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Opinião: Vitória da Ucrânia dá tom político a festival

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Rick Fulker
15 de maio de 2016

Canção vencedora do Festival Eurovisão 2016 lembra expulsão de tártaros da Crimeia durante o regime de Stalin. Para jornalista Rick Fulcker, composição se destacou por ser única relacionada a uma situação histórica.

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Rick Fulker é jornalista especializado em música da DW
Rick Fulker é jornalista especializado em música da DW

Cada vez maior, com tecnologia cada vez mais sofisticada e um crescente número de telespectadores: o Festival Eurovisão da Canção (FEC) coleciona superlativos. Mas ele é estritamente apolítico?

Interessante nesse contexto é a Rússia. Uma declaração notável proferida há alguns anos pelo ministro russo da Cultura permanece na memória: "A Rússia não é a Europa". Segundo o ministro, o país é exclusivamente eurasiano.

No entanto, a Rússia investiu imensos recursos no festival de música europeu deste ano, acoplando uma canção escrita por um sueco a um dos cantores mais famosos do país e a uma tecnologia de palco sem precedentes. Eles [os russos] não fizeram isso com a intenção de perder – ou de virar as costas para a Europa.

Em vez disso, a Ucrânia ganhou, com uma canção que havia chamado atenção na preparação para o evento. A delegação russa na União Europeia de Radiofusão chegou até mesmo a tentar desqualificar a música da competição por violar ostensivamente a proibição de conteúdo político no concurso. Não, foi a resposta dos organizadores, a canção é formulada para condenar a guerra e a perseguição em geral.

Os verdadeiros vencedores? Em primeiro lugar, Jamala, uma cantora que pertence à etnia dos tártaros da Crimeia – região ocupada pela Rússia dois anos atrás, naquilo que tem sido chamado de uma nova Guerra Fria. A ucraniana explicou que sua avó havia lhe falado sobre uma história familiar de sofrimento e perseguição, a que ela, então, se referiu em sua canção.

O segundo vencedor da noite foi o próprio Festival Eurovisão. A canção vencedora, 1944, se destacou das demais por ser a única relacionada a uma situação histórica. Em vez de clichês sobre a paz, o apelo pacifista da composição foi apresentado no contexto histórico de lamento e protesto.

No todo, porém, a competição poderia se beneficiar de maior diversidade. Os destaques deste ano foram os roqueiros do grupo Young Georgian Lolitaz, da Geórgia; os acordes de música country da Holanda interpretados por Douwe Bob; uma deliciosa chanson da Áustria cantada em francês por ZOË; e a canção de amor simples e agridoce interpetrada por Frans para a Suécia.

Num momento em que a Europa enfrenta a sua maior crise em décadas, o concurso foi realizado no país-modelo europeu Suécia. "Mais uma vez, a Europa está enfrentado tempos mais obscuros", afirmou a apresentadora da competição, Petra Mede.

O diretor de mídia da União Europeia de Radiofusão, Jean Philip De Tender, afirmou à DW que o Festival Eurovisão é um evento expressamente apolítico. A exibição da bandeira da região disputada de Nagorno-Karabakh durante uma das semifinais, por exemplo, foi vista como uma provocação política e quase resultou na expulsão de uma delegação. Declarações expressamente políticas são um tabu no concurso.

Mas o que é político? Após sua vitória impressionante, Jamala disse em entrevista coletiva desejar uma situação na qual sua canção 1944 não precisasse sequer existir. Ela apresentou uma história que será analisada e examinada por seu conteúdo. É claro que isso não é ruim. Nem a discussão mais generalizada sobre onde termina a arte e começa o ativismo político.

Será que a canção de Jamala vai unir ou dividir ainda mais a Europa? Isso deverá ser visto nos próximos meses – e no Festival Eurovisão da Canção 2017, realizado na Ucrânia.