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Acordos de pesca de atum entre União Europeia e países insulares africanos são alvo de críticas

1 de novembro de 2011

Portugal, Espanha e França beneficiam-se de acordos para explorar a pesca nos mares de Cabo Verde e São Tomé e Príncipe. Na opinião de ambientalistas e armadores, esses convênios por vezes prejudicam os países africanos.

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Países africanos têm dificuldade para fiscalizar pescadores europeusFoto: WWF Jorge Bartolome

A partir desta terça-feira (01/11), entra em vigor um novo acordo de pesca de atum entre Cabo Verde e a União Europeia. Com a duração de três anos, o convênio autoriza 11 atuneiros com canas, 28 atuneiros cercadores e 35 palangreiros de superfície originários de Portugal, França e Espanha a pescarem em águas cabo-verdianas. Em contrapartida, a União Europeia pagará a Cabo Verde 435 mil euros pelas 5 mil toneladas de pescado que os navios europeus estão autorizados a capturar por ano.

O acordo com a União Europeia permite pescar apenas atum, mas nem todos respeitam as regras, o que leva a duras críticas por parte de ambientalistas e armadores. "Fui com uma equipe de televisão até o cais para ver qual é o pescado que eles desembarcam e é puramente tubarão. Vimos um barco descarregar 40 toneladas de pescado. Perguntamos quantas toneladas de atum? Nenhuma. Só tubarão e espadarte", denuncia José Melo, presidente da Associação Biosfera, instituição que trabalha na proteção das espécies marinhas em águas cabo-verdianas.

Fiscalização frágil

Ele diz ainda que, por falta de fiscalização, a licença concedida a um barco europeu é usada por vários pescadores. "Eu mesmo conheço um desses barcos em que o dono tem mais dois irmãos com um barco cada e há anos os três pescam com a mesma licença", acusa Melo.

Para o presidente da Associação Nacional dos Armadores de Pesca, Nelson Atanásio Santos, o acordo com a União Europeia revela as fragilidades do sector pesqueiro cabo-verdiano. "Nós não temos como saber o que eles pescam ou deixam de pescar. Para isso teríamos que ter observadores a bordo e não temos capacidade para isso. Vamos ficar à mercê daquilo que eles capturam, e normalmente eles dizem que capturam muito pouco. Mas se capturam pouco, por que querem mais barcos?", questiona Santos.

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Acordo permite pesca exclusivamente de atumFoto: picture-alliance/dpa

O ministro da Economia Marítima, José Maria Veiga, garantiu que o aumento do número de navios pesqueiros europeus nos mares de Cabo Verde não significa aumento na quantidade de peixes capturados, o que poderia levar ao esgotamento dos recursos marinhos do país. O ministro admitiu, entretanto, que a fiscalização representa uma fragilidade para Cabo Verde.

Exemplo na vizinhança

São Tomé e Príncipe renovou por mais três anos o acordo de pesca que também mantém com a União Europeia. Os são-tomenses também têm problemas em assegurar que os europeus pesquem apenas atum por isso reforçaram a fiscalização.

"Os armadores europeus por vezes enviam relatórios informando que a pesca é nula, mas estão sempre a solicitar licenças. Isso logo traduz que os dados para nós não parecem ser um dado fiável", diz o diretor da Pesca, João Pessoa Lima. "Por isso iniciamos uma formação de agentes que denominamos observadores a bordo. Eles têm como função ver as artes que a embarcação está a utilizar, se está dentro das normas, e também coletar dados sobre a captura", completa Lima.

O acordo estipula que, durante três anos, barcos de bandeiras europeias poderão pescar até 7 mil toneladas de atum. A compensação financeira da Europa é de aproximadamente 600 mil euros por ano.

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Convênio com a UE não deve prejudicar pesca artesanalFoto: DW

De acordo com a diplomata da União Europeia Cristina Barreiro, a atividade das embarcações europeias não afeta o trabalho dos pescadores locais. "O acordo não interfere na pesca artesanal, e isso é importante. É um acordo exclusivamente para o atum, que se pesca em águas profundas e com barcos grandes."

Cooperação para o desenvolvimento

Barreiro destaca que o convênio para pesca não pode ser visto apenas como comercial, mas como um acordo de cooperação, em que a contrapartida paga pela União Europeia precisa ser investida no desenvolvimento do setor pesqueiro em São Tomé e Príncipe. "Dentro do próprio protocolo está estabelecido que uma parte vai para o orçamento do Estado e outra parte tem que ser utilizada pelo governo para o desenvolvimento do setor da pesca", diz.

Segundo o diretor da Pesca, cerca de 200 mil euros por ano devem ser investidos no setor pesqueiro. O dinheiro será utilizado para comprar equipamentos, melhorar a segurança para os pescadores, ampliar a infra-estrutura terrestre e o sistema de distribuição de pescados. "Há falta de equipamentos, não temos câmara de conservação de peixe, não temos fábrica de gelo próprio para o pescado. Então este valor servirá para equipar essas infra-estruturas. No sistema de distribuição, vimos que o nosso pescado mantém-se muito na zona costeira, e no interior o pescado não chega. Com esse centro de distribuição com transporte isotérmico, poderemos levar o pescado para essas zonas", detalha João Pessoa Lima.

Autores: Nélio dos Santos (Cidade da Praia) / Juvenal Rodrigues (São Tomé)
Edição: Francis França / Marcio Pessôa