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Como impedir o avanço dos jihadistas?

Matthias von Hein
13 de novembro de 2020

O que leva os jovens a alistarem-se em movimentos extremistas islâmicos - e como podem ser reintegrados na sociedade? Cinco anos após os ataques no Bataclan e noutros locais de Paris, estas questões continuam atuais.

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Foto: picture-alliance/dpa/R. Peters

Dresden, Paris, Nice e Viena. Após quatro ataques terroristas em apenas um mês, é evidente que, cinco anos após os ataques em Paris que mataram 130 pessoas, o terror islamista na Europa não foi derrotado.

Mais uma vez, as autoridades estão a considerar impor controlos mais rigorosos nas fronteiras, prometendo uma cooperação mais estreita com os serviços de segurança e apelando a uma ação mais forte contra militantes islâmicos que são considerados uma ameaça.

Os ataques mais recentes salientam em particular o perigo representado por atacantes que atuam sozinhos, mas fazem parte de uma rede. Quem são estas pessoas? O que é que as motiva? O panorama atual do salafismo no estado mais populoso da Alemanha, a Renânia do Norte-Vestfália, adverte: "Deve ser dada especial atenção ao potencial considerável dos salafistas jovens e violentos. Nos últimos anos, os jovens têm sido cada vez mais alvo da propaganda jihadista e têm reagido mais positivamente a isso".

Oliver Roy, um especialista francês em islamismo, também vê predominantemente homens jovens "fascinados pela violência jihadista" e que afirmam serem melhores muçulmanos do que os seus pais, sem ter de passar anos a estudar o Corão. Na opinião de Roy, são jovens rebeldes que inserem a sua revolta numa narrativa islamista - uma narrativa fornecida por organizações como a Al-Qaida e o chamado Estado Islâmico.

Irak Syrien Terrorist IS-Mörder Dschihadi John
Foto: picture-alliance/AP Photo

"Culto da morte"

Em entrevista à DW, Roy refere-se a essa narrativa como um "culto da morte". Segundo o especialista, quando estes jovens matam, "eles esperam ser mortos... Não é tanto uma ideologia, [mas] uma trajetória pessoal. Eles têm um objetivo: ir para o paraíso, morrer como mártires".

O sociólogo Felix Rossmeissl, de Frankfurt, que faz parte de um projeto de investigação sobre jihadismo, prefere referir-se a este fenómeno como "dinâmica de período probatório". Os jovens, explica o sociólogo, querem provar que podem satisfazer expetativas, e é assim que são coagidos a cometer atos de violência.

De acordo com a sua análise, trata-se de "uma alternativa às dinâmicas de experiências convencionais, que na nossa sociedade estão ligadas principalmente à vida profissional e ao sucesso académico". É por isso que, segundo Rossmeissl, os jovens que estão a ter dificuldades em fazer a transição para a vida adulta são particularmente suscetíveis à propaganda jihadista.

Gedenkmarsch in Gedenken an die Opfer des Terroranschlages
Homenagens às vítimas do ataque terrorista em Viena a 2 de novembroFoto: Eibner Europa/imago images

Limites da desradicalização

O professor e psicólogo alemão Thomas Mücke trabalha com estes jovens. Ele é o diretor da Rede de Prevenção da Violência (RPV), que promove a desradicalização de extremistas violentos.

"Sabemos, claro, que as pessoas que são instáveis ou que estão atualmente a atravessar uma crise podem ser recrutadas muito rapidamente por extremistas", diz Mücke à DW.

Quando a RPV trabalha nas prisões com pessoas que podem representar uma ameaça, com antigos membros do Estado Islâmico ou com islamistas violentos, a sua prioridade máxima é "tornar possível que estas pessoas voltem a pensar por si próprias", explica Mücke.

Politologe und Pädagoge Thomas Mücke
Thomas Mücke: "As pessoas perdem a capacidade de pensar por si próprias"Foto: VPN/Klages

"Na cena islâmica, é preciso obedecer, tem de se subordinar. E as pessoas perdem a capacidade de fazer perguntas e pensar por si próprias."

Mücke, no entanto, sabe que há limites para o que a desradicalização pode alcançar. "Não devemos ter a ilusão de que, se fizermos um grande esforço na área da segurança, na área do trabalho sócio pedagógico, nunca haverá um ataque. Haverá sempre ataques."

O diretor da RPV teve uma experiência amarga. Um dos jovens com quem os seus colegas estavam a lidar era o rapaz de 20 anos que atacou dois homossexuais com uma faca em Dresden, no leste da Alemanha, no início de outubro, matando um deles. Os assistentes sociais conheceram-no dois dias antes do ataque, e novamente depois - sem saberem que o jovem tinha qualquer ligação com o assassinato.

Enganar os incrédulos

Em casos como este, Mimoun Berrissoun diz que a "taqiyya", a ocultação da crença religiosa em relação a descrentes, desempenha um papel. Berrissoun, um jovem de raízes marroquinas, fundou a ONG "180° Wende" (Mudança 180°, na tradução livre), em Colónia.

As pessoas que lá trabalham, a maioria das quais são voluntários, têm como objetivo evitar que os jovens entrem para o extremismo e a criminalidade. "Se, por exemplo, há ordens judiciais que obrigam uma pessoa a cumprir certas medidas, mas mentalmente ainda não se desligaram da ideologia, é muito difícil desligá-los daquela cena, daquela ideologia", diz Berrissoun.

Contudo, considerando as centenas de pessoas com quem a RPV tem trabalhado, Thomas Mücke está convencido de que, se tivessem sido deixados à sua sorte, "o potencial daqueles que poderiam cometer ataques seria certamente maior".

Deutschland - Gefängnis
A pandemia de coronavírus cria uma "situação explosiva" nas prisõesFoto: picture alliance/dpa/P. Seeger

"Combinação explosiva"

O número de islamistas conhecidos que representam atualmente uma ameaça à Alemanha ronda os 620. E, segundo uma investigação do jornal alemão Frankfurter Allgemeine Zeitung, há mais de 130 islamistas nas prisões alemãs. O trabalho de desradicalização e prevenção é realizado nas prisões, na sua maioria por organizações como a RPV. Mas a pandemia da Covid-19 está a ter um enorme impacto neste trabalho, diz Jens Borchert, criminologista da Universidade de Ciências Aplicadas de Merseburg. "Muitos programas de desradicalização nas prisões não conseguem arrancar ou funcionar como previsto", reconhece Borchert.

De um modo geral, o criminologista descreve a situação nas prisões alemãs como uma "combinação explosiva" - há menos funcionários disponíveis para trabalhar nas instituições devido ao coronavírus e circula todo o tipo de teorias de conspiração .

Isto foi confirmado à DW por funcionários que trabalham no sistema judicial. Salientam que, apesar de todas as medidas postas em prática nos últimos anos, o perigo de os prisioneiros serem radicalizados enquanto se encontram atrás das grades ainda está bastante presente. Os ataques são assunto de conversa entre os detidos e, mesmo que não tolerem explicitamente a violência quando falam ao pessoal das ONG, alguns consideram que o professor francês decapitado por um extremista islâmico foi parcialmente responsável pelo seu próprio destino.

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Sem redes de comando

O que torna a situação tão perigosa - e tão difícil para os serviços de segurança manterem uma visão geral - é que o terrorismo islamista não precisa de uma organização no sentido clássico, com células secretas e sedes escondidas. Redes "soltas" são suficientes, tal como o potencial das pessoas radicalizadas, que podem ser exploradas através de propaganda ou mesmo através de outros ataques.

O chefe da RPV, Thomas Mücke, cita o recente ataque em Viena como um exemplo. O Estado Islâmico reivindicou a autoria do atentado, mas Mücke observa: "Não existem cadeias de comando claras."

"Em vez disso, há narrativas que são alimentadas nas redes: 'Agora, é preciso agir'. E depois há pessoas que agem - sem que ninguém lhes dê uma ordem para o fazerem", afirma.

Portanto, uma das batalhas é controlar estas mesmas narrativas. É por isso que Mimoun Berrissoun, fundador da Mudança 180°, apela a um forte contra-movimento no seio das comunidades muçulmanas. Berrissoun defende que se elimine o espaço para recrutadores islâmicos - não se deve permitir que "os jovens sejam recrutados secretamente através do WhatsApp ou do Telegram", diz.

"Temos de chegar a estes jovens antes que eles o façam."