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O papel de Renan Calheiros no impeachment de Dilma

Jean-Philip Struck19 de abril de 2016

Senador que ainda é considerado aliado do Planalto sofre pressão para acelerar processo. Analistas afirmam que ele não quer holofotes como Cunha e deve tentar não se indispor tanto com o governo quanto com a oposição.

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Renan Calheiros
Foto: Getty Images/AFP/A. Anholete

Após a aprovação do processo de impeachment pelo plenário da Câmara no último domingo (17/04), o papel desempenhado pela Casa comandada pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) se encerrou. Agora a batalha vai ser travada no Senado, que é chefiado por Renan Calheiros (PMDB-AL), figura mais enigmática do que o agressivo Cunha.

Nos últimos meses, enquanto o deputado incendiava a Câmara contra a presidente Dilma Rousseff, Renan assegurou que o clima de tensão não contaminasse o Senado, reforçando uma imagem de conciliador e de bastião da governabilidade.

O senador também não tomou parte em movimentos bruscos de ruptura, como o desembarque do PMDB da base aliada articulado pelo vice-presidente Michel Temer, desafeto e rival de Renan em disputas pelo comando da sigla – nos bastidores.

Membros do governo não escondem que contam com Renan para que o andamento do processo no Senado estique ao máximo os prazos dos trâmites, permitindo que o Planalto consiga mais tempo para recompor sua base de senadores. Como o Senado tem cláusulas ambíguas sobre o limite de tempo, cabe ao presidente da Casa definir o ritmo dos trabalhos.

No momento, levantamentos mostram que Dilma está em apuros entre os senadores. Ao menos 48 declararam que vão referendar o parecer da Câmara. Se 41 aprovarem, Dilma será afastada por até 180 dias, e terá início o seu julgamento por crime de responsabilidade.

O processo já vem seguindo um ritmo diferente do observado no contra o ex-presidente Fernando Collor, em 1992. Naquela ocasião, o Senado votou o parecer da Câmara dois dias depois do recebimento. Já a ação contra Dilma deve ser referendada ou não pelo Plenário da Câmara apenas em meados de maio, semanas depois da votação na Câmara.

Dilma recebe manifestação de apoio

Oficialmente, Renan vem evitando atender a pedidos para esticar ou acelerar os trabalhos. Peemedebistas ligados a Temer, como o senador Romero Jucá (PMDB-RR), tentam pressionar por um andamento mais rápido. Mas será que diante das dificuldades crescentes do governo, Renan vai continuar alinhado com o governo?

Cautela nas próximas semanas

Para o cientista político Rafael Moreira, que estuda a dinâmica do PMDB em sua tese de doutorado, o senador o deve agir com cautela nas próximas semanas: não deve abraçar a oposição, mas também não vai perder tempo se desgastando em grandes tentativas de salvar o governo.

Na prática, isso beneficia mais o governo, que se vê livre de um novo Cunha chefiando os trabalhos, mas também permite que, mais tarde, Renan possa se reacomodar com o restante do PMDB caso Dilma caia.

"O grupo da ruptura de Cunha e Temer é o ponto fora da curva nessa história toda. O PMDB sempre procurou se acomodar com outras forças políticas, e não buscar a briga. Renan deve se comportar de maneira menos emotiva, ainda próxima do governo, mas tentando não se indispor com as alas que querem derrubar a presidente. Nesse sentido, ele está encarnando o espírito característico do PMDB", afirma Moreira. "Ele não quer holofotes como Cunha recebeu."

Já o cientista político Carlos Pereira, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), afirma que Renan ainda deve trabalhar para beneficiar o governo num primeiro momento, mas a tendência é que no final ele acabe indo para o lado do PMDB conforme Temer se fortalecer.

"É difícil saber o que Renan está pensando. Ele é um político que sempre está observando tudo e mandando sinais que parecem contraditórios. Ele assumiu muitos compromissos com o governo, então, deve honrá-los por enquanto. Ele pode mostrar que tentou atrasar a votação. Mas não deve passar disso. É do seu próprio interesse que ele se afaste de Dilma depois. Ele vai sofrer muita pressão até lá", afirma.

O passo a passo do impeachment

No ano passado, Renan chegou a ensaiar confrontos com o Planalto, conforme vazamentos da Lava Jato revelavam suspeitas de que ele se envolveu nos desvios da Petrobras. À época, os líderes da Câmara e do Senado acusaram o governo de permitir os vazamentos. Tal como Cunha, Renan chegou a bloquear votações de projetos, mas logo voltou a atuar em harmonia com o governo, enquanto o presidente da Câmara seguia em sua trajetória de terra arrasada.

Lava Jato

Mesmo implicado na Lava Jato, Renan não foi tão afetado pelo escândalo, assim como Cunha, apesar de enfrentar sete inquéritos no Supremo. Tentando manter o senador em sua órbita, Dilma e o PT têm evitado reciclar o discurso usado contra Cunha, que consistia em acusá-lo de falta legitimidade para conduzir o processo por causa do seu envolvimento em propinas da Petrobras.

Mas essa posição mais confortável pode ser colocada à prova nos próximos dias. A imprevisibilidade da Lava Jato continua desempenhando seu papel. Nesta segunda-feira, enquanto Renan recebia os documentos do impeachment dos deputados, o juiz Sérgio Moro colhia um novo depoimento de Nestor Cerveró, ex-diretor da área internacional da Petrobras, que se tornou um dos principais delatores do esquema.

Cerveró afirmou mais uma vez que Renan recebeu propina de 6 milhões de dólares referente a um contrato de afretamento de um navio-sonda da Petrobras. O pagamento teria sido realizado em 2006.

Até o momento, o "fora Renan" foi mais ouvido nos protestos a favor da saída de Dilma. Com o processo agora no Senado, vários desses movimentos planejam redobrar a pressão sobre o senador. O Movimento Brasil Livre (MBL) afirma que pretende usar contra Renan as mesmas táticas aplicadas contra deputados indecisos, que incluíram outdoors com ataques, avalanches de mensagens e envios de correntes na internet. Já nesta terça-feira havia um carro de som em frente à casa do senador em Brasília para pedir que ele acelere os trabalhos.