fazer uma investigação no sentido de pôr fim a este tipo de prática e verificar que níveis institucionais da polícia estão envolvidos nestes atos, se é apenas a nível do agente que está no terreno, ou se também envolve dirigentes".

Angola Polizeikommando
Comando da Polícia na capital angolanaFoto: DW

"Bandido bom é bandido morto"

Outra preocupação do dirigente da associação OMUNGA tem a ver com a reação ao vídeo que desde sexta-feira tem sido partilhado nas redes sociais pelos internautas angolanos. "Eu, pessoalmente, estou muito preocupado com a forma como grande parte da população reagiu violentamente a esta situação. Isto demonstra que muitos cidadãos estão num ponto de violência tal que é apologista a este tipo de crime. E isto para mim, enquanto ativista, é assustador".

De acordo com José Patrocínio, "estamos numa situação de medo, de descredito das instituições, em que se acredita que 'bandido bom é bandido morto'".

Para reestabelecer a confiança da população nas instituições e na segurança do Estado, o ativista afirma que é preciso que o Governo vá além do comunicado do Ministério do Interior e demonstre que realmente haverá um processo em relação ao agente responsável pelo assassinato do suposto acusado em Luanda, e que ele será responsabilizado pela Justiça.

Além disso, acrescenta José Patrocínio, é necessário que o Estado investigue os casos de execuções já denunciados e tome medidas caso verifique que realmente esses crimes têm sido uma "política de extermínio" por parte dos agentes de segurança. Também deve haver medidas urgentes nos caos de cidadãos que fazem justiça com as próprias mãos, aponta o ativista.

"Eu não acredito que as autoridades têm esse interesse, mas nós enquanto sociedade civil devemos trabalhar muito no sentido de promover esse interesse", concluiu José Patrocínio, que assegurou que pretende pedir a ajuda de organismos internacionais neste caso.

Thiago Melo da Silva
Thiago Melo Jornalista da DW África em Bona