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Como os guardas da Alemanha Oriental viam o Muro de Berlim

Gero Schliess (tam)6 de junho de 2016

Concreto, separação e morte vêm à mente quando se pensa no Muro de Berlim. Mas uma exposição apresenta a fronteira entre os dois Estados alemães sob uma perspectiva diferente: a dos encarregados de vigiá-lo e defendê-lo.

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Tipos de torres de vigilância ao longo do Muro de Berlim
Havia vários tipos de torres de vigilância ao longo do Muro de BerlimFoto: Arwed Messmer

Será que ainda falta contar alguma história sobre o Muro de Berlim? Com quatro museus sobre a barreira física separando as duas Alemanhas e suas duas visões de mundo – o mais recente inaugurado em abril – e inúmeras exposições, os berlinenses se perguntam se ainda há o que descobrir. Para a escritora Annett Gröschner, a resposta é, obviamente, "sim".

A curadora da mostra "Inventário do poder", em cartaz no Centro Cultural Kleisthaus, em Berlim, promete revelar uma perspectiva nova do famoso e infame Muro, com base em arquivos da polícia de fronteira da antiga Alemanha Oriental, pesquisados por ela e o fotógrafo Arwed Messmer.

"O que ficou gravado na memória coletiva foi o concreto visto por quem olhava do lado ocidental", lembra Gröschner. Em contrapartida, ela adotou uma perspectiva inédita, enfatizando a visão contrária, do Leste sobre o Oeste, revelada por mais de mil fotografias tiradas entre 1965 e 1966 por guardas de fronteira da ex-República Democrática Alemã (RDA).

"Ninguém mais poderia ter tirado essas fotos. Era absolutamente proibido fotografar do lado leste do Muro, portanto só o pessoal de fronteira poderia fazê-lo", contou a curadora à DW, na abertura da exibição. O objetivo das fotografias era documentar o estado do Muro antes de diversas alterações estruturais que estavam planejadas.

Arame farpado e madeira em vez de concreto

Annett Gröschner encontrou as fotos nunca divulgadas antes num arquivo militar da cidade de Freiburg, no sudoeste do país. Uma constatação surpreendente é como o Muro da década de 1960 era diferente da imagem que se tem dele atualmente.

East Side Gallery em Berlim
Comentários de artistas na East Side Gallery marcam atual imagem colorida do MuroFoto: picture-alliance/dpa/W. Steinberg

"Todos temos a imagem da muralha de concreto na cabeça, mas isso só procede para as décadas de 70 e 80", lembra a curadora. A enorme parede só foi erguida em 1975. Antes, a fronteira era bloqueada por cercas de arame farpado, barricadas de madeira e torres de vigilância.

"O Muro era muito mais aberto à comunicação na época, pois ainda não havia a muralha de concreto de quatro metros de altura, mas sim cercas", relata a pesquisadora. E através de cercas é possível se falar.

Por sua vez, os guardas de fronteira ia anotando atentamente tudo que era dito de um lado a outro. "Ei, vem para cá. A gente tem mulheres lindas esperando por você aqui", era uma das mensagens – antes que o tom mudasse repentinamente: "Nós vamos te pegar de qualquer jeito."

Mais aberto, mais perigoso

Por ser mais aberta, a fronteira também oferecia mais perigos. "Muitos acharam que seria fácil fugir. Mas não era o caso", lembra a escritora, que cresceu no lado oriental do Muro, no atual bairro berlinense de Prenzlauer Berg.

Guardas de fronteira de Berlim Oriental
Guardas eram orientados a atirar em quem tentasse fugir.Foto: DW/G.Schließ

A mostra lembra, acima de tudo, que o Muro não era feito apenas de cercas e concreto, mas também de seres humanos. Na seção "Louvor e crítica", os visitantes têm a chance de ler dossiês pessoais dos guardas da fronteira, com elogios a quem é "um modelo de ordem e disciplina", por exemplo, ou manuseia bem as armas.

Entre os objetos expostos constam, ainda, esboços documentando tentativas de fuga, assim como fotografias dos guardas, com os olhos obliterados para proteger sua identidade. Mesmo os cães de guarda, que tinham papel importante na defesa da fronteira, estão representados, tendo seus nomes e condição médica meticulosamente anotados nos documentos.

Esquema de uma tentativa de fuga, registrado pelas autoridades alemãs orientais
Esquema de uma tentativa de fuga, registrado pelas autoridades alemãs orientaisFoto: DW/G.Schließ

Onde ficam as vítimas?

A exposição coroa 25 anos de pesquisa sobre o Muro de Berlim para Gröschner e Messmer. Eles são os primeiros a apresentar uma narrativa oriental, totalmente inédita, dessa barreira também ideológica. No entanto, sente-se a falta de uma terceira perspectiva: a história das vítimas do Muro.

Essa lacuna não é surpreendente, já que muitos morreram, justamente, tentando cruzar a fronteira, e a mostra se baseia nos documentos daqueles que construíram e guardavam a fronteira. Ainda assim, a lacuna é sentida, e deixa um certo gosto amargo na boca do visitante.

A mostra "Inventarisierung der Macht – Die Berliner Mauer aus anderer Sicht" ("Inventário do poder – O Muro de Berlim de outro ponto de vista"), com apoio da Fundação Federal Cultural Alemã, pode ser visitada até 14 de agosto no Centro Cultural Kleisthaus, em Berlim.