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Assim começou a II Guerra Mundial

Monika Sieradzka (Varsóvia) | cvt
1 de setembro de 2019

As primeiras bombas da Segunda Guerra Mundial caíram a 1 de Setembro de 1939. Antes do bombardeamento de Westerplatte, perto de Danzig, os caças alemães destruíram a cidade polaca de Wieluń.

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Polen, Wieluń
Wieluń após os ataques aéreos de 1939Foto: Muzeum Ziemi Wieluńskiej

"O som da sirene acordou-me do sono profundo. Primeiro, não sabia o que era aquilo. Saltei da cama, vi os meus pais na varanda. A minha mãe disse ao meu pai que provavelmente era uma simulação", conta Jan Tyszler, nascido em 1933, em entrevista à DW.

"O meu pai também pensou o mesmo, mas questionou porque seria tão cedo". As primeiras bombas da II Guerra Mundial caíram, de facto, em Wieluń, na Polónia. 

Polen, Wieluń - Jan und Schwester Maria 1937
Jan Tyszler e a sua irmã, MariaFoto: privat

Ataque inesperado

Jan Tyszler recorda que, no final de agosto de 1939, "a guerra já paraiva no ar". Falava-se constantemente nisso. Mas ninguém imaginava que Wieluń se poderia tornar um alvo da Força Aérea Alemã.

Em 1939, a cidade, que é hoje sede de concelho e fica 200 quilómetros a sudoeste de Varsóvia, estava a pouco mais de 20 quilómetros da fronteira alemã. No entanto, tinha pouca importância estratégica, apesar da proximidade. Não era um centro nevrálgico de transportes, nem havia pontes para defender. Ali só estavam alguns soldados polacos estacionados.

O primeiro crime de guerra

Tyszler ainda se lembra do momento em que percebeu que as sirenes não eram uma simulação: "Quando caíram as primeiras bombas, fugimos para o quintal ao lado, onde o meu pai tinha uma oficina de carros. Sentámo-nos nos sítios onde os carros eram inspecionados. Tremíamos de medo."

Polen, Wieluń
Wieluń após os ataques aéreos alemãesFoto: Muzeum Ziemi Wieluńskiej

"À tarde, éramos os únicos que ainda tinham a sua casa em pé. Todos os outros prédios ficaram em ruínas", recorda.

Nesse dia, ele e a família fugiram da cidade, à semelhança de quase todos os outros sobreviventes. Quando os militares nazis entraram na cidade, restavam poucas centenas de pessoas em Wieluń.

O ataque aéreo perpetrado por 87 aviões bombardeiros foi comandado por Wolfram von Richthofen. Em abril de 1937, ao comando da Legião Condor, von Richthofen fora co-responsável pela destruição da cidade basca de Guernica, onde milhares de civis perderam a vida.

Von Richthofen implementou em Wieluń a tática de guerra usada em Guernica, o chamado "bombardeamento de saturação", em que o objetivo é destruir o alvo por completo, sem ter em conta as baixas civis.

Polen, Wehrmachtssoldaten in Wieluń
Soldados alemães em WieluńFoto: Muzeum Ziemi Wieluńskiej

O ataque não implicava muitos riscos para von Richthofen, que não esperava resistência por parte da pequena cidade onde estavam tão poucos militares estacionados.

Wieluń foi o primeiro crime de guerra da II Guerra Mundial. Após vários bombardeamentos, entre as 04:35 e as 14 horas, 70% da cidade ficou destruída. 1.200 dos 16 mil habitantes perderam a vida.

Provocações antes da guerra

O ataque à Polónia foi precedido de várias invenções da máquina de propaganda nazi destinadas a provocar uma guerra. Uma das mais conhecidas foi o chamado "incidente de Gleiwitz", um alegado ataque à estação de rádio alemã "Sender Gleiwitz", na cidade com o mesmo nome, perto da fronteira polaca.

Na tarde de 31 de agosto de 1939, um grupo de homens armados da organização paramilitar SS, disfarçados de civis, tomou a estação de rádio de assalto para transmitir um apelo à revolta dos polacos que viviam no Terceiro Reich.

Outros meios de comunicação alemães noticiaram a suposta existência de rebeldes polacos em solo alemão, que estariam a receber apoio do Exército da Polónia. O regime de Adolf Hitler tentou retratar os alemães como vítimas para depois mobilizar os seus soldados.

Zweiter Weltkrieg deutsche Soldaten auf der Westerplatte bei Danzig
Soldados alemães em WesterplatteFoto: picture-alliance/Imagno/Votava

O ataque a Westerplatte

Dez minutos depois do ataque aéreo em Wieluń seguiu-se o ataque à península de Westerplatte, perto da cidade de Danzig.

Danzig (Gdańsk), habitada sobretudo por alemães, foi declarada depois da I Guerra Mundial como "Cidade Livre", no Tratado de Versalhes, e estava fora do controlo do Terceiro Reich. O porto, as alfândegas e os caminhos-de-ferro de Danzig estavam sob administração polaca e a Polónia estacionou militares e um depósito de munições na estância balneária de Westerplatte.

Museum of the Second World War Archivfotos Kriegsbeginn
O navio de guerra alemão "Schleswig Holstein"Foto: Museum of the Second World War

A 1 de setembro de 1939, dez minutos depois do ataque em Wieluń, os alemães atacaram o depósito de munições a partir do navio de guerra "Schleswig Holstein". Seguiram-se ataques da "SS-Heimwehr Danzig", a unidade das SS em Danzig, e ataques aéreos. A investida durou uma semana.

Enquanto o número de vítimas no lado alemão é estimado em 3.400, houve apenas 15 polacos mortos em combate.

Na Polónia, a defesa de Westerplatte é tida como símbolo do heroísmo polaco na II Guerra Mundial, tendo em conta a superioridade militar esmagadora do adversário. Há décadas que os alunos polacos aprendem na escola que houve oficiais alemães que saudaram os soldados polacos que tiveram de abandonar Westerplatte após a capitulação, em sinal de respeito pela sua luta corajosa.

Gedenkfeier zum 70. Jahrestag des Beginns des Zweiten Weltkrieges in Polen Flash Format
Cerimónia em memória dos 70 anos do início da II Guerra Mundial, em Westerplatte, em 2009Foto: AP

Lembrar Wieluń

Os ataques a Danzig e a Westerplatte são considerados simbolicamente como o início da Segunda Guerra. Em 2009, o Presidente russo Vladimir Putin e a chanceler alemã Angela Merkel foram até Gdańsk para assinalar o 70º aniversário do início do conflito.

O então Presidente polaco, Lech Kaczynski, que pouco antes havia protestado veementemente contra a invasão russa da Geórgia, aproveitou a oportunidade para alertar para o renascimento de "tendências neo-imperialistas" na presença do convidado russo.

Este ano, em vez de se deslocarem a Gdańsk, o Presidente e o Governo polacos foram até Wieluń na manhã deste 1 de setembro. Outra estreia é a presença do Presidente alemão na cerimónia.

A mudança do local é mais uma questão política do que histórica: Gdańsk é um dos últimos bastiões da oposição na Polónia. E, se decorressem lá, as cerimónias seriam fortemente influenciadas pelos opositores do partido polaco de direita Lei e Justiça (PiS, na sigla em polaco).

Westerplatte é uma questão que gera controvérsia entre o PiS e a maioria liberal do governo local, porque o PiS quer integrar o local histórico no Museu da Segunda Guerra Mundial de Gdańsk e, com isso, fomentar a sua campanha para elevar o sentimento nacionalista no país.

O fim da Primeira Guerra Mundial em imagens

"É certamente mais fácil falar sobre a cerimónia em memória da II Guerra Mundial com alguém que se mostra favorável às lideranças políticas na Polónia do que falar com pessoas menos cooperantes", afirmou o porta-voz do Presidente Błażej Spychalski no início do ano, quando foi tomada a decisão de transferir a cerimónia para Wieluń.

O Presidente referia-se ao clima político em Gdańsk, uma cidade que ainda está em choque depois do assassinato do autarca liberal Paweł Adamowicz, no início de 2019.

Uma vez que o 80º aniversário da eclosão da guerra coincide com a campanha eleitoral para as legislativas de outubro, o PiS não quer perder o controlo sobre o desenrolar das celebrações.

Depois de visitarem Wieluń, os políticos foram até Varsóvia para se juntarem a representantes de mais de 30 países e darem um novo tom ao evento. Desta vez, para mostrar como as relações transatlânticas são importantes para a Polónia. O Presidente dos EUA, Donald Trump, cancelou a participação no evento de última hora, devido ao furacão Dorian.

Jan mit dem alten Familienfoto heute in Warschau
Jan TyszlerFoto: DW/M. Sieradzka

Sirenes voltam a soar

Todos os anos, ao amanhecer de 1 de setembro, os habitantes de Wieluń são acordados com sirenes que lembram o ataque aéreo de há 80 anos.

Jan Tyszler, que na altura tinha seis anos e teve de fugir das bombas em vez de ir à escola, costuma participar. Este ano não será exceção. A casa em que viveu ainda está de pé; foi um dos poucos edifícios da cidade poupado pelas bombas.

"Quero que ouçamos sempre estas sirenes simbólicas para nunca mais ter que ouvir as sirenes reais", diz Tyszler, hoje com 86 anos. Para Tyszler, a visita do Presidente alemão Frank-Walter Steinmeier a Wieluń é um gesto esperado há muito.