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UE busca ajuda turca para conter fluxo de refugiados

Dalia Mortada, de Istambul (rc)7 de março de 2016

Líderes da UE e de Ancara iniciam discussões sobre pacote para ajudar governo turco a lidar com a crise migratória e diminuir a chegada de migrantes à Europa. Há, porém, mais em jogo do que recursos financeiros.

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Demonstration Griechenland Türkei Grenze
Foto: Reuters/A. Avramidis

Os líderes da União Europeia (UE) recebem nesta segunda-feira (07/03) o primeiro-ministro da Turquia, Ahmet Davutoglu, em Bruxelas, em mais um esforço do bloco para implementar um pacote de ajuda a Ancara que possa conter o fluxo de refugiados à Europa.

Num acordo que a organização humanitária Human Rights Watch considerou "uma resposta política falha e potencialmente perigosa" ao fluxo migratório, a UE prometeu em novembro enviar à Turquia 3 bilhões de euros para viabilizar os esforços para manter refugiados e migrantes no país.

Ancara havia se comprometido a realocar as verbas de forma a evitar que os refugiados tentassem chegar à Europa por meios ilegais, além de incentivar sua permanência em solo turco. As condições, porém, ainda são incertas.

Apesar de os refugiados sírios registrados no país terem direito a serviços de saúde e educação, apenas a metade das crianças sírias terem acesso às escolas turcas. O governo promete aumentar a integração em seu sistema escolar.

Até pouco atrás, os refugiados na Turquia não tinham direito de trabalhar no país. Há poucas semanas, porém, o governo aprovou novas condições para que os sírios possam obter permissões legais de trabalho, ainda que sob determinadas circunstâncias.

Zeynep Alemdar, professora de Ciência Política e Relações Internacionais da Universidade Okan, em Istambul, observa que as regulamentações para o trabalho dos refugiados são demasiadamente rígidas. Apenas 3% deles conseguem trabalhar, e a oferta de empregos ainda é limitada.

Impasse atrasa envio das verbas

Mas, mesmo que alguns termos do acordo com a UE ainda sejam obscuros, as autoridades turcas já têm ideia de onde o dinheiro europeu deverá ser empregado.

"[O dinheiro] vai ajudar na infraestrutura – como esgoto, saneamento e água – nas áreas densamente povoadas por sírios como [a cidade fronteiriça] Kilis, onde mais da metade da população é de sírios", afirmou uma autoridade governo turco, sob condição de anonimato.

"A resposta verdadeira é 'zero'" disse, ao ser perguntado sobre a quantia que já teria sido realocada para esses locais. O dinheiro ainda não chegou à Turquia porque o comitê turco-europeu responsável pelo acordo não decidiu sobre como os recursos deverão ser entregues – se devem chegar diretamente à Turquia ou a um intermediário, como o Alto Comissariado da ONU para os Refugiados (Acnur).

Pouco antes da conferência entre os líderes, foi esclarecido que 90 milhões de euros foram liberados para investimentos em educação e ajuda humanitária.

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Crianças refugiadas sírias na Turquia têm pouco acesso às escolasFoto: DW/D. Cupolo

"Para os turcos, o que interessa é a liberação dos vistos", afirma a professora Alemdar, em referência à promessa europeia de permitir que os cidadãos turcos tenham livre acesso à área do acordo de Schengen.

A liberação dos vistos, as negociações para o acesso [à União Europeia], conversações em alto nível sobre energia e unidade aduaneira – tudo isso é parte desse processo, segundo a autoridade turca que não quis se identificar.

O acordo foi bastante criticado por considerar a Turquia como um país seguro para os que fogem de conflitos. "É uma questão de interesse próprio e uma esperança ilusória dizer que a Turquia é um país seguro para asilo – não é, e esse acordo poderá causar mais danos do que ajudar", observa a vice-diretora da Human Rights Watch para a Europa, Judith Sunderland.

Um relatório da organização de direitos humanos aponta que o país "não provê uma proteção eficaz para os refugiados e repele com frequência os requerentes de asilo de volta à Síria", o que seria uma violação da Convenção sobre s Refugiados de 1951.

Mais do que apenas dinheiro

Muitos observadores concordam que a Turquia não se enquadra na definição de "país seguro", em razão de incidentes como ataques a refugiados sírios que lá vivem.

No final do ano passado, o jornalista e cineasta sírio Naji Jerf, conhecido por expor as atrocidades da organização extremista "Estado Islâmico" (EI) na cidade síria de Raqqa, foi assassinado na cidade fronteiriça de Gaziantep. Sua morte ocorreu dois meses após dois ativistas sírios que atuavam contra o EI serem decapitados na cidade turca de Sanliurfa.

Além disso, os que tentam chegar à Europa por outros motivos podem ser deportados. "Há poucos dias, aceitamos 308 pessoas vindas da Grécia", afirmou a autoridade turca. Os que foram devolvidos à Turquia eram, na maioria, oriundos de países do norte da África.

No ano passado, mais de um milhão de refugiados conseguiram chegar à Europa. Em 2016, esse total já é de 130 mil. Os europeus consideram a migração em massa uma crise, mas Alemdar diz que esse termo pode ser exagerado.

Segundo a professora, qualificar como "crise" o fato de que apenas dois em cada mil pessoas na Europa (0,2%) sejam refugiados, enquanto na Turquia, 3,3% da população é de pessoas nessas condições, é uma hipocrisia.

"A UE deve ser mais honesta ao qualificar a situação como uma crise e encontrar melhores meios de lidar com isso, ao invés de jogar dinheiro para a Turquia", afirma.