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Doenças do trabalho

22 de dezembro de 2009

O trabalho pode provocar doenças. E a atual crise financeira aumenta a pressão no ambiente profissional, elevando o risco de depressão entre as pessoas.

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Para combater sobrecarga, é importante procurar relações solidárias, diz psicoterapeutaFoto: picture-alliance/dpa

Quando o emprego se torna uma sobrecarga, não somente o corpo, mas também a alma adoece. Isso não é novidade. O novo, todavia, está no efeito que a crise financeira pode ter no ambiente de trabalho, aumentando a pressão sobre as pessoas e podendo gerar depressões.

O exemplo mais crasso é o da companhia francesa de telecomunicações France Telécom. No último ano e meio, 25 funcionários da empresa se suicidaram. Em carta de despedida, alguns deles responsabilizaram a companhia por sua morte.

Necessidades humanas

Também na Alemanha, o transtorno psíquico que atinge muitos empregados se acentuou.

Nos últimos anos, um fabricante alemão de móveis sofreu perdas contínuas e, em consequência, cortou centenas de empregos. Como isso ainda não foi suficiente para sanear economicamente a empresa, os empresários tiveram um ideia bastante peculiar: mandaram seus quase 1,8 mil empregados competir pela própria existência. Até o final de 2012, os funcionários das quatro unidades de produção da Alemanha deverão mostrar o quanto são bons. A unidade que obtiver o pior resultado deverá ser fechada.

Essa é apenas uma das muitas medidas de reestruturação em empresas de médio e grande porte com consequências graves para os empregados.

O psicoterapeuta Reinhold Bianchi explica que pressões desse tipo fazem as pessoas se sentirem interiormente sobrecarregadas. A necessidade de ter continuidade, de estar em paz e de se sentir pertencente ao ambiente de trabalho não é satisfeita.

Ao mesmo tempo, aumentam a pressão, a demanda excessiva e a sobrecarga, pois os empregados querem fazer tudo para manter o emprego. Então a insatisfação e a tensão acabam sendo internalizadas. "E esse é, geralmente, um aspecto muito importante que leva à depressão", concluiu Bianchi.

Doenças crônicas e graves

Anualmente, o convênio de saúde AOK divulga um relatório de ausência no trabalho. Ele comprova que, nos últimos anos, apesar de estarem doentes, muitos alemães foram trabalhar – mesmo contra o conselho do médico.

Como motivos, eles alegaram o medo de perder o emprego, o medo dos outros funcionários ou da grande quantidade de trabalho que deixaria de ser feita, caso eles não aparecessem. Tal pressão é perigosa. Ela pode provocar doenças crônicas e sérias.

Gerd Westermann, da Sociedade do Fomento à Saúde na Empresa (BGF), coopera com a AOK. Para ele, as doenças psíquicas estão ligadas às condições de trabalho. "Estamos vendo um crescimento dramático de indisposições depressivas. Isso também se deve ao crescente número de processos de reestruturação em quase todas as empresas", disse Westermann.

Mudança nas relações de trabalho

Devido às constantes mudanças e reorganizações, ninguém mais sabe aonde se vai parar no dia seguinte. Além da pressão do tempo real, principalmente a falta de reconhecimento é um fator provocador de distúrbios nos trabalhadores.

O sociólogo norte-americano Richard Sennett constatou uma mudança fundamental nas relações de trabalho nos últimos anos – com sérias consequências tanto para os empregados quanto para as empresas.

"Essas mudanças na organização de trabalho nos últimos 15 anos se caracterizam pelo fato de os relacionamentos, as relações entre as pessoas terem se enfraquecido. As pessoas perderam sua identidade, elas passaram a se concentrar somente em cenários de curta duração, tornando-se camaleões. Elas vêm fazendo tudo para aumentar seu valor de mercado", explicou Sennett.

Organização empregatícia humana

No entanto, os especialistas ressaltam que as pessoas precisam de relações estáveis e de apoio social. A perda de tais contextos sobrecarrega muitos indivíduos e, para muitas pessoas, a exclusão social age de forma até mesmo traumatizante. O risco de adoecer aumenta quando diretores resolvem "repassar" a pressão da concorrência para os empregados.

O Conselho de Ministros da União Europeia (UE) fez um apelo, para que as empresas "configurem de forma humana" sua organização empregatícia. No entanto, muitas firmas não estão dispostas a executar tais medidas ou não sabem como colocá-las em prática.

Relações solidárias

Segundo o relatório da AOK, o número de distúrbios psíquicos na Alemanha aumentou em cerca de 80% desde 1995. Muitos médicos diagnosticam um chamado "transtorno adaptativo ansioso". Segundo o psicoterapeuta Reinhold Bianchi, por trás disso escondem-se distúrbios depressivos na maioria dos casos.

"Um transtorno adaptativo ansioso ocorre quando as pessoas não conseguem mais lidar com as exigências do seu entorno e passam a desenvolver distúrbios psíquicos, por exemplo. Esse diagnóstico, no entanto, provém de uma visão unilateral. Para as pessoas, não se trata de uma adaptação, mas de uma harmonia (entre trabalho e empregado). Quando se perceber que os indivíduos precisam de um entorno social construtivo, então se notará que o que acontece hoje é justamente o oposto. A economia e a política neoliberais não se adaptam às necessidades fundamentais humanas", explicou Bianchi.

Para superar a depressão, Bianchi aconselha que seus pacientes enfrentem de forma ativa as sobrecargas no ambiente de trabalho. Eles devem sair do papel de vítima.

Bianchi também considera importante a pessoa perceber que não é a única afetada e trocar informações com os outros. "É importante buscar ativamente possibilidades de ajuda e relações solidárias. Na minha opinião, o fato de os sindicatos terem um número maior de membros mostra que as pessoas voltaram a sentir como relações solidárias são importantes na crise."

Autora: Ulrike Mast-Kirschning (ca)

Revisão: Simone Lopes