1. Ir para o conteúdo
  2. Ir para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Crónica da morte de um Estatuto dos Políticos em Cabo Verde

Nélio dos Santos (Cidade da Praia)14 de abril de 2015

Depois de muita pressão popular, os dois principais partidos do país deixaram cair o polémico Estatuto dos Titulares de Cargos Políticos, que previa, entre outras coisas, um aumento dos salários, congelados há 17 anos.

https://p.dw.com/p/1F8Ws
Foto: DW/Nélio dos Santos

Quinze dias depois do Movimento de Ação Cívica (MAC#114) ter organizado uma manifestação contra o Estatuto dos Titulares de Cargos Políticos que juntou nas principais cidades do país milhares de pessoas, os principais partidos políticos do país (PAICV e MpD) deitaram a toalha ao chão.

Eis o resumo dos acontecimentos no dia em que a proposta caiu por terra.

Cabo-verdianos ameaçam com novos protestos

Na manhã de segunda-feira (13.04), os dirigentes da União Nacional dos Trabalhadores de Cabo Verde - Central Sindical (UNTC-CS) e do Movimento de Ação Cívica (MAC#114) admitiram que, se os deputados voltassem a aprovar o Estatuto, poderiam avançar para uma ação conjunta de protesto. As duas organizações anunciaram que iriam transformar o 1º de maio, Dia Internacional do Trabalhador, numa jornada nacional de luta contra o Estatuto dos Titulares de Cargos Políticos.

"Continuamos a defender que o momento não é oportuno para a aprovação desse documento", disse o secretário-geral da UNTC-CS, Júlio Ascensão Silva.

"Não há condições políticas"

Poucas horas depois, o presidente do Movimento para a Democracia (MpD), Ulisses Correia e Silva, anunciou o fim do consenso com o Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV).

"Não há condições políticas para continuarmos no processo de aprovação do Estatuto dos Titulares de Cargos Políticos, nem para a sua revisão, tendo em conta a situação interna do PAICV", afirmou. "Não temos um interlocutor válido neste momento, é um partido com um corpo e três cabeças. A relação de confiança foi posta em causa durante todo este processo."

[No title]

O líder parlamentar do PAICV, Felisberto Vieira, e o primeiro-ministro, José Maria Neves, defendiam a aprovação do estatuto, mas a líder do partido, Janira Hopffer Almada, manifestara-se contra.

Fim "doloroso"

Por ser um diploma que exige a maioria qualificada, Felisberto Vieira anunciou ao final da tarde que, assim sendo, também caía o processo de reforma do Parlamento.

"Temos um conjunto de alterações no processo negocial, com a surpreendente notícia dada hoje pelo líder do MpD. Há uma movimentação cívica e política e ainda um conjunto de ruídos à volta deste processo. Pensamos que não existem efetivamente as condições necessárias para se avançar."

Felisberto Vieira falou de um dia triste para a democracia cabo-verdiana, contrariamente à satisfação manifestada pela sociedade civil.

"É doloroso que todo o trabalho feito até este momento chegue a este fim de uma forma abrupta", disse Vieira. "Penso que a democracia parlamentar sai a perder, o Estado de Direito de Cabo Verde sai a perder, mas é assim a vida política."

Estatuto poderá ser aprovado em 2017?

Porträt José Maria Neves
Primeiro-ministro cabo-verdiano, José Maria NevesFoto: DW/N. dos Santos

Esta terça-feira (14.04), o primeiro-ministro cabo-verdiano lamentou o facto de o PAICV e o MpD terem retirado da agenda a discussão e votação do Estatuto dos Titulares dos Cargos Políticos. José Maria Neves espera que o pacote que conduzirá a uma reforma profunda do Parlamento venha a ser aprovado em 2017, depois das eleições gerais do próximo ano.

“O Parlamento já tomou a decisão de suspender este debate", afirmou. "Espero que as próximas eleições legislativas, autárquicas e presidenciais sejam jornadas democráticas para o debate aprofundado dessas questões com a sociedade cabo-verdiana, e após essas eleições, eventualmente em 2017, se faça uma profunda reforma do Parlamento, incluindo a problemática do Estatuto dos Titulares de Cargos Políticos.”

Na semana passada, o Presidente da República, Jorge Carlos Fonseca, vetou o projeto de lei do Estatuto dos Titulares de Cargos Políticos, depois de muitos apelos nesse sentido feitos por diversos sectores da sociedade cabo-verdiana, entre os quais, pelo cardeal de Cabo Verde, Dom Arlindo Furtado.