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Tensão cresce em centro de registro de migrantes em Berlim

Richard A. Fuchs (md)8 de outubro de 2015

Quase 2 mil pessoas esperam há dias para preencher formulários. Longas filas, tumultos e brigas ocorrem diariamente no lugar. Os poucos funcionários só conseguem atender em torno de 100 por dia.

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Foto: DW/R. Fuchs

Há um murmúrio entre a multidão. Em seguida, são ouvidos gritos e sons de confusão. Em poucos segundos, uma briga começa. O clima na área ampla e empoeirada em um pátio interno em Berlim é tenso. É possível ouvir palavras em diversas línguas. E não há sinal algum de polícia. Mas câmeras de TV estão por lá e filmam o momento em que, numa briga, um refugiado agride outro violentamente. Poucos minutos depois, a ambulância vai levar o homem ferido para o hospital. Só então chegam cerca de 30 policiais.

"Uma faísca é o suficiente"

"Infelizmente, isso faz parte agora do dia a dia", lamenta em voz alta o voluntário Michael Ruscheinsky, em direção a alguns jornalistas assustados. Agora ele tem que solicitar enfermeiros à Agência de Saúde e Assuntos Sociais (LaGeSo, na sigla em alemão), órgão da Secretaria Estadual de Saúde berlinense, que é responsável pelo registro de refugiados. Ele dá, assim, apoio à equipe de segurança de 54 homens que mal conseguem impedir que os refugiados – que esperam para ser registrados – saltem sobre uma grade de proteção.

"Já às seis da manhã havia cinco feridos, porque as pessoas têm medo de não serem atendidas, porque têm medo de não receberem seu número para fazer o registro", conta Ruscheinsky.

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Voluntário Michael Ruscheinsky: "As pessoas estão frustradas e desiludidas"Foto: DW/R. Fuchs

Especialmente na frente da multidão de migrantes, rente à grade de proteção, a tensão é visível. Funcionários da segurança gritam de um lado, alguns jovens da Síria, Somália e Afeganistão gritam de volta. Os que estão atrás empurram os que estão na frente, muitos gritam.

"Não podemos chamar isso de coexistência pacífica", comenta Ruscheinsky, acrescentando que o clima piorou nos últimos dias. "Basta uma faísca, para a coisa pegar fogo e começar uma briga. As pessoas estão frustradas, desiludidas. Estão emocionalmente feridas, porque há semanas têm sido empurradas de um lugar a outro."

As grades deveriam servir para ajudar a canalizar o processo de registro. Filas diferentes se destinam a diferentes tipos de registro. Mas em vez disso, cerca de 600 refugiados se amontoam, empurrando uns aos outros. No meio disso tudo, 150 voluntários tentam acalmar a situação em 30 idiomas.

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Brigas são comuns no centro de registro em Berlim, aonde cerca de 500 pessoas chegam diariamenteFoto: DW/R. Fuchs

Mas eles não têm influência na rapidez do processo de registro. Os funcionários conseguem registrar cerca de 100 por dia. E admitem, eles mesmos, que isso não é muito. Atualmente, até 500 novos refugiados chegam todos os dias ao lugar.

Durante o dia, cerca de 1.800 se aglomeram no prédio. Mas não há números oficiais. "Há algumas semanas, a gente ainda estava animada, de bom humor. Mas agora, muitos pensam que não vamos conseguir dar conta da situação", lamenta uma voluntária, que prefere ficar no anonimato.

"Fugir com a família não foi possível"

Enayatuila Sediqi espera poder ficar na Alemanha. O afegão de 26 anos sorri alegremente, apesar de toda a espera. Seu rosto só fica mais sério quando ele fala sobre sua "grande jornada". Ele viajou 40 dias até chegar a Berlim. Ele não era bem quisto pelos talibãs em sua cidade natal, Lugar, porque, como agrônomo, colaborava para o governo do país, o qual é apoiado pelo Ocidente.

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Jovem afegão Enayatuila Sediqi espera poder buscar a família em breve na terra natalFoto: DW/R. Fuchs

Ele passou quatro anos proibido pelos talibãs de trabalhar, antes de sair do país, deixando sua família para trás. No entanto, ele tem esperança de conseguir buscar seus parentes em breve. Sediqi conta que não era possível fugir com toda a família. "Andei cinco dias através das montanhas no Irã, sem água e sem comida." Ele está há quatro dias em Berlim e ainda espera chegar sua vez para fazer o registro. Sediqi diz que consegue se virar bem, por ter trabalhado como professor de inglês.

Até agora, o serviço no centro de registro do LaGeSo é realizado principalmente por voluntários, que assumem uma variedade de funções. Médicos voluntários trabalham no local para fornecer os serviços médicos básicos. Outros assumem o apadrinhamento de refugiados, os ajudando a lidar com a burocracia alemã.

A voluntária Ihsan Wahbi ajuda aqueles que não têm força para se registrarem. Nascida no Líbano há pouco mais de 40 anos, ela vive na Alemanha há 32. Ela espera pacientemente na fila, de mais de 30 metros de comprimento, levando no braço pastas de cor parda. Como voluntária, ela representa um advogado que dá assessoria jurídica a imigrantes.

Hoje, Ihsan Wahbi está na fila por uma mãe solteira do Iêmen, que tem cinco filhos e chegou através do Mediterrâneo. A libanesa, entretanto, duvida que será atendida naquele mesmo dia, já que há cerca de 300 refugiados na frente dela. "Só três a quatro funcionários estão atendendo. Eu não vou estar contando nenhum segredo se disser para você que isso é muito pouco", diz.

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Voluntária libanesa Ihsan Wahbi: "São muito poucos funcionários"Foto: DW/R. Fuchs

"Nos próximos dias, a situação poderá se agravar", prevê o voluntário Michael Ruscheinsky. "Porque a estação chuvosa de outono vai fazer a pressão aumentar no LaGeSo", alerta. Não só porque o número voluntários diminuirá, assim como a generosidade dos que fazem doações. "Só uma coisa vai subir, que é o número de refugiados."

Ele acredita que o governo berlinense deve decretar estado de emergência, a exemplo de Munique. A vantagem é que os órgãos de proteção civil, financiados pelo Estado, podem formar uma estrutura profissional de assistência. "Esta é uma situação de emergência, que tem que passar a ser tratada como tal", argumenta Ruscheinsky.

As autoridades berlinenses discordam. "O acolhimento de refugiados não é uma catástrofe e não será tratado como tal", enfatiza a porta-voz da prefeitura berlinense.