1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Um ano após eleição, Dilma luta para reorganizar base

Marina Estarque, de São Paulo5 de outubro de 2015

Reforma ministerial é estratégia da presidente em busca de maior governabilidade, mas, segundo especialistas, chega tarde demais e se baseia em acordo frágil com PMDB.

https://p.dw.com/p/1Giz8
Foto: E. Sa/AFP/Getty Images

Um ano depois do primeiro turno das eleições, realizado no dia 5 de outubro, o governo luta para reorganizar sua base de apoio no Congresso. A reforma ministerial, entretanto, significa um acordo frágil com o PMDB e vem com um ano de atraso, afirmam especialistas ouvidos pela DW Brasil.

Segundo eles, a reforma pode trazer uma maior governabilidade, mas o alívio para Dilma Rousseff (PT) pode durar pouco. Eles concordam que o PMDB pode romper a qualquer momento com o governo, dependendo do andamento dos pedidos de impeachment ou da crise econômica.

“O PMDB é um aliado extremamente ambíguo. Se o partido notar que a economia não vai melhorar e a população continua cada vez mais irritada com o PT, é natural que eles se afastem e lancem sua candidatura para 2018, ou apoiem o impeachment”, diz Roberto Romano, professor de Filosofia Política da Unicamp.

O cientista político David Fleischer, professor emérito da UnB, alerta que o acordo do PMDB com o governo pode ser desfeito ainda neste mês.

“A reforma só vai durar algumas semanas, porque o partido deve decidir romper totalmente com o governo Dilma na convenção nacional. O PMDB impôs uma reforma que não envolvesse seus líderes principais”, afirma Fleischer.

Os especialistas ressaltam também que a medida deveria ter sido tomada logo após o fim das eleições. A critica teria sido feita também pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em reunião com a executiva nacional do PT no final de setembro.

“Lula falou algo muito certo. Esse é o ministério que ela deveria ter feito em novembro do ano passado, para se organizar para o novo governo”, diz Fleischer.

Para o cientista político Valeriano Costa, da Unicamp, esse foi um “erro estratégico” de Dilma, e essa lentidão pode ter um custo alto. Ele acredita que uma reforma no final do ano passado seria um processo normal em uma mudança de governo.

“Está um ano atrasada. Se ela tivesse feito isso antes, seria muito mais simples. Dilma perdeu a base de apoio, porque não fez um governo de coalizão. Muitas pessoas que estavam na coordenação política eram fraquíssimas e não tinham representatividade nem dentro do PT. Como o governo atingiu um grau inédito de impopularidade e de incapacidade de convencimento, eu não sei se não é tarde demais”, afirma.

O resultado acirrado do pleito, segundo especialistas, seria um motivo a mais para investir em uma reforma ministerial rápida, para garantir a governabilidade.

“A única solução seria não bater de frente com Cunha e negociar a eleição dele, impedindo que ele se tornasse um elo central da oposição. Além disso, era evidente que tinha que aumentar o espaço do PMDB no governo”, diz Costa.

A escolha em apoiar Arlindo Chinaglia (PT-SP) para chefiar a Câmara é considerada um dos principais fatores de enfraquecimento do governo.

“O governo fez uma aposta alta em um candidato do PT e perdeu. Poderia ter negociado uma mesa de agrado tanto do PMDB, quanto do PT, e a figura selecionada poderia ser menos proativa e menos autoritária, como tem se revelado o Eduardo Cunha”, diz Bruno Speck, professor de Ciência Política da USP.

Apesar disso, segundo Speck, Dilma conseguiu formar uma maioria e aprovar projetos no Congresso, apenas de forma menos eficiente do que os governos anteriores.

“A normalidade no Brasil é que o governo precisa de uma enorme criatividade para partilhar o poder e distribuir ministérios, em função desse sistema partidário muito fragmentado, em que o maior partido não tem um quinto dos deputados. Isso talvez tenha ficado esquecido pelo sucesso de FHC e Lula em forjar essas maiorias”, diz Speck.

Brasilien Wahl 25.10.2014
Propaganda de Dilma nas eleições: um ano depois, polarização ainda está presente no paísFoto: picture-alliance/landov/Xinhua/Xu Zijian

Manifestações

As manifestações contra o governo que marcaram o período pós-eleitoral perderam fôlego, mas, segundo especialistas, podem ressurgir com alguma descoberta nova da Lava Jato ou com o avanço dos pedidos de impeachment.

“São novas formas organizacionais, mobilizações pela internet, e essas tipicamente têm menos força de manter a chama do protesto acesa por mais tempo. Elas vão e voltam ao sabor de alguns líderes”, afirma Speck.

Para Romano, os protestos perderam força porque houve uma radicalização das pautas, o que teria afastado muitos manifestantes.

“Começou a ficar mais claro que os grupos de direita queriam o impeachment a todo custo, inclusive se aproximando de uma linguagem perigosa para um país que teve uma ditadura recente. E aquela massa que estava protestando por melhores serviços públicos e contra a corrupção se afastou”, afirma Romano.

Costa também concorda que a insatisfação popular não necessariamente significa um consenso em retirar a presidente.

“As manifestações diminuíram, porque para esse processo dar certo, tem que ser uma bola de neve, como foi com Collor. Tem que crescer em um ritmo avassalador, para que o Congresso se sinta legitimado para pedir o afastamento. Hoje a sociedade tem uma posição fortemente contrária ao governo, mas existe uma divisão sobre o impeachment”, diz.

Costa acredita, entretanto, que a polarização política que marcou as acirradas eleições de 2014 permanece latente na sociedade e pode despontar em novos protestos. “Um ódio equivalente, com a mobilização de grupos um contra o outro, só vimos nos anos 60, antes do golpe.”

Além de protestos antipetistas, Costa afirma que um impeachment poderia desencadear manifestações pró-governo.

“Uma boa parte do eleitorado de Dilma, que está quieto, porque avalia negativamente o governo, se manifestaria. A CUT, o MST e dezenas de organizações, que estão na sombra, criticando o governo, sairiam para as ruas com força contra a derrubada de Dilma”, afirma Costa.