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A arte está a mudar a imagem dos bairros sociais de Lisboa

João Carlos (Lisboa)6 de maio de 2015

A Quinta do Mocho, nos arredores de Lisboa, tornou-se numa galeria de arte a céu aberto para ajudar a combater o estigma e a imagem negativa associados aos bairros problemáticos.

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Foto: DW/J. Carlos

O projeto “O Bairro i o Mundo”, inserido no programa de reabilitação urbanística da Câmara Municipal de Loures, permitiu a vários artistas nacionais e estrangeiros pintarem as fachadas dos prédios da Quinta do Mocho, em Loures, com motivos que orgulham a população local, constituída na sua maioria por imigrantes oriundos dos países africanos de língua portuguesa. Trata-se de uma autêntica galeria de arte, também aberta a visitas turísticas uma vez por mês.

A Casa da Cultura da Quinta do Mocho é o ponto de encontro com os responsáveis da Câmara Municipal de Loures e com dois dos artistas envolvidos no projeto que tem mudado a aparência deste bairro social. Quem percorre a urbanização pode agora ver algumas fachadas de prédios pintadas com autênticas obras de arte, todas elas com uma forte mensagem social.

Smile, nome artístico de Ivo Santos, é um dos jovens autores destes painéis e explica que os artistas tentam passar sempre uma mensagem pessoal: “A minha obra é uma menina que está a vestir a pele de uma girafa. É uma sentinela, está sempre em alerta, porque a girafa é o animal que dorme menos no reino animal e está sempre atenta a tudo o que se passa. No fundo, acho que este bairro é um pouco isso, pois tem várias faixas etárias e há sempre um movimento ao longo de todo o dia. Parece que o bairro não dorme”.

Urbane Kunst in Lissabon O Bairro i o Mundo
A obra de Smile demorou 4 dias a ser feita.Foto: DW/J. Carlos

Este painel levou quatro dias a ser pintado. O jovem produtor de graffiti está a terminar outro mural em conjunto com um colega. Bordal Segundo, que também ocupou uma das fachadas com a sua instalação, feita em duas semanas, optou por um tema ligado à preservação do ambiente.

“Esta peça faz parte da minha série de trabalhos à qual chamo “Big trash animals”. Crio imagens da natureza, neste caso de animais, construídos com lixo, com desperdícios, com toda essa poluição fruto dos atos da humanidade, do consumismo, do capitalismo e da falta de consciência social”, explica o artista.

As pinturas retratam figuras carismáticas como o guineense Amílcar Cabral, entre outros motivos, e ornamentam mais de duas dezenas de prédios. O programa da autarquia local está a contribuir para uma nova dinâmica e visão do bairro, impulsionado pelo Festival “O Bairro i o Mundo”.

Urbane Kunst in Lissabon O Bairro i o Mundo
Bordalo Segundo é o criador da obra "Big trash animals"Foto: DW/J. Carlos

Esta tem sido uma importante forma de valorização urbanística da Quinta do Mocho, e conta muito com o envolvimento das populações, afirma Maria Eugénia, vereadora da Educação, da Coesão Social e dos Recursos Humanos: “Neste momento podemos dizer que a Quinta do Mocho é a maior galeria de arte urbana pública na zona de Lisboa, e a iniciativa fez com que de fato as pessoas do bairro se sentissem valorizadas e percebessem que podem contribuir para a solução dos seus problemas.”

"A arte mudou a forma como as pessoas vêem o bairro"

No início, a população acolheu a ideia com alguma desconfiança mas o assunto foi sendo discutido ao longo de várias assembleias comunitárias e os moradores acabaram por se envolver de forma ativa no projeto.

Esta nova forma de abordar o bairro agrada ao angolano Dilson Nunes, um dos moradores da Quinta do Mocho: “A arte urbana mudou a maneira de as pessoas verem o bairro. Estas pinturas fizeram com que as pessoas percebessem que devemos ser mais unidos e trabalhar na imagem positiva que o bairro tem que ter.”

O são-tomense Kedy Santos, outro residente da Quinta do Mocho, também apoia o projeto: “Esta iniciativa aumentou muito a autoestima do bairro graças às cores e às imagens de figuras causadoras de transformação social, de figuras que as pessoas identificam, como Bob Marley ou Amílcar Cabral. A nível arquitetónico e a nível paisagístico dão uma dimensão muito ampla ao bairro”.

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No último sábado de cada mês os jovens moradores fazem visitas guiadas aos interessados, que contam também com a participação de alguns dos artistas.

Mas ainda há mais paredes para pintar. Para isso há já uma lista de cerca de 30 artistas, nacionais e estrangeiros, que se inscreveram para também deixarem a sua marca.

O projeto “O Bairro i o Mundo”, iniciado em 2013 na freguesia da Apelação, em Loures, tem gradualmente ajudado a mudar a imagem externa (por vezes distorcida) das urbanizações sociais da zona de Lisboa.

Urbane Kunst in Lissabon O Bairro i o Mundo
Figuras conhecidas, como Bob Marley, estão entre as imagens retratatas pelos artistas.Foto: DW/J. Carlos