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Académicos angolanos negam categoricamente ter "comprado" títulos de doutoramento num esquema supostamente envolvendo Bacelar Gouveia. O académico português é suspeito de ter "vendido" títulos em troca de contrapartidas.
O advogado angolano Carlos Feijó negou esta segunda-feira (28.12) com todas as letras que faz parte da alegada teia de corrupção, no âmbito do processo judicial que investiga o português Jorge Bacelar Gouveia. O académico é suspeito de ter facilitado a atribuição de títulos de doutoramento a alunos de alguns dos países africanos de língua oficial portuguesa (PALOP), em troca de contrapartidas económicas.
O catedrático, um dos mais destacados advogados de Angola, questiona o processo em curso em Portugal e eventual compra de favores envolvendo o seu nome. O professor da Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto esclarece que obteve o seu doutoramento em Portugal, na Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa.
"Defendi a tese no dia 16 de setembro de 2011. Antes, frequentei com colegas portugueses o programa de doutoramento e mestrado em 1997, da Universidade Nova de Lisboa, ao qual fui admitido por um júri”, esclarece à DW África.
O advogado angolano garante que as provas foram públicas e que o júri constituído pelos professores Freitas do Amaral, Marcelo Rebelo de Sousa, João Coupers, Armando Marques Guedes, Gomes Canotiho, José Octávio Serra Van-Dúnem e Bacelar Gouveia.
Três deles arguentes principais: Marcelo Rebelo de Sousa, João Coupers e Armando Marques Guedes. Precisa que em provas públicas do dia 16 de setembro de 2011, o referido júri votou por unanimidade a nota máxima permitida pela lei portuguesa, tendo sido "aprovado com distinção e louvor e unanimidade".
"Quem quiser pôr em causa este meu doutoramento, quem quiser ligar o meu doutoramento ao que decorre em termos de investigação com o professor Bacelar Gouveia terá que perguntar, pelo menos, as pessoas que estão vivas e que fizeram as três arguições principais: professor Armando Marques Guedes, João Coupers e Marcelo Rebelo de Sousa se atribuíram-me nota máxima por influência fraudulenta do professor Bacelar Gouveia”, avisa.
Carlos Feijó diz que a investigação deve tirar as devidas consequências, tendo garantido que fez o seu doutoramento com todas as regras e garantias de imparcialidade em Portugal. Feijó levanta a uma série de questões.
"Estão a dizer que, por exemplo, o professor Marcelo Rebelo de Sousa, que foi arguente principal da minha tese, também foi corrompido? Estão a dizer que o professor João Coupers, que é vice-presidente do Tribunal Constitucional de Portugal e que foi um dos arguentes da minha tese, também foi corrompido? E o professor Marques Guedes também foi arguente, também foi corrompido!? É necessário retirar essas consequências”.
Feijó insiste que o seu doutoramento não foi obtido de forma fraudulenta, em troca de contrapartidas ou diamantes e que nem ajudou estudantes angolanos a obter doutoramentos falsos.
Sublinha que não se enquadra entre os alegados estudantes angolanos e moçambicanos visados. E, precisa, também não se enquadra na situação de que é acusado Bacelar Gouveia de atribuição de doutoramentos recentes efetuados ao abrigo de protocolos de cooperação entre a Universidade Agostinho Neto e a congénere portuguesa.
Uma vez que Freitas do Amaral já faleceu, o catedrático angolano pede para se confirmar junto de Gomes Canotilho e de José Serra Van-Dúnem se o seu doutoramento cumpre ou não as normas de "exigência, rigor e imparcialidade”.
Carlos Feijó confessa não entender esta tentativa de ligação do seu nome à situação que vive Bacelar Gouveia, quando este não foi nem seu professor na licenciatura, nem no programa de mestrado e no doutoramento. E afirma que não é "professor catedrático de aviário".
"Estou a seguir uma carreira académica de longa data. É um investimento que fiz ao longo de todo este período de tempo. Abandonei funções públicas e políticas relevantes para dedicar-me exclusivamente à academia e ao ensino. Há oito anos que, mais uma vez, abandonei qualquer função política e pública, ou melhor qualquer função no Estado para me dedicar à vida académica e privada", esclarece.
Por sua vez, "foi com grande admiração e estupefação" que Eduardo Sambo viu o seu nome citado entre os alunos que terão sido beneficiados no processo que envolve Bacelar Gouveia. O académico angolano esclarece que não fez doutoramento na Universidade Nova de Lisboa.
"Eu não fiz doutoramento nem em Angola nem em Portugal. […] Licenciei-me na Universidade Agostinho Neto. Fiz o meu mestrado na Universidade Clássica de Lisboa, não na Nova. Fiz o meu mestrado na Universidade Clássica de Lisboa em 1997 e fiz o meu doutoramento na Universidade de Havana, em Cuba. Por isso não estou a ver qual é a ligação que eu posso ter com estes assuntos que estão a colocar aí, que gravitam em torno de uma cooperação entre a Universidade Nova de Lisboa e a Universidade Agostinho Neto. Eu gostava de perceber de onde vem o meu nome e porque razão?", diz Sambo.
Eduardo Sambo, professor na Faculdade de Direito da Universidade Agostinho Neto há cerca de 40 anos, diz que conhece Bacelar Gouveia, um académico respeitado em Portugal e Angola e a nível de toda a comunidade de língua portuguesa.
Eduardo Sambo argumenta que "é muito difícil criar situações de fraude neste tipo de circunstância". Assume que ele e Carlos Feijó, citados numa lista de alegados alunos beneficiados com títulos de doutoramento, estão o mais distante possível de qualquer situação de suspeição e de fraude.
A DW perguntou ao académico se acha, à luz das buscas efetuadas pela Polícia Judiciária portuguesa na Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, que a Procuradoria-Geral da República de Angola deve também abrir inquérito para investigar este caso.
"A Procuradoria não vê qualquer angolano que tenha títulos suspeitos. Não. Se não existirem violações de direito, a Procuradoria Geral da República de Angola, penso eu, que tem muito com que se preocupar e naturalmente que não intervém em situações desta natureza", respondeu.
Sambo considera, por outro lado, que se está a por em causa uma cooperação que tem sido "extremamente válida" entre Portugal e Angola, nomeadamente entre a Universidade Nova de Lisboa e a Universidade Agostinho Neto.
As suspeitas de corrupção surgem, no âmbito do processo "Tutti Frutti”, quando a Polícia Judiciária portuguesa intercetou, em 2017, conversas telefónicas entre Bacelar Gouveia e o antigo deputado social-democrata, Sérgio Azevedo, seu aluno na Universidade Nova.